Suzana Herculano-Houzel

Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

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Suzana Herculano-Houzel
Descrição de chapéu Mente

Até as abelhas aprendem com os mais velhos

Ter neurônios a mais e vida mais longa traz vantagens como a possibilidade de conviver com gerações anteriores

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Ando pensando nas consequências da longevidade desde que descobri que ela, por sua vez, acompanha simplesmente o número de neurônios no córtex cerebral. Não é mais preciso apelar para seleção natural para explicar a "evolução da longevidade": o que quer que seja que aumenta o número desses neurônios entre espécies também vem com uma vida mais longa.

Também não é preciso vida longa, ou muitos neurônios, para vingar nesse planeta. Camundongos têm um milésimo do nosso número de neurônios corticais, e vivem apenas um quadragésimo da nossa vida. Ainda assim, vão muito bem, obrigada: não é preciso nem muitos neurônios, nem vida longa para ter sucesso na vida, se "sucesso" for definido simplesmente como deixar descendentes. Bactérias, por esse critério, são as campeãs de sucesso, sem um único neuroniozinho.

Grupo de abelhas compete para acasalar - Karine Aigner 13.out.22 /WPY

Não que ter neurônios a mais e vida mais longa não tenha suas vantagens. Uma delas é a possibilidade de conviver com gerações anteriores —ou, pelo menos, indivíduos um pouquinho mais velhos, o suficiente para já terem aprendido na prática e terem o que demonstrar para os mais novos. Funciona em tribos e comunidades humanas pré-industriais, que vêm ensinando aos antropólogos que não são as avós pós-menopausa que ensinam know-how às crianças, não: são as outras crianças maiores, mesmo (e antes que os e-mails de avós furiosas inundem minha caixa postal e minha mãe me puxe as orelhas, eu acrescento: com as avós [e avôs também, para que meu pai não me xingue e os avôs de plantão não se exaltem], as crianças aprendem aquilo que precisa ser contado para ser transmitido).

Até para as abelhas e mangavas o convívio com aqueles um pouquinho mais velhos, que já têm algo a ensinar, é importante para o aprendizado, como demonstraram dois estudos recentes. Num, da Academia de Ciências da China, os pesquisadores finalmente criaram colmeias inteiras de abelhas "analfabetas" em dança. Digo "finalmente" porque segundo a lenda, a dança das abelhas, que indica a localização de flores carregadas de pólen, seria inata: algo que as abelhas nascem sabendo fazer. De fato, até abelhas "analfabetas" dançam, ao voltar para a colmeia (o que para mim pode ser uma dancinha feliz de comemoração, inata, de fato). Só que dançam mal, cheias de erros de direção e distância —mas boa parte do problema se resolve criando novas colmeias com umas poucas operárias mais velhas, boas de dança.

No outro, da Universidade Queen Mary, de Londres, Lars Chittka continuou botando suas mangavas à prova, e demonstrou que elas não só aprendem por imitação a empurrar um pino azul ou vermelho para ganhar acesso à comida, como formam preferência pelo método ensinado —mesmo que depois descubram que o outro pino também funciona.

Os neurônios são poucos e a vida das mangavas é curtíssima, então tudo se aprende de novo de um ano para o outro. Mas abelhas de idades diferentes coexistem, como crianças humanas, e as mais velhas demonstram às mais novas como dançar direito.

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