Tati Bernardi

Escritora e roteirista de cinema e televisão, autora de “Depois a Louca Sou Eu”.

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Tati Bernardi
Descrição de chapéu É Coisa Fina

Podcasts que salvam

Acometida por mais uma crise de enxaqueca, me entreguei ao áudio

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Esta é uma coluna sobre livros e não sobre podcasts. Contudo, acometida nos últimos dias por mais uma crise de enxaqueca, precisei ficar deitada no escuro, de olhos fechados, sofrendo por não terminar a tempo a leitura do espetacular “Trânsito”, de Rachel Cusk.

Dadas as circunstâncias, o que consegui em termos de aquisição cultural foi me entregar a dois ótimos podcasts: “Praia dos Ossos”, original da Rádio Novelo, e “Vinte Mil Léguas”, parceria da revista Quatro Cinco Um com a livraria Megafauna.

O primeiro narra de forma excepcional o assassinato da socialite Ângela Diniz por seu namorado à época, Doca Street, numa casa na Praia dos Ossos, em Búzios. O mais chocante é pensar que, se em 1976 uma mulher podia ser morta com tiros no rosto apenas por ser sedutora e livre (com a absolvição do criminoso confesso por enorme parte da mídia e da opinião pública), em 2020 evoluímos muito pouco. Nunca foi tão importante falar sobre o feminicídio no país —casos cresceram 22% durante os primeiros meses da pandemia.

O trabalho de apuração e pesquisa incansável e a riqueza de detalhes não tornam a história longa ou confusa. Muito pelo contrário: você devora cada palavra narrada por Branca Vianna como se estivesse diante de uma obra literária bastante refinada. Ou, melhor dizendo, ouvir um roteiro desses equivale a assistir aos melhores filmes ou ler os principais livros da atualidade. Até a data desta publicação, só estão disponíveis os primeiros três episódios, lançados aos sábados, e eu já estou extremamente ansiosa para os próximos cinco.

“Vinte Mil Léguas” pretende ler os cientistas como escritores, e em sua temporada de estreia trata da obra que fundou a ciência moderna: “A Origem das Espécies” (1859), de Charles Darwin. O nome do podcast é uma homenagem ao livro “Vinte Mil Léguas Submarinas”, de Júlio Verne, mais precisamente a uma história acerca desse trabalho de Darwin: quando o editor o publicou, disse que era chegada a hora de a ciência tomar o seu lugar no campo literário.

Nas vozes meditativas das apresentadoras e roteiristas Leda Cartum e Sofia Nestrovski (a ideia original é também da Fernanda Diamant) a gente viaja ao redor do mundo e das principais descobertas científicas do século 19. Mas se engana quem pensa que é um roteiro sobre batatas que demoram para cozinhar ou bichos-preguiça gigantes. Através de Darwin compreendemos melhor Adão e Eva, o racismo e até o surgimento de algumas doenças. Aprendemos tanto, mas tanto, que ficamos sabendo até que o seu avô misturava botânica com contos eróticos.

Para quem perdeu o bonde da explicação sobre o nome desta coluna, ou não se ateve ao trocadilho “é coisa fina”, aqui vai de novo: a meta é provar que é possível ler um livro com até 200 páginas por semana. E é o que tenho feito nos últimos 10 meses. Mesmo com pandemia, filha pequena, minha formação em psicanálise, outra coluna neste mesmo jornal, dois podcasts e meu emprego como roteirista de TV.

O cansaço existe, mas o prazer de ostentar em minha estante volumes que de fato FORAM LIDOS —e não apenas distribuídos por cor para fazer fotos instagramáveis— é enorme. Estou aqui num trabalho árduo contra a enxaqueca e sempre a favor dos livros (e dos podcasts também!).

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