Descrição de chapéu Agora

Ruas de comércio popular na região central de SP viram lixão após expediente

Descarte irregular no Brás e no Pari aumenta com as compras de final de ano e agrava situação

Elaine Granconato
São Paulo | Agora

As ruas de comércios populares nos bairros vizinhos Brás e Pari, região central de São Paulo, se transformam, diariamente nos finais de cada expediente, em terra de ninguém. Lixos espalhados pelo chão, desde sacos de embalagens plásticas e garrafas pet até restos de comidas e cascas de frutas diversas, chamam a atenção pela imensa quantidade.

A situação se agrava nessa época do ano, especialmente com a chegada do verão e a temporada de chuvas. A falta de conscientização das pessoas também é outro fator preocupante, que vai além das ações da gestão pública.

O descarte irregular entope bueiros, polui galerias pluviais e provoca enchente na cidade, além de contribuir para a proliferação do Aedes aegypti, mosquito transmissor da dengue, chikungunya, zika e febre amarela.

A Prefeitura de São Paulo, sob gestão de Bruno Covas (PSDB), recolhe, por dia, aproximadamente 30 toneladas de resíduos nas regiões do Brás e Pari. A partir deste mês até março de 2019, quando o movimento de pessoas é maior nos dois bairros populares, o volume chega a 55 toneladas diárias, entre lixo domiciliar, materiais diversos até entulho.

"Nossa, quanto lixo", se espantou a operadora de caixa Karina de Sales Silveira, 29, ao sair de dentro de loja de produtos infantis onde trabalha na rua Oriente, principal corredor comercial do Brás. Inicialmente, a jovem, que mora em Mauá (ABC), se dirigia à colega de trabalho, a vendedora Jaqueline Batista Honorato, 25, residente em Ferraz de Vasconcelos (Grande SP).

À reportagem do Agora, Karina disse que, como sai correndo para pegar o trem todos os dias, não presta atenção. "Hoje, reparei e vi como a rua fica um lixão. Horrível. Porquice", afirmou a mauaense, com apenas cinco meses de trabalho no bairro.

Jaqueline, com um ano e seis meses de casa, disse que a tendência é piorar. "Com as compras do fim de ano, o lixo aumenta. Tem muita gente que escorrega, inclusive, ao pisar nos saquinhos plásticos jogados no chão", disse, enquanto o material voava, antes do temporal que viria meia hora depois.

Entre a rua Tiers e a rua Itaqui, a comerciante e moradora Roseane Rocha, 49, dava exemplo de cidadania. Com um rodo, retirava os resíduos que iam para o bueiro na esquina. "Infelizmente, a cultura do nosso país é complicada", disse, indignada e molhada pela chuva.

A Prefeitura de São Paulo, sob gestão de Bruno Covas (PSDB), informou que, ao todo, existem cerca de 2.500 bueiros nessas regiões e que a limpeza ocorre "duas vezes por semana".

Especificamente nesta região, cerca de 1,2 tonelada é retirada das bocas de lixo. Frequentemente, são recolhidos resíduos de grandes geradores descartados incorretamente nas vias, assim como o lixo domiciliar colocado fora do horário correto.

Sobre o lixo nas ruas, a administração municipal informou ainda que a varrição nesses locais é feita "três vezes ao dia". Na praça instalada entre as ruas Silva Teles e João Teodoro, as equipes da Inova, concessionária do serviço, recolhem, em média, uma tonelada diária de resíduos.

Quanto ao trabalho de conscientização, a prefeitura afirma que disponibiliza equipes que visitam periodicamente as áreas de maior concentração de lixo, orientando os munícipes e informando sobre os 102 ecopontos distribuídos por São Paulo e os endereços mais próximos desses locais.

O descarte irregular de entulho em vias públicas é passível de multa. Até 50 quilos, o valor da multa é de R$ 790,18; acima desse montante, o valor da autuação sobe para R$ 15.520 mil, conforme a lei de limpeza urbana 13.478/02.

"Eu amo São Paulo de paixão, mas é uma vergonha isso aqui", disse Izenilce Alves Leão, 49 anos, auxiliar de limpeza de rede de shoppings na região do Pari. Há 29 anos, ela deixou Itapebi (479 km da Bahia), para viver em solo paulistano e ver seus dois filhos crescerem.

Izenilce reside no bairro o mesmo período. "Os próprios camelos são culpados por isso aqui", afirmou, referindo-se aos lixos boiando na esquina das ruas Hannemann com Tiers, com a chuva de menos de uma hora.

No local, cascas de melancias e abacaxis, garrafas pet, coco e embalagens de marmitex iam diretamente para o bueiro entupido.

"Se cada um recolhesse o seu saquinho de lixo, tudo seria diferente", receitou a auxiliar de limpeza.

Menos de uma hora de chuva foi o suficiente para causar pontos de alagamentos em algumas ruas do Brás e do Pari, na região central de São Paulo no início da noite da última quarta-feira. Isso porque lixos esparramados pelo chão, alguns armazenados em sacos plásticos abertos, entupiram os bueiros das redondezas.

Nas esquinas famosas do Brás, entre as ruas Silvia Teles e João Teodoro, lixeiros recolhiam com pás e as mãos, embaixo de chuva, sacos e lixos espalhados no entorno da praça República da Coreia.

"Faça chuva ou sol, temos de recolher. Por dia, só aqui são cerca de 800 quilos", disse um dos lixeiros, cansado pelo esforço. Outro funcionário da limpeza pública afirmou que os carroceiros são os causadores. "Eles abrem os sacos e ficam escolhendo. O que não querem descartam, simplesmente, nas ruas", contou.

Do outro lado da rua, estavam dois carroceiros que, apesar da chuva, ainda jogavam água, utilizando baldes, em cima do papelão que haviam recolhido, para ganhar peso na hora da venda para a reciclagem.

O lixo acumulado e espalhado nas regiões do Brás e do Pari já foi tema de discussão entre os integrantes da Associação Comercial de São Paulo, entidade com 124 anos e 10.807 empreendedores, entre comércio, serviços, indústria, agronegócios e profissionais liberais.

Na época, representantes da concessionária que faz o recolhimento do lixo para a Prefeitura de São Paulo sugeriram a instalação de containers de aço nas quadras das principais vias públicas de comércio popular da cidade.

"Além do movimento muito grande na região, a quantidade de lixo gerada pelas empresas é imensa. Muitas empresas não embalam o resíduo ou o fazem de maneira errada", afirma o vice-presidente e coordenador do Conselho de Política Urbana da associação comercial, Antonio Carlo Pela.

Como resultado, principalmente em época de chuva, dejetos vão para os bueiros e provocam as tradicionais enchentes na cidade. "Se os comerciantes aceitassem a ideia dos containers, pelo menos, minimizaria a situação", diz Pela.

Representantes da Alobras (Associação dos Lojistas do Brás), que também atende à região do Pari, não foram localizados pela reportagem para comentar

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