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Dilema entre Prefeitura de São Paulo e empresa emperra retorno de patinetes

Serviço de locação sumiu na pandemia e nova responsável pelo sistema quer retomá-lo até março

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São Paulo

A capital paulista voltará a contar, em breve, com o aluguel de patinetes por meio de aplicativo no celular. Quando exatamente, porém, ainda é um mistério.

O que tem impedido o início imediato do serviço é um imbróglio entre prefeitura e empresa responsável a respeito dos locais onde os equipamentos podem ficar estacionados, mesmo problema que deu início a uma guerra entre o poder público e a iniciativa privada em 2019.

Patinete da FlipOn em operação em cidade litorânea; empresa fornecerá equipamentos para locação em São Paulo - Divulgação

A administração municipal, sob a gestão de Ricardo Nunes (MDB), afirma que ainda não recebeu o projeto sobre as estações de locação, algo exigido para dar o aval. Segundo o CMUV (Conselho Municipal de Uso do Viário), não havia, até esta semana, qualquer previsão sobre quando isso deverá ocorrer. "A empresa ainda não entregou os projetos necessários para que a operação receba a avaliação das equipes técnicas do município", disse, em nota.

Já a FlipOn, que ganhou a disputa para implantar o sistema, é otimista em relação aos prazos. Segundo a empresa, patinetes de aluguel estarão em operação entre a segunda quinzena de fevereiro e a primeira de março nas proximidades das avenidas Brigadeiro Faria Lima e Paulista, suas primeiras áreas de atuação.

O desbloqueio custará R$ 3,20, mais R$ 0,50 por minuto de uso. Uma corrida de 10 minutos ficará em R$ 8,20, por exemplo.

"Já estamos credenciados na prefeitura para executar a operação, já apresentamos o plano operacional com as etapas do projeto em acordo com a legislação municipal e, por último, a CET nos solicitou um projeto de implantação das estações", diz o diretor comercial Mauricio Petinelli.

Segundo a empresa, o projeto está pronto, encontra-se em fase de revisão e será apresentado nos próximos dias. "Com isso, contamos com a agilidade peculiar da prefeitura, que está nos dando total atenção para a demanda, e com isso podermos iniciar até primeira quinzena de março", afirma Petinelli.

"Da nossa parte está tudo pronto. Frota disponível, testes de operação realizados, toda estrutura pronta", completa.

A administração municipal exige que seja algo diferente do passado, quando os equipamentos podiam ficar parados em qualquer lugar dentro da área de operação. A prefeitura determina a existência de pontos físicos de locação, as estações, que qualquer um possa ver ao caminhar pela cidade. Já a empresa trabalha também com um sistema de "cercas virtuais", onde pontos de parada ficariam visíveis no celular, em áreas delimitadas pelo GPS. Daí a confusão.

Durante a semana, o secretário de Mobilidade e Trânsito, Ricardo Teixeira, teve uma reunião com o ex-vereador José Police Neto, que, durante seu mandato, fez projeto de lei sobre a regulamentação de patinetes.

Da conversa, surgiu a possibilidade de usar uma vaga de cinco metros antes de faixas de pedestres como o espaço de parada dos equipamentos. A ideia é semelhante à adotada em Paris. A saída à francesa, porém, ainda é alvo de estudo.

Defensor de patinetes como opção de micromobilidade (para curtos trajetos), Police Neto aponta o fato de veículos motorizados terem o privilégio de poderem parar em qualquer lugar, exceto onde há placa com a proibição. "Não é estranho bicicleta e patinete não terem essa mesma possibilidade que o carro, de que a gente quer diminuir [o uso]?", questiona.

O tema gera controvérsia. Para o consultor em transporte e mobilidade Sérgio Ejzenberg, a regulamentação do local de parada é fundamental para evitar acidentes. "O pedestre anda olhando para o celular. Se tropeçar em patinete, o tombo é feio, é uma rasteira. Fora que gera desconforto, ao fazer as pessoas andarem desviando", diz.

Ejzenberg também é crítico em relação ao uso desse tipo de equipamento mesmo para curtos trajetos. "É um veículo que consegue causar mais acidentes que bicicletas. Como tem roda muito pequena, velocidade razoável, qualquer pequena irregularidade é suficiente para travar e gerar a ejeção do usuário", diz.

Em 2019, um empresário de 43 anos morreu ao cair e bater a cabeça em um bloco de concreto ao usar um desses equipamentos em Belo Horizonte (MG).

Quando patinetes estiverem em operação, usuários deverão seguir as regras da prefeitura, que determina, entre outras coisas, velocidade máxima de 20 km/h e uso apenas em ciclovias, ciclofaixas e vias com limite de velocidade de 40 km/h. Não é permitido circular nas calçadas e o uso é individual (proibido dar carona).

Circular por bairros ricos em cima de patinete havia febre em São Paulo antes da chegada do coronavírus.

Não era incomum encontrar engravatados ziguezagueando em ciclovias e calçadas num passado recente. Mas o serviço foi interrompido durante a pandemia, depois que as empresas responsáveis decidiram sair da capital. O cerco da prefeitura à época é apontado, em parte, como um dos motivos.

Em maio de 2019, a gestão de Bruno Covas (PSDB) chegou a recolher mais de 500 patinetes em um único dia. O assunto virou caso de polícia.

A FlipOn afirma que seu modelo de negócio é diferente daquele implementado por outros no passado. A ideia é fornecer suporte aos equipamentos e aos usuários para que sejam operados por terceiros, numa espécie de franquia.

As patinetes são compradas por uma outra empresa, que faz a oferta do serviço em determinado local e fica com o dinheiro da locação. Já há duas parceiras, uma para operar na Faria Lima e outra na Paulista.

A empresa responsável pelos equipamentos em São Paulo já conta com algumas operações semelhantes em outras 14 cidades brasileiras, incluindo Santos, Bertioga, Ilhabela e Itanhaém no litoral paulista. A expectativa dos empresários é que o sistema chegará a 90 municípios e a 12 mil patinetes em circulação.

Só na capital paulista, os planos incluem a introdução de 3.000 equipamentos. A reportagem apurou que há negociações em curso para que aplicativos de entrega de comida também façam parte dessa expansão, com uso compartilhado. Procurado, o iFood, maior do setor, disse que está estudando parcerias para uso de patinetes elétricas.

Pessoas que trabalham ou moram ao redor da Faria Lima esperam o retorno das patinetes de aluguel.

O economista Roberto Demenato, 35, lamentou bastante o fim do serviço. "Minha mulher, Bianca, também usava a toda hora. Moramos em uma travessa aqui da Faria Lima, ela tem um salão de beleza e ia para o trabalho", diz. "Foi uma perda grande durante a pandemia não ter mais esse serviço. Para mim, era muito útil."

Patinete era usada pelo bancário Marcelo Hiroshi, 52, para ganhar minutos preciosos durante o curto horário de almoço. Para ele, faz muita falta. "Precisava ir a um restaurante, a um banco, encontrar alguma coisa próxima e ajudava bastante", afirma.

Segundo Hiroshi, entretanto, é necessário que o serviço tenha regras claras. "Tinha gente que abusava. Com o pessoal que andava comigo, usávamos na ciclovia mesmo. É perigoso liberar geral para andar na calçada."

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