José Guilherme Merquior (1941-1991), um dos maiores intelectuais de seu tempo, talvez não tivesse publicado uma linha não fosse sua mulher, Hilda, ao seu lado.
É essa a avaliação de amigos do casal sobre a mulher que viveu por organizar a vida e o pensamento do ensaísta e embaixador brasileiro. “Acredito que não tenha um dia na vida de minha mãe que ela não tenha pensado no meu pai”, diz a filha do casal, Julia.
O encontro ocorreu numa sala de aula. Aos 17, mudou-se para um colégio novo e ao seu lado se sentou José Guilherme. “Brincavam que ali sentou e nunca mais se levantou”, diz Julia.
Carlos Drummond de Andrade lhes enviou um poema como presente de casamento, poucos anos depois: “Hilda e Guilherme (José), que o poema/ —projeto claro de vocês dois,/ seja perfeito em timbre, fonema,/ na prima estrofe e sempre depois”.
José Guilherme tornou-se diplomata e juntos moraram na França, Alemanha, México, Inglaterra e Uruguai, conta Julia.
Foi Hilda quem datilografou os mais de 20 livros que o marido escreveu à mão. Era também ela quem batia o martelo sobre as finanças da família.
Estudou inglês, francês e alemão e aprendeu italiano e espanhol sozinha. “Falava alemão melhor que o Zé Guilherme”, diz José Mario Pereira, amigo do casal.
Hilda traduziu e publicou artigo do filósofo húngaro György Lukács sobre os escritores Goethe e Schiller. Também aproximou-se de intelectuais que se correspondiam com o marido, como Claude Lévi-Strauss e Arnaldo Momigliano, diz Pereira.
Amante de música clássica, tinha gavetas cheias de folhetos de concertos assistidos, com anotações sobre a performance dos músicos.
Sofreu o primeiro grande baque quando José Guilherme morreu precocemente, aos 49, vítima de um câncer. Hilda voltou ao Brasil, de Paris, e comprou uma casa no Rio. Passava as manhãs caminhando pelo Jardim Botânico. O segundo revés foi quando seu filho, Pedro, morreu num acidente de trânsito, em 2004.
Em estágio avançado de Alzheimer, morreu na última segunda-feira (3). Deixa a filha, Julia, e três netas.
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