Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Descrição de chapéu inflação juros

Após vadiar três anos, governo tenta estelionato eleitoral na energia

Bolsonaro quer jogar a conta da inflação da energia no colo de alguém a fim de se salvar na eleição

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"Nós já saímos do inferno [da inflação]", disse Paulo Guedes nesta quinta-feira (19). A carestia está feia mesmo é na Holanda e na Inglaterra, afirmou o ministro da Economia.

Parece que Jair Bolsonaro e seus cúmplices no Congresso não pensam assim. Em desespero, a cada dia aparecem com ideias alopradas de meter a mão em preços, empresas ou na receita dos estados a fim de evitar aumentos de eletricidade e combustíveis pelo menos até a eleição.

Não vai dar certo, a baderna da economia vai aumentar, com prejuízos gerais, e os reajustes podem ser ainda maiores depois da eleição. É uma mistura de estelionato eleitoral, burrice e incompetência até na demagogia.

O presidente Jair Bolsonaro em cerimônia no Palácio do Planalto - Adriano Machado - 18.mai.2022/Reuters

Na quarta-feira, Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, disse que o Congresso vai suspender o reajuste da conta de luz se o governo não arrumar uma solução para os aumentos, que na média nacional devem ficar em torno de uns 19%. Nesta quinta-feira, Lira disse que vai colocar em votação na semana que vem um projeto que define telecomunicações, energia, combustíveis e transportes como "essências". Assim, a alíquota de ICMS desses serviços não poderia passar de 17% ou 18%, a depender do estado.

O governo foi ao Supremo para mudar a alíquota que os estados pretendem cobrar sobre o diesel a partir de julho. Nesta quinta, tentou convencer os governadores a cobrar menos ICMS sobre o diesel, seguindo uma regra de transição (que dura até o final do ano) da lei recém-aprovada que unifica esse imposto no país.

Ainda que consiga dobrar os governadores, vai conseguir uma redução de centavos no imposto do diesel, de R$ 0,10 a R$ 0,20 , se tanto, levando em consideração uma média simples dos impostos estaduais (isso se a redução de imposto chegar ao consumidor, o que é incerto, e se não causar aumento de imposto, dada a tolice que levaram ao STF). O litro do diesel custa R$ 6,78, na média nacional.

Baixar o preço do diesel em 10% (67 centavos), por decreto, custaria uns R$ 42 bilhões em um ano. Equivale a 40% do lucro da Petrobras em 2021 ou a 5% da receita de impostos de todos os estados em um ano.

Obviamente nada disso vai prestar.

Gente de governo e mercado diz que os estados ganharam muito dinheiro com a alta dos combustíveis, quase 41% de receita extra (comparado o primeiro trimestre deste ano com o de 2021). Mas, descontada a inflação, o ganho real foi de 27%. De resto, aumentou também o consumo de gasolina (12,5%) e de diesel (3,6%), mesmo com a paulada nos preços. A receita total de ICMS no trimestre cresceu apenas 3%, em termos reais; a receita tributária total, 1,6%. Não é bem uma farra de dinheiro.

Resumo da ópera, querem jogar a conta no colo dos estados com números exagerados, por assim dizer.

Reduzir o ICMS de energia, comunicação etc. pode resultar em alguma queda de preços. No ano passado, o STF decidiu que não se pode cobrar alíquota de ICMS (além da básica) sobre esses serviços. Como os estados reclamaram que perderiam dezenas de bilhões, a decisão passaria a valer apenas em 2024.

Na prática, o Congresso quer antecipar a decisão do STF. Mas vai ter buraco na conta dos estados. Vários deles não merecem piedade, pois estão quebrados por irresponsabilidade e incompetência. Ainda assim, no curto prazo vai ter rombo, coisa de que Bolsonaro e o Congresso não querem saber (têm aprovado aumento de despesa estadual a rodo, como de costume).

Bolsonaro e governistas vadiaram e barbarizaram por quase quatro anos. Agora querem jogar a conta da inflação da energia no colo de alguém a fim de se salvarem na eleição, mesmo que causem baderna ainda mais explosiva na ordem econômica.

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