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CNJ abre apuração sobre conduta de juíza que induziu criança a desistir de aborto

Conselheiro chama atuação de magistrada de 'violência institucional'; órgão abriu procedimento preliminar

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Brasília

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) informou nesta terça-feira (21) que apura de forma preliminar a conduta da juíza Joana Ribeiro Zimmer, suspeita de induzir uma menina de 11 anos, grávida após ser vítima de um estupro a desistir do aborto legal.

O caso foi revelado pelo site The Intercept Brasil. De acordo com o CNJ, a Corregedoria do órgão abriu a apuração após receber a representação de um advogado e "procede à avaliação das provas existentes, a fim de estabelecer se houve prática de infração disciplinar".

Juíza Joana Ribeiro Zimmer, de Santa Catarina.
Juíza Joana Ribeiro Zimmer, de Santa Catarina - Solon Soares/Agência ALESC

Caso ateste que houve essa infração, será aberto um procedimento administrativo disciplinar contra a magistrada. Mas, se o CNJ chegar à conclusão de que não houve infração ou se considerar as provas frágeis ou insuficientes, arquivará o processo.

Em sessão do órgão durante a tarde desta terça, o conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho afirmou que foi solicitado à Corregedoria do órgão que acompanhe as apurações que têm sido feitas pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, onde a magistrada atua.

"Isso [a situação] evidentemente é uma violência institucional, é quando o Estado revitima aquela criança que merecia a proteção do Estado. Acredito que todos nós nos preocupamos e nos indignamos com as cenas daquela audiência", afirmou Bandeira.

"A nossa principal preocupação é não permitir, não dar mensagem que o CNJ endossa ou faz pouco caso daquelas cenas que nós lamentavelmente vimos."

Após ter sido comunicado sobre a situação da criança, o Conselho Tutelar a encaminhou ao Hospital Universitário de Florianópolis para realização do aborto. A equipe médica do hospital, porém, se recusou a realizar o procedimento porque a gestação já passava de 22 semanas.

O Código Penal prevê que não pode ser punido o aborto realizado no caso de gravidez resultante de estupro ou quando a vida da gestante está em risco. A lei não estipula um limite de semanas para que o procedimento seja realizado nestas situações.

Norma técnica do Ministério da Saúde diz que não há indicação para interrupção da gravidez após 22 semanas de idade gestacional. "A mulher deve ser informada da impossibilidade de
atender a solicitação do abortamento e aconselhada ao acompanhamento pré-natal especializado, facilitando-se o acesso aos procedimentos de adoção, se assim o desejar."

O Ministério Público de Santa Catarina afirma que, após ter tomado conhecimento do caso da menina, entrou com uma ação pedindo autorização judicial para a interrupção da gravidez e com uma medida protetiva de acolhimento provisório. ​

O tribunal acolheu o pedido do órgão e, em maio, a criança foi levada para um abrigo. A Promotoria afirma que o requerimento foi feito com o objetivo de proteger a menina de possíveis novos abusos.

"Principalmente enquanto não finalizada a investigação criminal que poderia indicar se o estupro ocorreu ou não no ambiente familiar", diz nota do órgão.

Segundo a reportagem feita em colaboração com o portal Catarinas, porém, na autorização da medida protetiva a juíza comparou a proteção da saúde da menina à proteção do feto. "Situação que deve ser avaliada como forma não só de protegê-la, mas de proteger o bebê em gestação, se houver viabilidade de vida extrauterina", escreveu.

Na decisão, ainda de acordo com o site, a juíza disse que os riscos eram inerentes a uma gestação naquela idade e que não havia, naquele momento, risco de morte materna.

Segundo o Intercept, apesar de o primeiro laudo ter apontado que não havia risco de morte para a menina, outros médicos do mesmo hospital avaliaram o contrário em depoimentos na audiência e em outros laudos anexados ao processo.

Entre os riscos, estariam anemia grave, pré-eclâmpsia, maior chance de hemorragias e histerectomia (retirada do útero).

Em audiência no dia 9 de maio, de acordo com a reportagem, a juíza e a promotora Mirela Dutra Alberton propuseram que a menina mantivesse a gravidez por mais "uma ou duas semanas", para aumentar a chance de sobrevida do feto.

"Você suportaria ficar mais um pouquinho?", questiona a juíza, em vídeo publicado pelo site. A promotora Alberton diz: "A gente mantinha mais uma ou duas semanas apenas a tua barriga, porque, para ele ter a chance de sobreviver mais, ele precisa tomar os medicamentos para o pulmão se formar completamente".

A Corregedoria Nacional do Ministério Público e a Corregedoria do Ministério Público de Santa Catarina informaram que instauraram reclamações disciplinares para apurar a conduta da promotora no caso.

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