Desembargador defende tratamento diferenciado ao tênis e libera academia em São Paulo

Magistrado listado como membro da Federação Paulista de Tênis cita risco econômico à empresa

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São Paulo

O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu nesta semana liminar em mandado de segurança que autoriza uma academia particular de tênis, no bairro Saúde, na zona sul na capital, a voltar funcionar imediatamente e a descumprir, assim, o decreto estadual que proíbe o funcionamento de serviços não essenciais por causa da pandemia do novo coronavírus. Cabe recurso à decisão.

A liminar foi concedida na segunda (27) pelo desembargador Cláudio Antônio Soares Levada, do Órgão Especial do TJ, que, em sua decisão, defende tratamento diferenciado à prática de tênis por não apresentar, segundo ele, risco à saúde. Ele alega ainda que o esporte melhora “a capacidade cardiorrespiratória de seus praticantes, o que é relevante no combate ao vírus Covid-19".

Atividades desportivas individuais, porém, como caminhadas, ciclismo e tênis, em que virtualmente ausentes contato físico e aglomerações, além de melhorarem a capacidade cardíaca e respiratória, devem ter tratamento diferenciado, como se comprova terem tido, com razoabilidade, nas cidades de Foz do Iguaçu, Paraná, e Teixeira de Freitas, na Bahia”, afirmou o magistrado se referindo a prefeituras que foram favoráveis a prática de tênis.

A decisão do desembargador refere-se ao decreto publicado pelo governador João Doria (PSDB) que proíbe o atendimento presencial ao público em estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços, como “academias e centros de ginástica”. São Paulo é o epicentro do Covid-19 no Brasil com um total de 28.698 casos confirmados e 2.375 mortes. Só na capital são 16.638 casos e 1.439 mortes.

Para o desembargador, que consta como federado pela Federação Paulista de Tênis, o uso de equipamentos de segurança individual consegue afastar os riscos de contaminação –mesmo se jogado em dupla.

Levada é crítico ao isolamento social universal. Em artigo publicado em 27 de março no Jornal da Cidade de Jundiaí, intitulado “O que Mata Mais?”, ele critica o que chama de “políticos oportunistas e carreiristas”, citando o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), e governador João Doria.

O desembargador ecoa o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e diz no artigo estar havendo disseminação de pânico pela mídia. “Sou médico? Não. Mas estou replicando a opinião de inúmeros infectologistas, entre os quais Osmar Terra, que foi Secretário da Saúde por oito anos”, escreve.

Na decisão, que favorece uma das três unidades da Academia Winner Tennis, o magistrado não cita estudo científico nem parecer de autoridade médico-sanitária. Argumenta, entre outras coisas, que há risco econômico à academia de tênis , em razão de “prejuízos financeiros que se acumulam à impetrante, podendo conduzi-la ao fechamento e ao desemprego de seus colaboradores.”

A advogada da Winner Tennis, Andrea Alvares Macri, disse que a academia não enfrenta tais problemas. “Problemas financeiros ainda não, mas, em relação aos colaboradores, já haviam sido colocados de férias, férias e, caso as atividades não fossem retomadas, teriam que dispensar alguns", afirmou, acrescentando que a academia tem 14 funcionários.

Ainda segundo Macri, a academia tem cerca de 200 alunos em todas as suas unidades. Haverá um plano de ação e contingenciamento que prevê a obrigatoriedade do uso de máscaras, higienização das quadras, redes e bolinhas, isolamento da recepção, sinalização de segurança e oferta de álcool gel.

A Winner Tennis informou já ter voltado a funcionar.

Para magistrados ouvidos pela Folha, essa a fiscalização do cumprimento desse plano “de ação e contingenciamento” continuaria a cargo do Poder Executivo, mas na prática seria um salvo-conduto para que a fiscalização abandone o local, sem força punitiva.

Procurado pela Folha, o desembargador declarou por escrito que, há mais de 20 anos, “não pisa em uma quadra de tênis nem tampouco paga como associado a Federação Paulista de Tênis”. “Essa filiação é de décadas e seu nome ali permanece. Repudia, veemente, a conjectura torpe de que decide com base em interesse pessoal. Quem o conhece sabe que ele assim não age e nunca agiu”, afirmou ele.

Sobre o artigo no jornal jundiaiense, o magistrado não informou se mantém o mesmo posicionamento.

Procurado,o governo Doria disse que vai tomar medidas cabíveis assim que for intimado da decisão, com "a confiança de que a Justiça irá reconhecer a importância do distanciamento social para combater a pandemia do coronavírus”.

O Ministério Público ainda não se manifestou no processo. Questionado pela Folha, não quis adiantar qual será seu posicionamento sobre isso.

De acordo com o Tribunal de Justiça, a Lei Orgânica da Magistratura não permite aos magistrados quaisquer comentários sobre decisões suas ou de outrém nem sobre a fundamentação contida na decisão. "Destacamos, que, da decisão, cabe recurso", diz nota enviada à reportagem.

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