Tom Farias

Jornalista e escritor, é autor de "Carolina, uma Biografia" e do romance "Toda Fúria"

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Tom Farias

Viagem feita pela região amazônica mostra quanto temos a aprender no país

Há muito a absover com nossa gente, sobretudo as populações do Norte, cuja riqueza cultural escancaram nossa ignorância

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Passei os últimos dias de 2023 e os primeiros do novo ano percorrendo o verde sertão amazônico. Minha jornada teve início pela cidade de Manaus, ainda hoje a cidade mais importante do estado do Amazonas, centro comercial e mercantil, localizada no centro da maior floresta tropical do mundo.

A cidade é cortada pelas confluências dos rios Negro e Solimões. Um dos espetáculos mais bonitos é quando se dá o encontro das águas, com toda a riqueza de sua fauna e flora.

Pleno centro urbano pontifica o Theatro Amazonas, inaugurado em 1896, e que, além de ser um dos mais importantes teatros do Brasil, é ainda um dos mais belos projetos arquitetônicos de pé na região, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

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Moradores da comunidade Nova Jerusalém transportam de canoa carregamento de piaçaba pelo igarapé Tabaco, região do rio Padauiri - Lalo de Almeida/ Folhapress

Imagina um equipamento cultural, no século 19, de estilo arquitetônico renascentista, dedicado a grandes concertos e a ser uma "casa de ópera".

Corre a lenda que o cronista e dramaturgo Arthur Azevedo ao propor a construção de um teatro —hoje o Theatro Municipal do Rio de Janeiro, inaugurado em 1909, um ano após o seu falecimento— teve como inspiração o "teatro amazônico", nascido no apogeu do ciclo da borracha.

Como minha aventura só estava começando, de Manaus —que significa "mãe dos deuses", tronco étnico indígena de mesmo nome, dizimado entre o final do século 18 e 19 pelos portugueses— segui para a Floresta Nacional do Tapajós (Flona), já no estado do Pará. Fui fazer um turismo de floresta.

A Flona é uma região sustentável pelos recursos da floresta que abrange 23 comunidades, além de três aldeamentos indígenas da etnia Munduruku. As comunidades ribeirinhas comportam aproximadamente 4.000 moradores, de acordo com levantamento da Federação das Organizações e Comunidades Tradicionais da Floresta Nacional do Tapajós (FCFT), sob a fiscalização do governo federal, através do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Eu me hospedei na localidade de Jamaraquá, município de Belterra, banhada pelos rios Tapajós e Cupari e região rica de espécies predominantemente nativas, hoje bastante objetivada para exploração sustentável da floresta.

Toda a riqueza da floresta é percebida através de trilhas pela mata, feitas por guias locais, quando nos é apresentado grande diversidade da paisagem, ampliada por sua fauna e flora, rios, lagos, açudes, igarapés, e a "praias" do Rio Tapajós, sem contar a exuberância das árvores centenárias, como a Sumaúma Vovó.

Fiz bastante contato com as populações ribeirinhas. Conversando com um e outro, uma coisa me chamou a atenção: a maioria não se considera indígena, mas de compleição parda. Olhando para cada um deles, fosse homem, mulher, ou crianças ou velho, o que vi foi um ser humano de fenótipo genuinamente indígena.

Certamente isso explica os dados do último Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que mensurou em 1.693.535 pessoas indígenas, cerca de 0,83% do total de habitantes do país.

Por uma excepcional sorte do acaso, viajei em uma embarcação turística, no rio que liga Santarém a Alter do Chão, com a manauara Sâmila Nascimento. Ela é agente de pesquisa e mapeamento do IBGE e visitou muitas dessas pessoas, que para seu espanto se diziam pardas, não indígenas, embora vivam em terras indígenas e tenham descendência, de pai e mãe, de alguma etnia da região.

Sâmila trabalhou em teste piloto nas comunidades indígenas do TI Andirá-Marau, etnia Sateré-Mawé, que habitam a fronteira dos estados do Amazonas e Pará, região do médio rio Amazonas, quando constatou o nível de respostas.

Enquanto isso a proporção da população parda na região Norte é de 76,2%, maior do que a do Nordeste (59,6%) e do Centro-Oeste (52,4%), segundo o IBGE.

Essas viagens muitas vezes nos fazem perceber uma realidade brasileira que choca os que vêm dos grandes centros, ou dos locais ditos desenvolvidos. Temos muito o que aprender com a nossa gente, sobretudo as populações do Norte, cuja riqueza cultural mostra a nossa ignorância enquanto nação desenvolvida e civilizada.

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