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Praia de paulistano, Minhocão fechado em feriado causa irritação

Acessos do elevado João Goulart, no centro de SP, estão bloqueados e têm seguranças para conter aglomerações

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São Paulo

Os Santa Cecilers não puderam pegar a sua "praia" nesta terça-feira (21), feriado de Tiradentes.

Por causa da pandemia do novo coronavírus, o Minhocão está fechado desde o dia 3 deste mês para a circulação de pedestres e ciclistas. A medida causou irritação em quem não conseguiu usar o espaço para uma caminhada ao ar livre.

Elevado João Goulart, mais conhecido como Minhocão, fechado neste feriado de Tiradentes
Elevado João Goulart, mais conhecido como Minhocão, fechado neste feriado de Tiradentes - Karime Xavier/Folhapress

Todos os acessos ao longo dos 3,4 km de extensão do elevado Presidente João Goulart foram bloqueados com cercas e tapumes.

O barulho dos frequentadores que corriam, andavam de patins, caminhavam com seus pets, tocavam violão, se amontoavam em piqueniques e até buscavam uma roupinha descolada em bazares a céu aberto não existe mais.

A única vida que ainda caminha pela estrutura de concreto e asfalto elevada a 5,5 m são os seguranças de uma empresa terceirizada contratada pela gestão do prefeito Bruno Covas (PSDB), que têm a missão de barrar a entrada de pessoas para cumprir a principal medida contra a disseminação do novo coronavírus: conter aglomerações.

Na quarentena, só entram no Minhocão equipes da Polícia Militar, do Corpo de Bombeiros, da Guarda Civil Metropolitana e do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência).

Habitué do elevado, a cartorária Cláudia Queiroz Alves, 49, estava irritada com o fechamento do elevado, mas deu um jeitinho bem paulistano para jogar baralho com o filho no espaço e ainda “tomar doses concentradas de vitamina D” fornecidas por um sol de 27º C.

Ela se acomodou sentada ao lado de Victor Hugo de Azevedo, 15, num resto de mureta de concreto bem em frente ao acesso bloqueado do Minhocão no largo Padre Péricles, na Barra Funda (zona oeste).

“O povo tá confinado com um sol desse fornecendo vitamina D de graça. Esse povo vai morrer sabe do quê? Confinado, depressivo, sem fazer um exercício físico porque não tem o direito nem de ir e nem de vir, acha que o coronavírus mata mais que tudo”, diz ela. “O coronavírus não mata mais que tudo não. O povo tava morrendo de fome, de tuberculose e ninguém dava essa atenção para a saúde como agora.”

O fechamento do elevado tem enfurecido as pessoas, conta o segurança Edinilson Ferreira, 39, que diz ser xingado todos os dias. “Tem muitas pessoas que se preocupam com seus direitos, mas esquecem dos seus deveres. Muitas dessas pessoas não têm a capacidade de parar, pegar uma informação, saber o porquê do fechamento, dar um bom dia, boa tarde, boa noite. Elas já passam xingando a gente”, afirma Ferreira.

Ferreira afirma que, no último domingo (19), chegou a ser cercado por um grupo de 15 ciclistas que insistiam em querer entrar no espaço. “Eles só não entraram porque chegou uma equipe da empresa para trazer o nosso almoço. Isso inibiu”.

O segurança e os seus colegas enfrentam situações adversas para manter a determinação do governo. Trabalham desde o dia 3 de abril no Minhocão sob o calor do sol e não têm banheiro disponível para cumprirem jornadas de 12 horas. “Mas eu estava desempregado. Preciso ganhar esses R$ 100 por plantão para manter a minha esposa e o meu filho.”

Com o Minhocão fechado, o plano B dos paulistanos que moram nos arredores do elevado e resolveram sair de casa em plena quarentena foi a praça Franklin Roosevelt, também no centro.

Os frequentadores utilizavam os canteiros como aparatos para sequências de exercícios físicos. Havia muita gente tomando sol e outros que decidiram levar o pet para um passeio.

Foi esse roteiro que o casal Maria Fernanda Fortes Veiga Paulo, 48, e Anderson Paulo, 44, seguiu à risca. A biomédica estendeu uma canga sob a sombra de uma árvore na praça, que serviu também para manter o shih tzu Toddy, 4, em segurança.

“Resolvemos sair de casa para tirar o bolor, pegar um pouco de vitamina D. Nosso corpo não pode ficar muito tempo parado”, diz o terapeuta Anderson.

A biomédica contou à Folha que ficou triste com o fechamento do Minhocão, local em que tomava água de coco e caminhava semanalmente. “Mas, para a nossa sorte, a praça Roosevelt está aberta. O tempo de sofá se tornou muito grande. Então, a gente vem aqui, se esparrama, come uma fruta e agradece por estar vivo em meio a tudo isso.”

Também no local, viaturas da Polícia Militar vez ou outra emitiam informes sonoros sobre os cuidados que a população precisa tomar na quarentena, como usar máscaras, regra pouco seguida por quem se exercitava na praça.

O engenheiro civil Marcos Roberto Souza, 28, andava de bike na Roosevelt na tarde deste feriado porque não conseguiu acessar o Minhocão. Mas Souza, que vê o elevado João Goulart da sua janela, percebeu um fato. “Pelo menos, a prefeitura está aproveitando a quarentena para fazer obras na estrutura.”

A prefeitura de São Paulo informou que o Minhocão seguirá em quarentena até o dia 10 de maio, data em que deve terminar o isolamento social na cidade. Para carros, a via é fechada no período noturno e aos finais de semana e feriados pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego).

A via elevada, que liga o largo Padre Péricles à praça Roosevelt, comunicando-se a partir daí com a Radial Leste, recebe ao dia cerca de 78 mil veículos. Sua construção deixou uma imagem de paisagem degradada no entorno; em alguns pontos, o elevado quase encosta nos prédios.

Antes da pandemia, a gestão Bruno Covas tocava um projeto para transformar a pista elevada num parque linear. A primeira fase da obra ficou orçada em R$ 38 milhões.

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