Historicamente, a consolidação das instituições científicas modernas avançou em sincronia com a democracia representativa. Para que a ciência pudesse validar suas teorias contra dogmas religiosos, foi necessária a difusão de liberdades civis básicas, como o direito à opinião e à livre associação.
Analogamente, a legitimação dos parlamentos como espaços de discussão se nutriu dos avanços científicos, eles próprios frutos do diálogo e do livre pensar.
Esse compasso, porém, está longe de implicar que a convivência entre democracia e ciência seja sempre harmoniosa. Inúmeras descobertas científicas tiveram consequências antidemocráticas, mesmo que isso contrariasse os valores de seus patronos (a dinamite de Nobel ilustra isso muito bem). Por outro lado, foram muitos os políticos que, democraticamente escolhidos, quiseram submeter as descobertas científicas às razões de Estado (Hitler, por exemplo).
O que une a ciência e a democracia moderna não é a propriedade de verdades últimas e definitivas, mas certo ceticismo organizado que autoriza e incita a busca por traços da verdade. A verdade não mora íntegra e plena em algum lugar onde podemos encontrá-la. Logo, só nos resta buscar seus resquícios a partir de normas de experimentação e debate como as que regem as deliberações políticas e fomentam o desenvolvimento científico.
O que está em jogo nas próximas eleições é justamente a reconstrução dessas normas institucionais que nos permitirão recompor o debate público e reposicionar a ciência brasileira no interior dele.
Diferentemente do slogan bíblico-governamental em voga, a verdade não nos libertará —pelo simples fato de que ela não está dada em definitivo. Mas a liberdade orientada por normas e princípios democráticos nos guiará em sua direção.
Esta coluna foi escrita para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência. Thiago Amparo cedeu seu espaço hoje para o professor Luiz Augusto Campos
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