Suzana Herculano-Houzel

Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

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Suzana Herculano-Houzel

Em marcha lenta se obtém um humano

Cérebro de embrião humano leva mais tempo para se desenvolver em comparação ao de um camundongo

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Todos nós começamos de uma única célula: o óvulo fecundado, ou zigoto. Camundongo ou elefante, humano ou formiga, a vida animal começa sempre daquela uma célula. Como, então, se atinge tamanha diversidade do produto final, que é o animal adulto? Meu negócio é diversidade cerebral, mas no fim das contas, sempre há um corpo ao redor. Em matéria de evolução, quem vem primeiro: cérebro maior ou corpo maior? Quem determina o tamanho de quem? E, em última análise, o que determina o tamanho de um animal?

Não parece ser uma questão de tamanho das células. Pelas nossas contas, as células do fígado de um camundongo, de um macaco e de uma girafa são essencialmente do mesmo tamanho. Por outro lado, o zigoto humano já é maior do que um zigoto de camundongo —mas apenas duas vezes em diâmetro, enquanto nós somos certa de 20 vezes mais compridos do que um camundongo.

Um lindo trabalho de neurobiologia comparativa do desenvolvimento contrastando humanos e camundongos acaba de ser publicado na revista Science. Teresa Rayon e colaboradores no laboratório de James Briscoe, do Instituto Francis Crick, no Reino Unido, executaram mais um daqueles trabalhos que combinam engenharia genética, microscopia quantitativa, e biologia celular e molecular, usando embriões humanos descartados, embriões de camundongos gerados em laboratório, e células-tronco embrionárias das duas espécies.

É o tipo de pesquisa que, no Brasil, emperra porque os reagentes custam o triplo do preço, a burocracia de importação demora, depois a alfândega prende a remessa... e que nos EUA não pode ser realizada usando um único centavo do governo federal, devido a restrições legislativas que impedem o uso de embriões humanos.

Pesquisador com luva azul corta um cérebro ao meio; ao fundo, um frasco com líquido e com o que aparentam ser pedaços de cérebro
Proteínas humanas são mais estáveis do que as do camundongo - Yves Herman/Reuters

Foi no Reino Unido, então, que Rayon, Briscoe e equipe fizeram o que para mim será uma das descobertas mais fundamentais da biologia: o cérebro de um embrião humano leva mais tempo para se desenvolver e, nesse meio-tempo, fica maior do que o cérebro de um embrião de camundongo, porque as proteínas humanas são muito mais estáveis do que as do camundongo.

Acontece que o processo de divisão celular, pelo qual o zigoto se torna duas células, que então se tornam quatro, que então se tornam oito, até formarem o corpo todo, anda conforme umas proteínas são destruídas e outras, novas, produzidas do nada, num revezamento. Quanto mais devagar o revezamento ocorre, mais tempo a corrida demora.

O cérebro humano, portanto, é produzido em marcha lenta. O que causa a diferença? Boa pergunta, que manterá ocupados um bom número de novos cientistas —provavelmente também apenas no Reino Unido...

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