Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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País vai mal, mas eleição não tem paniquitos financeiros

Parece que a atitude média dos donos do dinheiro é: 'depois do tombo, deste chão não passamos'

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A campanha eleitoral parece não ter efeito negativo algum em indicadores financeiros, até agora: taxa de câmbio ("preço do dólar"), taxas de juros de prazo mais longo, Bolsa, por exemplo. Nos últimos dois meses, houve discreta melhora. Parece que a atitude média dos donos do dinheiro é: "depois do tombo, deste chão não passamos". Até novembro, ao menos.

As taxas de juros de prazo mais longo, dois anos em diante, baixaram. Tanto que a direção do Banco Central deu um grito nos povos dos mercados, para que não ficassem tão animadinhos com a perspectiva de queda precoce da Selic. As taxas de câmbio reais saíram do fundo do poço de meados de 2020. Até o Ibovespa saiu do buraco de julho, embora ainda longe do pico do ano, em abril.

Negociadores de dinheiro grosso dizem que a eleição, em si, pode ser um "não evento". Embora não tenham programa animador ou, no que interessa para a finança, programa quase algum, os candidatos principais, Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) teriam histórico "conhecido".

Entrada de seção de votação em Guarulhos (SP) no primeiro turno das eleições de 2018 - Adriano Vizoni/Folhapress

O movimento no dinheiro poderia ficar mais nervoso quando definido o resultado das urnas e, mais, quando houvesse indício claro do que vai se fazer dos assuntos óbvios, crônicos e cruciais: dívida, déficit, novo teto, nomes da equipe econômica, alguma ideia do tamanho da coalizão no Congresso, plano imediato de reformas.

Por ora, a preocupação maior seria o destino da política monetária (de juros), nos Estados Unidos, juros e crise de energia, talvez recessão, na União Europeia e tamanho do tombo da China.

Não se trata de dizer que as coisas estão tranquilas por aqui, mas de conformismo e espera com armas engatilhadas. Mas o grosso do estrago nas taxas de juros aconteceu entre setembro e outubro de 2021, quando caiu tardiamente a ficha de que a inflação poderia ser ruim mesmo e quando o governo Bolsonaro avacalhou o teto de gastos pela primeira vez.

O preço do real, em termos reais e ponderado pelo peso das moedas dos países com que temos comércio, sobe um tanto. É verdade que o real se levanta das profundezas em que se meteu logo depois do início da epidemia, quando a moeda brasileira foi a que mais se desvalorizou. De resto, essa melhoria não bastou para dar ajuda relevante na contenção da inflação nem é lá compatível com indicadores positivos de contas externas. Mas não piorou com a campanha eleitoral.

Um tanto mais impressionante, agora do lado da "economia real", até a taxa de investimento resistiu (em ampliação da capacidade produtiva, máquinas, equipamentos, softwares, residências). Os anabolizantes estelionatários de Bolsonaro não explicam essa resistência.

Tudo se passa como se todo mundo estivesse ainda mais conformado com o fato de que há menos debate econômico eleitoral do que de costume, como se alguma conversa séria fosse começar apenas lá por novembro, como se não antecipassem desde já risco ainda maior de estragos por causa da eleição de Lula ou Bolsonaro. Já estaria tudo "no preço".

Houve algumas surpresas, enfim, que atenuaram ou adiaram um tico o agravamento do problema fiscal. A receita de impostos é impressionante, a inflação alta na prática abateu o tamanho relativo da dívida e o PIB crescerá bem além da conta (mais que dois pontos além do previsto em fins de 2021, um erro estratosférico). Mas a conta voltará a subir em 2023 e será muito alta.

Essa situação de crise financeira ruim, mas ora controlada ou represada, pode ser um bônus para o próximo presidente. Um programa realista e uma equipe boa podem até levantar o Pibinho de 2023 de graça, ainda que a implementação das medidas leve tempo.

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