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Deslizamento causou morte de 7 pessoas da mesma família em Franco da Rocha

Outros 25 parentes ficaram desalojados após perderem suas casas no domingo (30)

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São Paulo

O aposentado José Bonfim Filho, 82 anos, o tio Zeca, costumava passar o dia sentado na porta de casa olhando os passarinhos ou o vazio da rua, talvez à espera dos netos Lucas e Letícia dos Santos (gêmeos de 16 anos) voltarem da escola, ou para falar sobre algum jogo do São Paulo com Anderson da Costa, 26, um de seus tantos sobrinhos.

A forte chuva do último domingo (30), porém, destruiu a rotina de boa parte da família que dividia casas vizinhas no Parque Paulista, em Franco da Rocha, na Grande São Paulo.

Os quatro estão entre as sete pessoas de uma mesma família que morreram após o deslizamento de um barranco na manhã de domingo na rua São Carlos. A terra atingiu três imóveis onde eles moravam.

Os outros três mortos na família são Diego dos Santos, 28 —irmão dos gêmeos—, Cléber Bonfim, 37, e Vinícius Pina, 13, sobrinhos do tio Zeca.

No total, 11 corpos foram retirados dali até a madrugada desta quarta-feira (2) —os últimos três, dos gêmeos e do idoso. Bombeiros ainda procuram por mais sete pessoas que moravam na área hoje coberta por lama e entulho. Segundo a Defesa Civil, 15 casas foram soterradas.

Além do luto, diz a gerente de vendas Onara Dimitriadis, 35, existe a preocupação com 25 pessoas da família que ficaram desalojadas. Ela é sobrinha do tio Zeca e mora no Ipiranga, zona sul de São Paulo.

"É um cenário devastador, triste", afirma Onara, que desde domingo junta dinheiro por meio de uma vaquinha virtual para bancar tantos funerais. Os R$ 10 mil arrecadados até a tarde desta quarta custearam velórios, caixões e jazigos em Franco da Rocha. "A prefeitura ofereceu enterro social, gavetas para os corpos, mas eles mereciam mais."

Montagem com fotos de parentes mortos em deslizamento de terra em Franco da Rocha, na Grande SP; família busca recursos para custear funerais, novas moradias e ajudar as demais pessoas que tiveram de deixar suas casas por causa da tragédia - Arquivo pessoal

Onara também junta recursos para ajudar os sobreviventes a reconstruir a vida. Desde domingo, os desalojados estão na casa de um outro familiar, a alguns metros do local da tragédia, mas que não corre perigo de ser atingida por novo deslizamento —desde o início das buscas, os bombeiros tiveram de interromper várias vezes os trabalhos quando notaram que havia riscos.

O corre-corre começou por volta das 6h de domingo, quando quatro pessoas da família perceberam que poderia haver uma tragédia e saíram da casa que não foi atingida por pouco. "Uma tia tentou avisar os outros, mas não deu tempo, o barranco veio abaixo", diz a sobrinha. "A partir daí, começaram a chamar pelos nomes. Uma tia e dois primos [que estão internados, mas sem risco de morte] pediram socorro, mas o resto não respondeu."

Em poucos minutos, passaram a pipocar relatos da tragédia no grupo de WhatsApp da família. Mensagens de alívio, como o encontro de alguém, logo viravam desespero quando se certificava que não era verdade. Ou incrédulas, quando os corpos começaram a ser resgatados no fim da tarde.

Os nomes das vítimas da tragédia também ganharam a região. O ajudante Gabriel Souza, 20, partiu para o local do desabamento para ajudar na corrente humana que se formou para a retirada da terra. Ele conhecia bem Anderson da Costa, auxiliar de produção em um frigorífico na vizinha Cajamar, e o primo dele Cléber Bonfim, que trabalhava como segurança. "Estavam sempre por aqui".

São-paulino fanático, Anderson, aliás, era o craque do bairro, segundo Miriam Aurora Monteiro, 46, também moradora do Parque Paulista. Na segunda (31), ela ajudava a carregar baldes cheios de terra nos trabalhos de resgate.

