Moradores contam que promessas após obras do rio São Francisco não saíram do papel em PE

Transposição reassentou 848 famílias; outras 2.580 pegaram indenização

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Sertânia

“Lá, eu criava o que queria, plantava o que queria, e aqui não posso fazer nada. Cabra não pode criar, ovelha não pode criar, bezerro não pode criar. Como é que a gente pode ficar num canto desse?”

Quando a obra da transposição estava perto de cortar o seu sítio, o Ministério da Integração Nacional ofereceu duas opções à agricultora Teresinha da Conceição, 52: receber uma indenização ou ser reassentada em uma das 18 Vilas Produtivas Rurais, orçadas em R$ 207 milhões.

Conceição e o marido, além da mãe, optaram pelo projeto do governo. No final de 2017, eles se mudaram para a Vila Salão, com 39 casas, no município de Sertânia (PE).

Após dois anos, os moradores contam que muitas promessas não saíram do papel. Os lotes, a alguns quilômetros da vila, ainda não têm área irrigada e ficam desprotegidos, em uma região onde o furto de arames de cerca e da produção agrícola são comuns.

 

“Do jeito que está lá, se eu achar negócio, eu já estou vendendo”, diz Conceição, sobre o seu lote, distante 5 km da Vila Salão. Em vez de trabalhar lá, ela cultiva um hectare nos fundos da casa, com a ajuda do marido. A agricultora diz que não pode criar animais por causa dos vizinhos e que, por isso, agora precisa comprar carne e ovos.


RAIO-X DA TRANSPOSIÇÃO

Mapa que mostra os dois eixos da obra de transposição do rio São Francisco
Transposição do rio São Francisco - Folhapress

O que é
Integração do rio São Francisco a rios temporários do semiárido por meio de canais artificiais

Quem será atendido
A população de 255 municípios de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará

Os dois eixos

Eixo Leste:

  • Inauguração: mar.2017
  • Extensão: 217 km
  • Pessoas beneficiadas: 1 milhão
  • Municípios beneficiados: 32 (PE e PB)

Eixo norte:

  • Inauguração: 2ºsem.2018 (falta 5% da obra)
  • Extensão: 260 km
  • Pessoas beneficiadas: 7,1 milhões
  • Municípios beneficiados: 223 (PE, PB, RN e CE)

Outro problema é a água. Moradores reclamam que, mesmo sem fornecimento, a Compesa (companhia estadual de saneamento) envia fatura para pagamento. “Nem paguei nem pago porque não consumi. Já botei no Procon, está lá”, diz a agricultora.

Em razão da falta de água, a família instalou um sistema de captação de chuva e abriu um poço, aumentando os gastos com luz por causa da bomba. “Não chega um pingo de água na casa de mãe.”

“Lá onde eu morava, energia era só de casa mesmo. E tinha minha água, boa ou ruim, tinha o meu poço pertinho e botava a minha água na carroça. Piorou 100%”, diz Conceição, em tom irritado. “Tudo tem de comprar, não tem defesa de nada.” 

De positivo, ela menciona a ajuda mensal de R$ 960 e a casa —mas com ressalvas: “O que não presta é o telhado. Quando tem chuva, entra água por todo canto”.

Ao todo, 848 famílias foram reassentadas por causa da transposição, enquanto outros 2.580 proprietários preferiram pegar a indenização. Apenas duas vilas ficam no eixo leste do projeto.

Comandado por Helder Barbalho (MDB-PA), o Ministério da Integração Nacional informou que as áreas irrigadas serão entregues “quando o empreendimento entrar em operação definitiva”. “O Projeto São Francisco está em pré-operação. Nesta fase, são realizados ajustes e testes para verificar o funcionamento dos equipamentos hidromecânicos e das estruturas de engenharia”, informou o comunicado.

Segundo a assessoria, a compra do maquinário para irrigação das vilas ainda está em processo licitatório.
Sobre as cercas nos lotes, o ministério afirma que o custo é responsabilidade de cada morador, conforme teria sido explicado desde o início.

Com relação à distribuição dos lotes, a localização teria sido definida em razão da topografia. “As localizações foram sorteadas entre os moradores do conjunto habitacional. E todas as questões foram explicadas durante o processo.”

Apesar de os moradores terem dito que relataram os problemas de infiltração nas casas, a assessoria afirma que a pasta desconhecia a situação: “O Ministério da Integração irá verificar a situação em campo para avaliar a melhor forma de solucioná-la.”

Procurada, a Compesa diz que precisa do número de registro dos consumidores para comentar os problemas.

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