Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire

Extremismo nos EUA ainda deve animar lacaios no Brasil, mesmo sem Trump

Republicanos degradados estão sacudidos, mas ainda fortes, e podem ser uma inspiração para a política local; pesadelo não acabou.

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Desumanidade, sordidez, cafajestagem, mentira, ignorância, incompetência, vagabundagem, racismo e morticínio não foram empecilhos para que Donald Trump levasse o voto de quase 48% dos eleitores. Uma eventual vitória do Nero Laranja daria ainda mais impulso à liga da injustiça. Mas qual terá sido o tamanho da derrota da internacional autoritária?

A pergunta tem interesse imediato para o Brasil. Trump é guia ideológico, político e espiritual dessa gente no governo. Além do mais, uma derrota na disputa pela Casa Branca diminui o valor de mercado eleitoral do extremismo autoritário.

Apesar do revés, o espírito da podridão continua bem vivo e pode ser ainda mais atiçado pela guerrilha que o Partido Republicano está por ora disposto a mover contra um governo de Joe Biden, uma espécie de Resistência virada do avesso.

Dada a desimportância brasileira e por ter mais o que fazer, um governo democrata não deve tomar medida alguma destinada a afetar diretamente o Brasil. Sim, é possível que um esforço renovado dos Estados Unidos na contenção do desastre climático tenha impacto maior por aqui.

O mundo civilizado, se ainda continuar a haver algum, todo ele tende a se ocupar cada vez mais de cobrar compromissos ambientais que vão afetar comércio, tecnologia, competitividade, trabalho ou alianças políticas. Como costuma acontecer em quase qualquer mudança tecnológica, econômica ou civilizacional, é grande o risco de ficarmos para trás, não importam os governos de turno no mundo rico (desde que a barbárie não se dissemine pelo planeta, ressalte-se).

Nosso isolamento diplomático aumentará, assunto mais esotérico e de efeito defasado. Pode haver impactos impremeditados de políticas econômicas americanas, como no caso de taxas de juros e de câmbio. De novidade, pode haver o efeito da nova fase do extremismo e da guerra cultural, uma força viva dos EUA, como as urnas acabaram de demonstrar e o comando republicano fará questão de aproveitar.

Mesmo as pesquisas que pintavam o quadro mais azul não indicavam derrota desmoralizante dos republicanos. Uma diferença maior de votos e uma maioria indiscutível dos democratas no Senado, porém, indicariam que governar de modo abjeto, como Trump e seus lacaios o fazem, causa dano indubitável. Não foi bem assim. Essa tem sido a conversa americana destes dias: a polarização e os republicanos degradados, estão sacudidos, mas ainda fortes, mesmo fora da Casa Branca. Podem ser uma inspiração para a política local. O pesadelo não acabou.

É verdade que Bolsonaro, mais fraco, se tornou refém do centrão, reatou amizade com corruptos maiores e estará tanto mais acorrentado a essa gente quanto maior o risco de cadeia para filhos e amigos milicianos. Pode ficar mais fraco se a economia ratear ou se um arrocho muito inepto deixar ainda mais gente em na miséria. Em tese, Bolsonaro não está em situação de fazer muita gracinha tétrica, como reavivar a campanha golpista ou outros autoritarismos. Mas ele não tem limite.

A derrota nazifascista em 1945 ajudou a derrubar a ditadura de Getúlio Vargas (ou serviu de pretexto). A Guerra Fria colocou o Brasil no caminho da ditadura de 1964-1985. Comparar a queda de Trump a esses momentos decisivos parece exagero ridículo. Mas: 1) não é bem de Trump que se trata, mas do risco de derrocada democrática geral; 2) não terminou guerra algum: ela apenas começou.

Os democratas brasileiros, porém, ainda acham que vivemos em "um país normal", como dizem os colaboracionistas.

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