Hábil jogador, mas de videogame, Lucas era gêmeo da estudiosa Letícia. Irmãos do tímido Diego, que vivia para cuidar da mãe.

Os gêmeos Lucas e Letícia dos Santos Sampaio, 16 anos, mortos domingo (30) em um deslizamento de terra em Franco da Rocha, na Grande SP - Arquivo pessoal

O garoto Vinícius insistiu em dormir na casa do tio bom de bola no fim de semana. A avó do garoto e dois filhos dela, irmãos de Anderson, conseguiram ser socorridos e se recuperam hospitalizados. O mesmo não aconteceu com o adolescente de 13 anos.

A família migrou aos poucos de Campo Formoso, no interior da Bahia, para o bairro a partir de meados da década de 1980.

"Morei lá quando era criança até minha mãe se mudar para o Ipiranga, mas voltava nas férias para ficar com meus primos", diz Onara. "As festas sempre eram nas casas da família no Parque Paulista, mas agora eles precisam sair de lá", afirma, sobre o local. Segundo a Defesa Civil, das 188 moradias interditadas em Franco da Rocha por causa das chuvas, 62 ficam na região da rua São Carlos.

Os sobreviventes esperam agora pela definição de auxílio-aluguel por parte da prefeitura. Em nota, a administração municipal afirma que programas sociais na cidade pagam R$ 400, mas que está em estudo a possibilidade de se aumentar ao valor.

"Eles perderam tudo. Vamos ter de juntar dinheiro para comprar no mínimo móveis", diz Onara. Ela também busca arrecadar alimentos, produtos de limpeza e cobertores em dois pontos de coleta, um no Sacomã, na zona sul da capital, e outro em Franco da Rocha.

A ideia é distribuir os itens para ao menos parte dos outros cerca de 400 desalojados na cidade, principalmente para os do bairro dos parentes dela.

Franco da Rocha, cidade com a maior quantidade de mortes em razão das chuvas que atingiram São Paulo nos últimos dias, é o terceiro município da região metropolitana de São Paulo (sem contar a capital) com mais áreas de risco mapeadas.

A cidade tem 382 pontos com risco de desabamento ou alagamento, onde estão localizadas cerca de 18,8 mil moradias.

O município, com 156,4 mil habitantes, só não tem mais áreas de risco do que Santo André e São Bernardo do Campo, no ABC, segundo levantamento do Instituto de Pesquisas Ambientais da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente.

Tragédia

Outras famílias acabaram devastadas pelas chuvas do fim de semana. No próprio Parque Paulista, na noite de terça-feira (1º) foram resgatados os corpos de José Ailton Vitor Silva, 30, de Adriana da Silva Santos, 33, e de Oziel Vitor, 2, filho do casal.

Em Várzea Paulista (a 54 km da capital), morreram após serem soterrados em casa, no bairro Jardim Promeca, Ricardo Eugênio dos Santos, 41 anos, sua mulher, Tatiane Aparecida dos Santos, 30, seus filhos, Richard Eugênio dos Santos, 12, Nicolly Eugênio dos Santos, 10, e Thayany Eugênio dos Santos, de apenas um ano e dois meses de idade, "que morreu abraçada à mãe", de acordo com a prefeitura local.

Ao todo, desde a última sexta (28), morreram 27 pessoas por causa das chuvas em municípios do estado de São Paulo.

MORTOS EM FRANCO DA ROCHA

Cléber Bonfim, 37
Anderson da Costa, 26
Vinicius, 13
Amanda Sales, 25
Diego dos Santos, 28
Lucas dos Santos, 16
Letícia dos Santos Sampaio, 16
José Bonfim Filho, 82
José Aílton Vitor Silva, 30
Adriana da Silva Santos, 33
Oziel Vitor, 2

PESSOAS DESPARECIDAS, SEGUNDO A DEFESA CIVIL

Verlenia Rodrigues, 63
Vitória Rodrigues, 22
Caio Rodrigues, 36
Diana Costa, 32
Vitor Rodrigues, 10
Tamires Aparecida Ferreira Santos, 31
Gabriel Souza Cardoso, 26

Como ajudar

  • A Cruz Vermelha recebe doações de dinheiro pelo site, que permite pagamento no crédito, boleto e Pix. Também podem ser feitas presencialmente, na sede no bairro Indianópolis, em São Paulo, na av. Moreira Guimarães, 699.

