'Buscas também cabem no Congresso', diz Dallagnol sobre mandados coletivos

Deltan Dallagnol, procurador da Lava Jato, diz que ação é inconstitucional

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São Paulo

O procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) na Operação Lava Jato, teceu duras críticas nesta terça-feira (20) contra a pretensão do presidente Michel Temer (MDB) de fazer a Justiça expedir mandados coletivos de busca e apreensão durante a atuação das Forças Armadas no Rio.

Temer autorizou a intervenção federal na segurança pública do Rio na última sexta (16). A medida já foi aprovada pela Câmara na madrugada desta terça (20) e já seguiu para o Senado.

Por meio de uma rede social, Dallagnol ironizou a proposta. "Se cabem buscas e apreensões gerais nas favelas do Rio, cabem também nos gabinetes do Congresso", escreveu.

O coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, durante palestra em São Paulo
O coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, durante palestra em São Paulo - Marcelo Justo/Folhapress

O procurador da República afirmou ainda que "as evidências existentes colocam suspeitas muito maiores sobre o Congresso, proporcionalmente, do que sobre moradores das favelas, estes inocentes na sua grande maioria."

Pela proposta de Temer, os mandados coletivos dariam a possibilidade de os agentes entrarem em casas de moradores sobre os quais não pesam nenhuma suspeita.

O pedido, que será feito na primeira instância da Justiça estadual do Rio, partiu de uma sugestão do general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército Brasileiro.

Dallagnol ainda sustentou que o "Código de Processo Penal não autoriza expedição de mandados de busca coletivos ou genéricos. Ao contrário, exige a precisão possível na indicação dos imóveis a serem alcançados."

"Será muito curioso se, na intervenção no Rio, tribunais aceitarem mandados de busca coletivos para bairros ou ruas inteiros, em comunidades pobres, onde não moram banqueiros e empresários", reafirmou o procurador.

DIREITOS HUMANOS

As críticas de Dallagnol reforçam um coro de especialistas em segurança e direitos humanos que temem brechas para possíveis violações.

A professora Eloisa Machado, da FGV Direito de São Paulo, afirmou que a Constituição garante a inviolabilidade da casa e é necessária uma justa causa para que haja um mandado de busca e apreensão. Segundo ela, a existência da intervenção federal não altera em nada a garantia dos direitos.

"Para entender o absurdo, é como imaginar que todo um condomínio fosse revistado pela polícia. Tudo faz parte da visão seletiva de que o domicílio das pessoas mais pobres não teria a mesma garantia."

Para Isabel Figueiredo, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, trata-se de uma medida inconstitucional. "A lei obriga a fundamentação do pedido, não pode colocar como suspeita uma comunidade inteira", disse.

A primeira instância da Justiça fluminense já autorizou, nos últimos anos, buscas coletivas em comunidades como Cidade de Deus (zona oeste), Jacarezinho e Complexo da Maré (zona norte).

No caso da Cidade de Deus, a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado julgou, no início do ano passado, um recurso da Defensoria Pública e declarou, por unanimidade, que buscas do tipo não têm respaldo legal, pela necessidade de individualizar os suspeitos e especificar os endereços.

Segundo Lívia Casseres, do Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria do Estado do Rio, o órgão adotará medidas judiciais para impedir ações que violem os direitos individuais dos cidadãos.

Os pedidos de mandado de busca coletivos podem ser feitos nas cerca de 80 Varas Criminais do Estado ou em comarcas únicas no interior. A decisão cabe a cada magistrado, já que não há orientação ou portaria do Conselho Nacional de Justiça.

O governo tentou no ano passado adotar a prática na Rocinha, quando as Forças Armadas foram usadas em operação para tentar sufocar uma guerra do tráfico local. Na ocasião, optou-se por não entrar com pedido de busca coletivo pelo temor de ele ser negado no plantão judiciário.

Em nota, o Ministério da Defesa defendeu os mandados coletivos como uma possibilidade e disse que as operações não incluem capturas.

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