Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu Rússia

Economia russa aguenta o tranco e tem gás para resistir ao Ocidente

PIB cai menos que o previsto, inflação e juros baixam e Putin tem meios para causar ainda mais estrago

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A recessão na Rússia vai ser feia em 2022. Mas talvez a economia encolha apenas metade do que economistas ocidentais e mesmo do governo russo previam em abril. O desemprego está em mínima histórica. Inflação e taxa básica de juros caem.

No curto prazo, no mínimo, o sistema russo pode aguentar o tranco econômico, prolongar a guerra, deixar a Europa ocidental sem gás e causar ainda mais estrago político no Ocidente, vide a contribuição que deu à degradação precoce do prestígio de Joe Biden nos EUA, com a inflação do petróleo.

No médio prazo, sabe-se lá. Um bancão russo, Sberbank, chega a falar em década perdida. No que diz respeito às perspectivas mais imediatas, os russos se viraram.

Russos esperam em fila para sacar dinheiro em San Petersburgo - Anton Vaganov - 27.fev.2022/Reuters

Na pesquisa que o Banco Central da Rússia (BCR) faz com economistas sobre o PIB, a previsão mediana em julho foi de queda de 6% neste 2022 e de 1,3% em 2023. No biênio, a baixa composta seria então de 7,2%. Muito? No biênio da Grande Recessão do Brasil, 2015-2016, a baixa foi de 6,7%.

Na estimativa do próprio BCR, o PIB cai entre 6% e 4% neste ano e entre 1% a 4% em 2023. Propaganda? No chute do FMI, a recessão deste 2022 seria de 6%. Para alguns bancões americanos, menos de 4%.

A arrecadação do governo russo está dentro do esperado, mesmo com a recessão. O motivo óbvio é o aumento da receita com petróleo e gás. Em 2021, foi de 18% da receita total. No primeiro semestre, de 38%, mesmo com o petróleo russo (Urais) sendo vendido a preço de liquidação. A receita fiscal com petróleo e gás aumentou 33% de 2021 para 2022.

A taxa básica de juros, a Selic deles, caiu na sexta-feira para 8% ao ano, abaixo do nível de antes da guerra, 9,5%. Logo depois do início das sanções ocidentais, no final de fevereiro, fora a 20%.

A situação folgada nas contas externas (exportações de energia cara) e o controle de capitais valorizaram o rublo. A inflação começa a cair. Está em 15,9% ao ano (era de 9,2% ao ano em fevereiro).

A taxa de desemprego em maio desceu à mínima de 3,9%, embora com redução de salário real e de horas trabalhadas. As vendas no comércio de varejo estão caindo no ritmo de 10% (ante mesmo mês do ano anterior).

Mas a Rússia se vira. Como disse Elvira Nabiullina, a presidente do BCR na sexta-feira passada, haverá mais esforços para "reduzir a dolarização da economia e do setor financeiro", com "aumento da importância das moedas de países amigos" e do rublo nas transações externas.

Empresas aéreas, exportadoras, montadoras de veículos e construção civil apanharam muito por causa das sanções. Mas Nabiullina diz que a finança das empresas se aguenta e que a poupança das famílias está alta, até por repressão prudente de consumo e falta do que comprar. A presidente do BCR diz também que as sanções isolaram a Rússia de certas flutuações da economia mundial e aumentaram a oferta doméstica de alguns bens (ora inexportáveis). A confiança do consumidor e a demanda de crédito despioram.

Ainda assim, disse Nabiullina, a recessão será menos profunda, mas vai durar mais. Algum crescimento, apenas em 2024. Mas os russos precisam combinar com o restante do mundo, ao menos com seus amigos.

A pobreza vai aumentar. A economia de mercado é meio uma ficção em um regime autocrático, que pode meter a mão em tudo, aliado a cleptocratas.

A Europa vai pastar, mas vai deixar de comprar energia russa. Sem mudança radical do governo, a Rússia não terá acesso a tecnologia de ponta e insumos de qualidade. Terá de inventar uma substituição de importações e contar com a ajuda chinesa. Mas Vladimir Putin e seu governo parecem ter meios de causar caos na economia e na política mundial por ainda muito tempo.

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