Suzana Herculano-Houzel

Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

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Suzana Herculano-Houzel

Quando a história acontece ao vivo

Posse de Biden traz a esperança de que americanos voltem a tomar decisões baseadas em fatos

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Ver Joe Biden e Kamala Harris assumirem o poder executivo dos EUA semana passada foi empolgante. Até ouvir Garth Brooks entoar Amazing Grace foi arrepiante e olha que eu sou ateia de carteirinha e nem um pouco fã de artistas country —mas a frase final da música, I was blind and now I see (“eu estava cega mas agora eu vejo”), escrita por um ex-escravagista, capturava perfeitamente o momento e a esperança de que meus novos conterrâneos estadunidenses abram os olhos e voltem a tomar decisões baseadas em fatos, não em porralouquice desenfreada contagiante espalhada por redes sociais.

Só posso imaginar o poder visceral de ver outros momentos históricos se desenrolarem diante dos nossos olhos. O discurso de Lincoln pelo fim da Guerra Civil, o discurso “Eu Tenho Um Sonho” de Martin Luther King. O impacto de ver os panfletos do outro Martin Lutero, o alemão, pregados na porta das igrejas. Vi alguns desses panfletos no museu histórico de Berlim, mas tenho certeza que minha experiência foi um fiapinho do choque revelatório de ver tais ideias incendiárias, ainda que óbvias em retrospecto, escritas em palavras que todo mundo entende.

Com tudo o que a neurociência já aprendeu sobre experiências e memórias, insistir em “ensinar” história usando apenas tracinhos pretos sobre fundo branco em livros e páginas digitais relatando fatos é exatamente tão útil quanto esperar que alguém aprenda mandarim só de assistir à televisão chinesa todos os dias.

Primeiro, porque informação tem que fazer sentido aplicado para virar conhecimento; exposição passiva entra por uma orelha proverbial e sai pela outra. Segundo, porque o que se vive através dos sentidos somente é aprendido se repercute pelo corpo todo: se gera emoções, se chama nossa atenção, se empolga ou enoja.

Por isso as biopics e encenações de eventos históricos, a la Hamilton, ainda que romanceadas, são tão atraentes e eficazes: são oportunidade para o cérebro de quem ficou limitado a decorar datas e eventos na escola se extasiar com a descoberta de que os envolvidos eram pessoas como nós e que seus feitos afetaram a vida de pessoas que poderiam ter sido nós. Contada em histórias, a história afeta e faz sentido até para quem não a vivenciou em pessoa.

Eu, por exemplo, vou lembrar para sempre que estava na cozinha, preparando almoço, quando ouvi, no poema da jovem Amanda Gorman, as palavras que todos precisávamos ouvir, irradiando força e confiança do alto do Capitólio, mas sem jamais perder a serenidade. Ui, arrepiei de novo...

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