Thiago Amparo

Advogado, é professor de direito internacional e direitos humanos na FGV Direito SP. Doutor pela Central European University (Budapeste), escreve sobre direitos e discriminação.

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Thiago Amparo
Descrição de chapéu Folhajus

As colunas que não deram certo

É a raiva que me faz escrever, toda semana, como quem não sabe quando será de novo escutado

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Oi, leitor(a). Quebrando a quarta parede que nos separa, quero falar contigo. Parabéns por ler o jornal na semana mais morta do ano, ou seria por isso mesmo a mais viva? A semana que, na Divina Comédia do jornalismo, representa o purgatório entre o seco peru de Natal e o espumante doce do Ano Novo. Ao menos nesta semana, sabemos que o Congresso não destruirá, ainda mais, o meio ambiente, e Lula não nomeará mais um homem para juiz ou embaixador.

Eis um segredo: nem todas as colunas são pensadas com calma. Via de regra não o são, no meu caso. Agora, por exemplo, são 18h e corro para que meu editor não precise parar as máquinas de imprimir jornal por minha causa —sim, venho do passado e atesto que existem. Não seria a primeira vez. Teve coluna que escrevi do avião e o Wi-Fi parou de funcionar. Teve coluna que esqueci de escrever e o fiz em 30 minutos, e fui uma das mais elogiadas (nunca direi qual).

Ofereço esta a todas as colunas que não deram certo e àquelas que, por isso mesmo, deram muito certo, como tudo o que é bom na vida. Teve coluna que escrevi sobre violência policial direto da fila da Disney, o que não deixa de ser distópico. Teve coluna que escrevi sobre um livro que li por falta de assunto, e o jornal decidiu colocá-la na capa. Lá estou, na primeira página do dia 10 de agosto de 2019: eu falando de tiranos em Shakespeare, e Bolsonaro falando, logo acima, sobre "fazer cocô dia sim, dia não".

O ingrediente secreto das minhas melhores colunas sempre foi a raiva. O que uns chamam de coragem, eu chamo de raiva. Foi a raiva que me fez escrever a coluna que foi lida em uma sessão do Congresso: "Parem a grande máquina do mundo, pois Kathleen não sorri mais". É a raiva que me faz escrever como quem não sabe quando será de novo escutado. Lembro da Audre Lorde: "Minha resposta ao racismo é a raiva". Desejo um 2024 repleto de colunas erradas, e de raiva, que é o que a vida quer de nós.

Na charge de Laerte, detalhe de uma mão segurando uma pena de ave, como as que se usava para escrever antigamente, sobre um papel que se desenrola como um pergaminho. A pele da pessoa que segura a pena é escura. Uma fala aparece, vinda da mesma pessoa: “Princesa é o caralho. Meu nome é consciência negra”.
Charge da cartunista Laerte, publicada na página A2 do jornal Folha de S.Paulo, em 20 de novembro de 2023, sobre a Consciência Negra - Laerte

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