Inspeção viu situação alarmante e vulnerável em prisão com mortos no Pará

Unidade superlotada precisava de muro com urgência, diz relatório do CNJ

Massacre deixa mais de 20 mortos em presídio na região metropolitana de Belém, no Pará
Massacre deixa mais de 20 mortos em presídio na região metropolitana de Belém, no Pará - Reprodução
Guilherme Seto
São Paulo

Relatório elaborado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) em fevereiro deste ano solicitou a construção urgente de uma "muralha para isolamento" do Centro de Recuperação Penitenciário do Pará 3 (CRPP 3), na região metropolitana de Belém,  e pediu que fosse encontrada uma solução para a "profunda superlotação" do local. Nesta terça-feira (10), 22 pessoas morreram durante uma tentativa de fuga do presídio.

Segundo a Susipe (Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará), a ação foi realizada de maneira coordenada. Um grupo de presos iniciou um motim dentro do presídio, enquanto criminosos tentavam fazer o resgate de detentos pelo lado de fora do complexo, que fica às margens da rodovia BR-316.

Local de assassinato na Grande Belém; 22 foram mortos
Local de assassinato na Grande Belém; 22 foram mortos - Reprodução/ TV Liberal

Em fevereiro, o CNJ solicitara a construção da muralha justamente para evitar "a facilidade do resgate realizado com apoio externo", situação classificada como "alarmante, insustentável e recorrente". Também afirma que objetos ilícitos, como armas, são constantemente arremessados para dentro do presídio, o que seria dificultado pela recomendada muralha.

O relatório, elaborado a partir de inspeções presenciais, aponta profunda superlotação do presídio, que teria capacidade de 432 presos e estaria abrigando 660 em condições definidas como "péssimas".

O texto ainda pede reforço urgente da estrutura de segurança da área de visitação, que não conta com uma muralha, mas apenas com "um alambrado e concertina, situação de vulnerabilidade inaceitável para um presídio de alta segurança".

As fugas em massa são colocadas como "recorrentes" no relatório.

TENTATIVA DE FUGA

Segundo a Susipe, a ação foi realizada de maneira coordenada. Um grupo de presos iniciou um motim dentro do presídio, enquanto criminosos tentavam fazer o resgate de detentos pelo lado de fora do complexo, que fica às margens da rodovia BR-316.

Seis agentes prisionais foram feitos reféns, resultando em confronto entre os criminosos e policiais que faziam a segurança interna do presídio.

Informações preliminares da Segup (Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social), durante a tentativa de fuga, a investida externa utilizou explosivos contra um dos muros do pavilhão C do presídio.

A identidade do agente prisional morto durante a troca de tiros segue mantida em sigilo. Outros quatro agentes de segurança ficaram feridos, sendo que um está em estado grave e recebe atendimento em hospital da região metropolitana de Belém.

Após vistoria e contagem de presos, a Segup confirmou que entre os mortos havia um agente prisional, 16 presos e cinco criminosos que estariam ajudando na fuga dos detentos pelo lado de fora. 

MAIS ASSASSINATOS

Este início de semana na Grande Belém tem sido marcado pela violência. Doze pessoas foram assassinadas em um intervalo de cinco horas nesta segunda-feira (10). Exceto por uma mulher, as vítimas são homens na faixa de 18 a 30 anos.

As mortes ocorrem na sequência de dois assassinatos de policiais militares, um pela manhã da segunda e outro, na noite de domingo. Ambos estavam de folga. 

Com as mortes, segundo a secretaria, sobe para 16 o número de policiais assassinados em Belém e região metropolitana desde o início do ano. Três já estavam na reserva. O governo não informou quantos dos 13 mortos na ativa estavam ou não em serviço.

MASSACRE EM PRESÍDIOS

No início de 2017, o país viveu uma matança em diferentes presídios. À época, massacres e confrontos em série mataram ao menos 126 detentos em prisões de AmazonasRoraima e Rio Grande do Norte.

Um ano depois, como a Folha mostrou em reportagem, as realidades nesses estados seguiam longe de resolver seus principais problemas carcerários, como sistemas penitenciários superlotados, facções criminosas, infraestrutura precária, fugas e mortes.

Nem o alardeado grupo de trabalho anunciado pela ministra Cármen Lúcia (presidente do STF) como ação emergencial após aquela matança de 2017 mudou o quadro dos presídios no país.

SUPERLOTAÇÃO

O Brasil ultrapassou a Rússia em 2015 e agora abriga a terceira maior população prisional do mundo, segundo dados divulgados nesta sexta (8) pelo Ministério da Justiça.

Eram 699 mil brasileiros presos naquele ano, contra 646 mil russos. Só perdemos para os Estados Unidos (2,1 milhões) e a China (1,6 milhão).

Entre os quatro países com maior população carcerária, também temos a terceira maior taxa de encarceramento por 100 mil habitantes (342) desde 2000, quando passamos os chineses (119). O índice é mais baixo que o dos americanos (698) e da Rússia (445), mas é o único que está em crescimento contínuo desde 1995.

Os dados são do Infopen (Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias), que é feito pelo Depen (Departamento Penitenciário Nacional) desde 2004 e, neste ano, contou com parceria do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A coleta foi realizada por meio de um formulário digital, preenchido pelos gestores dos estabelecimentos prisionais dos Estados.

O censo de dezembro de 2014 era o mais atual até esta sexta, quando o órgão lançou as informações de dezembro de 2015 e junho de 2016, colhidas de maneira simultânea no ano passado.

O levantamento mais recente indica que o número de vagas no sistema prisional brasileiro diminuiu, na contramão da população carcerária, que só cresce. Foram registradas 3.152 vagas a menos (queda de 0,8%) e 28.094 presos a mais (alta de 4%) no primeiro semestre de 2016, com relação ao fim de 2015.

Com isso, a taxa de ocupação nas prisões saltou de 188% para 197% no período, ou seja, há dois presos para cada vaga em presídios no Brasil. Na prática, nove em cada dez detentos vivem em unidades superlotadas.

Uma resolução do Ministério da Justiça de novembro do ano passado recomenda que o limite da ocupação seja, no máximo, de 137,5%, mas todos os Estados ultrapassam esse índice.

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