Descrição de chapéu Rio de Janeiro

Intervenção federal no Rio cria 'QG da compra' para gastar R$ 1 bilhão

Militares são chamados para auxiliar forças do RJ a adquirir equipamentos

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Imagem mostra homens com fardas militares sentados em computadores em um salão antigo, com colunas brancas e piso de madeira
Salão onde foi instalado o grupo da intervenção federal responsável por direcionar o dinheiro investido nas forças de segurança do RJ - Zo Guimarães/Folhapress
Rio de Janeiro

O salão nobre da 1ª Região Militar, onde o Exército semanalmente promovia eventos de formatura e outras solenidades, ganhou baias, mesas, computadores, cadeiras e muito papel durante a intervenção federal na segurança pública do Rio.

O espaço foi um dos poucos encontrados dentro do Palácio Duque de Caxias, no centro da cidade, para abrigar os 54 militares convocados e cinco civis nomeados para uma das principais missões do GIF, o Gabinete de Intervenção Federal: gastar R$ 1 bilhão para reequipar as forças de segurança locais.

O “quartel-general das compras” foi criado após os militares identificarem a dificuldade dos órgãos fluminenses em especificar de forma técnica os equipamentos necessários para suas atividades.

Em vez de só viabilizar orçamento para as demandas locais, o gabinete ficou responsável por detalhar os itens a serem adquiridos, elaborando todo o processo de aquisição.

“Nenhuma das especificações técnicas que eles nos entregaram pudemos pegar e encaminhar para licitação. A Polícia Militar nos pediu cerca de 200 mil uniformes. Não tinha um regulamento nem padronização. Não tenho como comprar algo sem especificação bem definida”, afirmou o general Laélio Soares de Andrade, responsável pela Secretaria de Administração do GIF.

O mesmo ocorreu com coletes, material para a polícia técnica e armas. O oficial afirma que a falha é fruto do acúmulo de funções a que os integrantes das forças do Rio de Janeiro eram submetidos.

“Como o efetivo é limitado, o mesmo militar que vai para a rua é o que especifica. Na Seap [Secretaria de Administração Penitenciária], o agente que está na vigilância dos presos é o mesmo que especifica computador. É natural essa deficiência”, disse o general.

Isso fez a estrutura da secretaria, prevista para abrigar 30 pessoas, ser praticamente dobrada. Foram convocados especialistas em processo de compras do Exército de todo o país. Dos 54 militares, 35 são de outras regiões. Eles estão alojados em quartéis da zona sul da cidade, sem familiares.

Servidores da CGU (Controladoria Geral da União) e do TCU (Tribunal de Contas da União) foram cedidos para adequar previamente os processos às exigências dos órgãos de controle.

Essa estrutura foi necessária para dar vazão ao R$ 1 bilhão disponibilizado pelo governo federal à intervenção para gasto com as forças locais, que têm até esta semana para apresentar suas listas de necessidades. Este valor é o equivalente a todo investimento feito, em valores reais, desde 2008 pelo governo estadual em segurança pública.

Há ainda outros R$ 200 milhões para custeio e pequenos investimentos do Ministério da Defesa para atividades de apoio à intervenção.

A intervenção foi decretada (às pressas e sem um plano pronto) pelo presidente Michel Temer logo após o Carnaval, quando cenas de roubos em áreas nobres da cidade foram amplamente divulgadas pela imprensa e aumentaram a percepção de insegurança e vácuo no governo.

A medida colocou polícias, bombeiros e sistema penitenciário sob o comando do interventor general Walter Souza Braga Netto, do Exército.

Ela completou sete meses no cargo no dia 16 de setembro. Não reduziu os homicídios, acumula o maior índice de mortes por policiais desde 2008 e quatro militares já foram assassinados em ação. Ao mesmo tempo, apresenta queda nos registros de crimes contra o patrimônio, como roubos de rua e de carga.

Militares envolvidos na operação apontam a reestruturação das forças locais como um dos principais legados de longo prazo da intervenção.

Há 207 processos de aquisição em tramitação, incluindo viaturas, armas, coletes e equipamentos para polícia técnica, entre outros. O GIF estuda comprar dois helicópteros.

Além dos itens adquiridos, até o aprendizado na burocracia para compras é apontado como um legado. Cerca de 150 membros das forças locais estão sendo capacitados no “QG das compras”. “A capacidade de conduzir essa documentação estava muito deteriorada”, disse o general Laélio.

A intervenção acaba em dezembro, mas a estrutura do GIF permanece até junho para acompanhar a entrega dos equipamentos adquiridos e orientar a transição. O general estuda, com uma equipe da Fazenda estadual, como garantir recursos para manutenção dos itens comprados.

“Estamos trabalhando na lei orçamentária de 2019 na área de segurança pública do Rio de Janeiro. Precisamos garantir que a lei preveja recursos para a manutenção do legado”, afirmou o oficial.


Entenda a intervenção federal no estado do RJ

Afinal, o que é a intervenção federal no RJ? É uma medida que permite que a União interfira na segurança pública do estado. Foi decretada pelo presidente Michel Temer (MDB) em 16 de fevereiro e vale até 31 de dezembro. Na prática, as polícias, os bombeiros e o sistema penitenciário estão sob o comando federal, que nomeou interventor o general Walter Souza Braga Netto, do Exército 

A intervenção era necessária? Há controvérsias. Outros estados têm índices de criminalidade piores que os do Rio (em 11º lugar na taxa de mortes violentas em 2017) e não receberam ajuda federal. A intervenção foi decretada (às pressas e sem um plano pronto) logo depois do Carnaval, quando cenas de roubos em áreas nobres foram amplamente divulgadas pela imprensa e aumentaram a percepção de insegurança e vácuo no governo do estado

O que a intervenção promete até dezembro? Em seu Plano Estratégico, divulgado quatro meses após o início da medida, há cinco objetivos: diminuir os índices de criminalidade, recuperar a capacidade operativa das polícias, articular os diversos órgãos da segurança pública, fortalecer o caráter técnico, desses órgãos e melhorar a gestão do sistema prisional

Quanto dinheiro há para isso? O orçamento repassado pelo governo federal é de R$ 1,2 bilhão para investimentos, como aquisição de equipamentos. Esses recursos não estavam previstos na Lei Orçamentária de 2018, por isso foram registrados como “crédito extraordinário”. Salários de policiais e gastos com gasolina para viaturas, por exemplo, continuam sob responsabilidade do estado do Rio 

A violência diminuiu desde que a intervenção começou? Não. Apesar de quedas em crimes contra o patrimônio, como roubos de rua e de carga, os homicídios e mortes por policiais em serviço cresceram. O gabinete justifica o aumento pelo maior número de operações policiais, o que é criticado por estudiosos da segurança. A produtividade policial também não é algo a ser comemorado: houve queda nas apreensões de armas pesadas e nas prisões

A intervenção prioriza o que é mais importante? Segundo pesquisadores, não. As medidas mais exaltadas pelo gabinete têm sido a compra de materiais e a redução de índices de roubos, na contramão de princípios como queda de homicídios e de letalidade policial

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