Oi, leitor(a). Quebrando a quarta parede que nos separa, quero falar contigo. Parabéns por ler o jornal na semana mais morta do ano, ou seria por isso mesmo a mais viva? A semana que, na Divina Comédia do jornalismo, representa o purgatório entre o seco peru de Natal e o espumante doce do Ano Novo. Ao menos nesta semana, sabemos que o Congresso não destruirá, ainda mais, o meio ambiente, e Lula não nomeará mais um homem para juiz ou embaixador.
Eis um segredo: nem todas as colunas são pensadas com calma. Via de regra não o são, no meu caso. Agora, por exemplo, são 18h e corro para que meu editor não precise parar as máquinas de imprimir jornal por minha causa —sim, venho do passado e atesto que existem. Não seria a primeira vez. Teve coluna que escrevi do avião e o Wi-Fi parou de funcionar. Teve coluna que esqueci de escrever e o fiz em 30 minutos, e fui uma das mais elogiadas (nunca direi qual).
Ofereço esta a todas as colunas que não deram certo e àquelas que, por isso mesmo, deram muito certo, como tudo o que é bom na vida. Teve coluna que escrevi sobre violência policial direto da fila da Disney, o que não deixa de ser distópico. Teve coluna que escrevi sobre um livro que li por falta de assunto, e o jornal decidiu colocá-la na capa. Lá estou, na primeira página do dia 10 de agosto de 2019: eu falando de tiranos em Shakespeare, e Bolsonaro falando, logo acima, sobre "fazer cocô dia sim, dia não".
O ingrediente secreto das minhas melhores colunas sempre foi a raiva. O que uns chamam de coragem, eu chamo de raiva. Foi a raiva que me fez escrever a coluna que foi lida em uma sessão do Congresso: "Parem a grande máquina do mundo, pois Kathleen não sorri mais". É a raiva que me faz escrever como quem não sabe quando será de novo escutado. Lembro da Audre Lorde: "Minha resposta ao racismo é a raiva". Desejo um 2024 repleto de colunas erradas, e de raiva, que é o que a vida quer de nós.
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