Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu PIB inflação juros

A cinco meses da eleição, economia não afundou, como a oposição esperava

É preciso interpretar conjuntura com o realismo que a oposição carnavalesca costuma desprezar

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São Paulo

O salário médio não era tão baixo fazia uma década. Sem-teto montam vilas de barracas nas calçadas de bairros ricos de São Paulo. No fim deste ano, a renda (PIB) per capita ainda será menor do que em 2010 (dois mil e dez: não é erro de digitação). Ainda não se conhece projeto político que apresente um plano crível para dar conta dos problemas crônicos do crescimento ("reformas", com ou sem aspas).
É a pior crise da República.

Isto posto, se a conversa muda para o curtíssimo prazo e trata do ambiente político-eleitoral, é fato que a economia não afundou ainda mais, como a oposição esperava. A cinco meses da eleição, alguns bodes até saem da sala.

Homem mostra carteira de trabalho enquanto procura emprego em São Paulo
Homem mostra carteira de trabalho enquanto procura emprego em São Paulo - Amanda Perobelli - 6.out.20/Reuters

Há números melhores no emprego, na confiança de consumidores e empresários, no crédito. A receita do governo é a maior desde 2014 (como proporção do PIB), o que facilita favores eleitorais.

Considere-se o caso do emprego. Na sexta-feira (29), o IBGE divulgou os números de março. A taxa de desemprego é a menor desde 2016. O nível de ocupação é o maior desde 2017 (a porcentagem das pessoas em idade de trabalhar que tinham emprego).

O número de pessoas com algum trabalho é o maior desde 2012. É 8,2 milhões maior do que em março de 2021 ou 2,2 milhões maior do que em março de 2019.

O rendimento médio do trabalho ("salários") é um desastre. Descontada a inflação, nunca foi tão baixo desde 2012, quando começa a nova série de dados sobre trabalho do IBGE. Mesmo assim, cresce um tiquinho a partir do fundo do poço desde janeiro —despiora.

O ânimo de empresários da construção civil, dos serviços e da indústria ainda é de "insatisfação", de pessimismo, mas a confiança cresceu em abril, segundo a pesquisa da FGV, recuperando-se da degringolada vista a partir de meados de 2021. No comércio, ainda caiu. A confiança dos consumidores, embora em nível de insatisfação profunda, também se recuperou um pouco.

A alta da taxa de juros, a perspectiva de crescimento menor do que 1% do PIB neste ano e a queda do valor do salário real não desanimaram o crédito bancário de modo significativo.

O ritmo anualizado do valor das concessões de crédito (novos empréstimos) estava acelerando pelo menos até fevereiro, dado mais recente (descontada a inflação). Sim, é visível uma desaceleração nos dados trimestrais (em termos reais, dessazonalizados).

O estoque de crédito (total de dinheiro emprestado) também cresce, em termos anuais.

A leitura apressada desses exemplos talvez dê a impressão de que a economia se levanta da tumba. Não. Ainda rastejamos no chão frio da cripta. A sugestão aqui é que se interprete a conjuntura de modo mais político e com o realismo que a oposição carnavalesca e doidivanas costuma desprezar.

Note-se outra vez: 8,2 milhões de pessoas arrumaram algum trabalho, em um ano (aumento de 9,4%). O salário médio caiu, mas muita gente não tinha renda alguma faz um ano. A baixa do rendimento, por falar nisso, foi maior para a categoria de funcionários públicos. A fatia de empregos formais é praticamente a mesma de 2019 ou 2018.

Além dessa situação minimamente despiorada, o governo anabolizou o clima econômico de curtíssimo prazo. Liberou o saque parcial do FGTS, renegocia dívidas de empresas do Simples e do Fies (financiamento estudantil), abriu o crédito consignado para mais gente, baixou um imposto aqui e ali. Faz mais dívida, é verdade, piorando a situação de 2023.

Os juros estão em alta. A inflação permanecerá além de 10% ao ano até agosto ou setembro. Tropeços nos EUA e na China prenunciam problemas por aqui. Por ora, porém, menos bodes na sala ajudam Jair Bolsonaro.

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