Entre as profissões oficiais havia jornalista, intérprete, escritora. Desconfiavam os amigos, no entanto, que Lia Rangel Cortes mantivesse outros ofícios secretos: fada, deusa, borboleta.
É que, explicam os mais próximos, feito as criaturas mágicas Lia espalhou generosidade e sabedoria com seu trabalho voltado às mulheres, que havia seis anos pregava o autoconhecimento por meio da literatura.
Natural de Londrina, no Paraná, Lia Rangel nasceu em 28 de fevereiro de 1979, uma quarta-feira de cinzas.
Filha mais velha do arquiteto Paulo Roberto Cortes e da professora Lourdes Maria Rangel Cortes, passou lá a primeira década de vida antes de se mudar com a família para São José dos Campos (97 km de SP).
Fez intercâmbio na Baviera, onde aprendeu a falar alemão, o que mais tarde lhe renderia importantes oportunidades de trabalho. Em 1998, foi cursar jornalismo em São Paulo.
Na mesma sala de aula, algumas carteiras para o lado, conheceu Rodrigo Savazoni, 39, seu companheiro até o último dia.
A amizade, que começou com jornadas de metrô até o terminal de ônibus, aos sábados, sempre depois das aulas de educação física, virou namoro um ano depois. "Ali eu conheci o amor da minha vida", lembra Savazoni.
Em 2003, os dois se mudam para Brasília. No ano seguinte, a gravidez da primeira filha desperta em Lia aquele que seria seu norte: o feminino. O chamado veio tão forte que ela se entregou de vez aos estudos e processos de formação para ensinar escrita biográfica às mulheres.
Em sua criatividade de autora, o câncer no pulmão descoberto em 2018 virou um polvo, com o qual não se deveria travar briga, mas, sim, dançar.
A experiência do viver e morrer deu origem a uma dissertação de mestrado na Unifesp, inconclusa após a interrupção prematura da honrosa coreografia de Lia.
No dia 6 de maio, aos 41 anos, escreveu um texto de adeus em seu diário, e se despediu de Rodrigo, dos filhos Julia e Francisco, dos pais e dos irmãos, Gabriel e Tiago. Em 7 de maio, sob a luz da lua cheia, Lia partiu.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.