Quatro presos envolvidos em massacre no PA são mortos por asfixia em transferência

Assassinatos ocorreram dentro de um caminhão que ia até Marabá; Bolsonaro diz que problemas acontecem

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Altamira (PA) e Anápolis (GO)

Quatro detentos que sobreviveram ao massacre no presídio de Altamira, na segunda (29), foram assassinados durante a transferência, na noite desta terça (30). Eles faziam parte de um grupo de 30 homens que seriam levados em um caminhão de transporte de presos até Belém, a 829 km.

Ao menos 58 presos já haviam morrido no Centro de Recuperação Regional, em Altamira, 16 deles decapitados. Esta foi a maior rebelião do ano no país, superando a de maio, em Manaus, com 55 mortos. 

À imprensa, representantes do governo do Pará, de Helder Barbalho (MDB), afirmaram que os presos em transferência foram mortos por asfixia entre as 19h de terça e a 1h desta quarta-feira (31). Todos os presos estariam com algemas plásticas, amarrados em duplas, com as mãos para trás. O caminhão em que eles estavam é dividido em quatro celas.

"Os quatro foram mortos por asfixia, por estrangulamento mecânico", afirmou o secretário de Segurança Pública do Pará, Uálame Machado. "Há indícios nas próprias algemas de partes de DNA do corpo, de pele, de cabelo que identificam isso." 

Machado disse que o caminhão parou em Novo Repartimento, a 321 km de Altamira, para que os presos se alimentassem. As mortes teriam ocorrido em seguida, entre essa cidade e Marabá, a 180 km.

O secretário afirmou que cada uma das celas conta com uma câmera que transmite imagens à boleia, mas que o sistema deixou de transmitir durante as mortes por se tratar de um trecho sem pavimento e esburacado. Não há gravação das imagens.

Ele negou qualquer problema de ventilação e disse que uma perícia concluiu não ser possível ouvir gritos e batidas de dentro da boleia. 

As mortes só teriam sido descobertas na chegada a Marabá. Três já estavam mortos e um quarto chegou a ser socorrido, mas não resistiu. Nove presos que teriam conseguido romper as algemas são tratados como os principais suspeitos dos assassinatos. 

Machado negou erro de procedimento, sob o argumento de que todos os 30 transferidos pertenceriam à facção Comando Classe A (CCA), e alguns eram companheiros de cela. "A probabilidade de que isso ocorresse era mínima."

O governo removeu ao todo 46 presos de Altamira. Desses, 10 irão a presídios federais fora do Pará, após acordo com o Ministério da Justiça. Eles foram transportados de avião e já estão em Belém.

Antes da divulgação da investigação do governo paraense, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou que as mortes desses presos são problemas que "acontecem". "Com toda a certeza, deveriam estar feridos, né? É como uma ambulância quando pega uma pessoa até doente, no deslocamento, ela pode falecer", disse Bolsonaro. "Pessoal, problemas acontecem, está certo?", ressaltou.

O presidente afirmou que conversará sobre o cenário de violência no Pará com o ministro da Justiça, Sergio Moro, e, apesar de reconhecer que há cláusula pétrea contrária a isso, defendeu o trabalho forçado de presidiários no Brasil.

"Eu sonho com um presídio agrícola. É cláusula pétrea, mas eu gostaria que tivesse trabalho forçado no Brasil para esse tipo de gente. Não pode forçar a barra. Ninguém quer maltratar presos nem quer que sejam mortos, mas é o habitat deles, né", disse.

O presidente afirmou que fica com "muita pena" dos familiares dos presos e das vítimas e que espera que a situação no Pará "seja resolvida". Ele lembrou que o fundo penitenciário federal já socorre as entidades da federação.

"Se pudéssemos ter uma autoridade em cima do presidiário, como o americano tem, seria muito bom para nós", afirmou Bolsonaro.

Com as quatro mortes durante a transferência, sobe para 62 o número de vítimas em decorrência da rebelião da última segunda. Os assassinados no caminhão são Dhenison de Souza Ferreira, José Ítalo Meireles Oliveira, Valdenildo Moreira Mendes e Werik de Sousa Lima.

Guardados de forma improvisada em um caminhão frigorífico sob o inclemente sol amazônico, os corpos removidos do presídio se decompõem em meio à dificuldade para identificar as vítimas. 

Por falta de espaço, os cadáveres são examinados sob uma tenda improvisada e sem refrigeração no pátio do IML, sob gestão estadual. Nesta quarta, famílias enterraram os primeiros corpos liberados em um cemitério em Altamira.

De acordo com o Sistema Penitenciário do Pará (Susipe), a rebelião começou por volta das 7h, durante o café da manhã. O massacre foi motivado por uma disputa entre duas facções criminosas pelo controle da unidade prisional, segundo o governo do Pará.

O Comando Classe A é adversário da facção carioca Comando Vermelho (CV), que vem se expandindo no Norte do país por meio de alianças regionais e da perda de poder na região do Primeiro Comando da Capital (PCC), alvo do massacre do Ano-Novo de 2017 nos presídios de Manaus.

Relatório do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) mostrou que a unidade tem condições classificadas como "péssimas". Além de superlotada --343 detentos cumpriam pena no local, mais que o dobro da sua capacidade, de 163 vagas--, inspeção detectou que "o quantitativo de agentes é reduzido frente ao número de internos custodiados".

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.