  • A Cufa (Central Única das Favelas), em parceria com a FNA (Frente Nacional Antirracista) e a emissora Band, recebe doações de roupas, materiais de limpeza, higiene e eletrodomésticos em diversos pontos na capital, Barueri e Cajamar. Além disso, doações em dinheiro podem ser feitas por Paypal, Pix, boleto, cartão de crédito. Acesse a lista completa de endereços e formas de pagamento.

  • A Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) recebe alimentos não perecíveis, produtos de higiene pessoal e limpeza, roupas e água em todas as 57 estações (exceto Capuava, da Linha 10-Turquesa, que passa por obras). Os produtos serão enviados ao Fundo de Solidariedade do Estado de São Paulo e ONGs dos municípios de Francisco Morato e Franco da Rocha, que sofreram alagamentos e são atendidos pela CPTM.

  • A Caasp (Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo), em iniciativa conjunta com a Comissão de Ação Social e Cidadania da OAB-SP, recebe doações de alimentos não perecíveis e produtos de higiene pessoal em todas as unidades da Caasp no estado. Doações em dinheiro também podem ser feitas pelo Pix tesourariaadm@caasp.org.br.

  • O Fundo Social de Solidariedade de Cajamar recebe doações de alimentos não perecíveis, água, roupas, colchões, lençol/jogo de cama, produtos de limpeza e higiene pessoal para ajudar famílias de Caieiras, Franco da Rocha e Francisco Morato. As doações podem ser deixadas entre 7h e 17h em diversos pontos da cidade:

    • Núcleo do Idoso (NIC) do Polvilho, av. Tenente Marques, 3419, Polvilho;

    • Ginásio Poliesportivo Antônio Carlos Tramassi, rua Creusa Ferreira L. S. Araújo, 120, Polvilho;

    • Ginásio Poliesportivo Paulo Olavo dos Santos, av. Bento da Silva Bueno, 537, Pq. Paraíso;

    • Ginásio Poliesportivo Lamartine de Paula Lima, av. Prof. Walter Ribas de Andrade, 300, Centro;

    • Fundo Social de Solidariedade, av. Arnaldo Rojek, 403, Jardim Penteado.

  • Da mesma forma, a Prefeitura de Franco da Rocha recebe doações de alimentos não perecíveis, água, produtos de limpeza e de higiene pessoal nos seguintes endereços:

    • Grêmio Desportivo Garoa, rua Coronel Fagundes, 280, Centro;

    • Fundo Social de Solidariedade, rua Bernardino dos Passos, 72B, Jardim Cruzeiro;

    • EMEB Maria Hernandez Aguilar, rua Carlos Magno, 449, Jardim dos Reis;

    • Rua Francisco José, 46, Jardim dos Reis.

  • A Prefeitura de Jaú recebe doações de alimentos, móveis e utensílios domésticos no Ginásio de Esportes da Vila Netinho, na rua Dom Pedro I, Jardim Netinho Prado. Já o Fundo Social de Solidariedade (na rua Marechal Bittencourt, 656) e o Paço Municipal da Prefeitura (na rua Riachuelo, 306) recebem apenas alimentos.

  • A Prefeitura de Várzea Paulista pede doações de produtos de limpeza, produtos de higiene pessoal, colchões, roupas de cama, vassouras e rodos. As entregas podem ser feitas no Fundo Social de Solidariedade, na rua Pedro Poloni, 36.

  • Em São Paulo (para vítimas de Franco da Rocha), na rua Barão do Rio Prata, 185, Sacomã.
  • Vaquinha virtual (para vítimas de Franco da Rocha).
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