Salvador tem 1º Carnaval sem Ivete em 25 anos e 1.500 'dispensados'

Cerca de 12 mil foliões ficarão sem desfilar com gravidez da cantora

Grávida, Ivete Sangalo durante show em dezembro no Festival de Verão 2017 em Salvador; ausência de cantora no Carnaval de 2018 desmobilizou estafe
Grávida, Ivete Sangalo durante show em dezembro no Festival de Verão 2017 em Salvador; ausência de cantora no Carnaval de 2018 desmobilizou estafe - Alessandra Lori/ Ag. A TARDE
João Pedro Pitombo
Salvador

Ivete Sangalo, 45, está na Praia do Forte, litoral norte da Bahia. E por lá deve permanecer neste Carnaval. Com oito meses de gravidez, às vésperas da chegada das filhas gêmeas, a principal atração da folia em Salvador está em clima de "licença-maternidade" e vai se ausentar da festa pela primeira vez em 25 anos.

A notícia fez muitos de seus foliões reverem seus planos –alguns dos cerca de 12 mil que seguem seus dois blocos durante o Carnaval sequer ficarão ou irão para Salvador.

Folião contumaz, o produtor Matheus Nadier, 22, postou numa rede social uma carta ao prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM), pedindo o adiamento do Carnaval de Salvador para "abril ou maio". "Você acha mesmo que o vale dos homossexuais inteiro vai se deslocar para Bahia para ir atrás do bloco da Claudia Leitte? Menos né...", provocou.

O prefeito respondeu convidando o folião a curtir outros bloco. Não convenceu.

"Sabe que semana passada eu até cogitei ir? Mas desisti. Vai ser um Carnava atípico, esquisito", disse Matheus Nadier, baiano que mora no Rio.

Ele diz que a maioria dos seus amigos vai para outros Carnavais neste ano e faz troça daqueles que compraram passagem para Salvador antes de Ivete anunciar a gravidez: "Se ferraram", ri.

Estar fora da avenida, contudo, não quer dizer que Ivete estará exatamente ausente da festa. A cantora deve ter uma "presença simbólica".

Ela será "multiplicada", seja na forma de um boneco de Olinda, em Pernambuco, em máscaras com seu rosto, em Salvador, ou em suas músicas.

Ela sabe disso. Não à toa, faltando poucos dias pra festa, lançou a música "No Groove", com a banda Psirico.

Márcio Victor, líder da banda, vai comandar o bloco "As Muquiranas" vestido de Ivete: blusinha, saia e uma "barriga de oito meses" de fora.

Pode ser um alento para o alagoano Tarcísio Menezes, 34, fiel a Ivete há dez anos.

Neste Carnaval, ele vai desfilar nos blocos de Daniela Mercury e Bell Marques. Mas diz que não será a mesma coisa. "Não vai ser completo".

Por isso, o alagoano não perdeu tempo: Já comprou abadas para sair com Ivete no Carnaval... de 2019.

A FESTA CONTINUA

Neste ano, Ivete  foi trocada pelo cantor Saulo Fernandes no Carnaval. "Ave-Maria, foi com dor no coração, mas não tive escolha", disse André Luiz de Oliveira, 42, o "algoz da traição".

Será que ela vai ficar decepcionada? Afinal, André não é só mais um fã. Ele é o cara que a faz avançar. "Devagar e sempre, é como me diz em todo Carnaval. Ivete não gosta de ficar parada, quer sempre que eu a mantenha em movimento."

Ele pode falar com muita propriedade. Por trás do para-brisa, comanda uma máquina de 50 toneladas no circuito entre a Barra e Ondina. André é motorista do trio elétrico de Ivete Sangalo há quatro Carnavais.

Neste ano, assim como milhares de fãs, André ficou "órfão da cantora".

Numa época em que estaria preocupada com figurinos e trios elétricos, ela fala candidamente em berços e enxoval.

Enquanto isso, um estafe que chega a 1.500 funcionários durante o Carnaval foi desmobilizado. Músicos, produtores e até os cordeiros dos blocos Coruja e Cerveja & Cia ganharam férias forçadas.

"É um choque, um baque. Para falar a verdade, é a primeira vez desde os meus 15 anos que não vou trabalhar no Carnaval", afirma Fábio Almeida, 39, empresário da cantora baiana e responsável pelos seus dois blocos.

A ausência de Ivete fez parar uma parcela significativa da roda econômica que sustenta a festa em Salvador.

Ao todo, são cerca de 12 mil foliões que ficarão sem desfilar nos blocos comandados pela cantora. Eles já deixaram de gastar R$ 9 milhões em abadas –camisas que servem como ingresso para os blocos– cujos preços variam entre R$ 750 e R$ 850.

Entre vendas e patrocinadores, que podem chegar a até oito marcas, os blocos de Ivete faturam até R$ 15 milhões por Carnaval. Fora da festa deste ano, eles deixarão de movimentar toda uma rede de fornecedores, composta por empresas de equipamentos de segurança, som, luz, até indústrias que confeccionam os abadas. Quase todos eles baianos.

A conta não para por aí. Cerca de 60% dos foliões dos blocos de Ivete vêm de fora de Salvador. São pessoas que gastam com passagens, hospedagem, alimentação, transporte e cerveja, muita cerveja. São foliões que chegam a gastar até R$ 7.000 em um Carnaval na Bahia.

TESTE

A ausência de Ivete na festa é encarada como um teste para o Carnaval de Salvador, cujo modelo de negócios entrou em colapso e fez cair as cordas que dividem os foliões que pagam dos que não pagam em dezenas de blocos.

Sem sua principal atração, a festa terá uma chance de avaliar seu formato, fazendo com que as mudanças sejam aceleradas ou retardadas.

"Para nós, é uma oportunidade de olhar de fora e ver o que está acontecendo. E a partir daí ressignificar nossos produtos. Pode ser bom", afirma Fábio Almeida, empresário de Ivete.

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