'Precisamos olhar a ciência e a medicina de forma mais humana', diz imunologista

Médico conta como o desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19 dominou toda a sua vida no último ano

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São Paulo

Em depoimento à Folha, o imunologista Gustavo Miranda, 39, pesquisador no Instituto de Ciências Biomédicas da USP, conta como a pandemia mudou o rumo da sua carreira e como ele tem conciliado as novas funções com sua vida pessoal.

Meu caso é uma situação atípica. Durante cinco anos, eu estive na Europa, fazendo doutorado, pós-doutorado e pesquisas na Inglaterra e na Suíça. Em 2019, eu já estava cheio de morar fora e acabei voltando para o Brasil.

Assim que cheguei, passei a liderar um projeto gigante para desenvolver vacinas contra chikungunya, dengue e zika. Em fevereiro de 2020, o estudo mal tinha começado e já tivemos que adaptá-lo completamente para a Covid.

A minha vida ficou toda direcionada para isso, não existia outra coisa. Eu costumava ouvir: 'Como um rapaz de 38 anos já chega liderando um projeto tão grande?'.

Eu tive que montar equipe e me estabelecer cientificamente. Lidar com os egos do meio acadêmico me atrapalhou muito, sobretudo psicologicamente.

Ao mesmo tempo, levei painho e mainha para morarem comigo por um tempo em São Paulo. Eles vivem na Bahia e são muito apegados a mim.

Mas chegou uma hora que eles não aguentaram mais ficar aqui e, então, eu tive que levá-los de volta.
No meio de tudo isso, comecei a fazer também comunicação científica. Estar em muitos projetos, fazer pesquisa, participar de programas na mídia, dar palestras, tudo isso junto me faz feliz.

Descobri que, no momento em que estou fazendo essa parte de comunicação, é quando eu mais consigo relaxar.

As pessoas me perguntam se eu não fico nervoso quando vou para frente das câmeras e digo: 'Eu adoro'.

A pandemia foi um momento de autodescoberta. De repente, estourei na mídia. O pessoal ficou me procurando para dar entrevista, e eu achando aquilo tudo lindo.

Quero fazer comunicação, ciência, dar aula e escrever a minha vida inteira. As pessoas mais próximas me dizem que preciso me cuidar mais. Quando eu estava na Europa, chegou um momento em que fiquei meio deprimido e pensei em voltar ao Brasil justamente para me cuidar mais.

O que aconteceu foi o contrário. Agora, minha noiva fica pegando no meu pé. Estou tentando cuidar melhor da saúde e da vida pessoal, porque uma das coisas que me fazem bem é ficar na ativa.

Dou atenção para minha noiva, se não conseguir tomo cascudo. Ela tem muita influência sobre mim. Sou durão no trabalho, mas como pessoa sou um molengão. As quatro pessoas com mais influência sobre mim são minha noiva, meus pais e meu irmão mais novo.

Com o nível de trabalho que temos nessa área, é complicado pensar sobre isso, mas é preciso ter um olhar mais humano para a nossa profissão e para a própria ciência. Eu tento discutir isso de uma maneira leve, mais humanizada, e cuidar de mim, na medida em que posso.

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