Áudio da cabine emociona familiares e amigos no julgamento do voo Rio-Paris

Pilotos do voo 447 da Air France não entendiam o que estava prestes a acontecer

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Anne Lec'Hvien
Paris | AFP

A gravação em áudio das caixas-pretas do voo Rio-Paris, que caiu no mar em 2009, matando as 228 pessoas a bordo, foi divulgada nesta segunda-feira (17) durante o processo da fabricante, Airbus, e da companhia aérea, Air France, em um tribunal de Paris —um momento extremamente forte para familiares e amigos das vítimas.

"Nós ouvimos as vozes do além-túmulo", declarou Alain Jakubowicz, um dos advogados da associação Entraide et Solidarité AF447 (Cooperação e Solidariedade AF447). "Foi um momento apavorante porque ouvimos os pilotos, que em vários trechos [dizem], 'nós tentamos de tudo'. Eles não entendiam o que estava prestes a acontecer."

Equipes da Marinha do Brasil encontram no oceano Atlântico partes do avião Airbus do voo 447 da Air France - Marinha do Brasil - 1º.jun.2009/AFP

Os quatro últimos minutos do "cockpit voice recorder" (CVR), que memoriza a voz dos pilotos e os ruídos da cabine, foram divulgados sem a presença do público ou da imprensa. Só foram autorizados a entrar na sala de audiências do tribunal correcional de Paris magistrados, secretários judiciais e advogados, as partes civis e as equipes dos acusados.

Todos tiveram que desligar seus telefones e colocá-los em um saco plástico para evitar qualquer divulgação externa da gravação.

A gravação foi solicitada pelas partes civis, segundo as quais ouvir a voz dos pilotos era "absolutamente indispensável" para a "busca da verdade".

Alain Jakubowicz informou que os passageiros estavam ao lado da cabine, então "tínhamos todos em mente um cenário apavorante, ao estilo dos filmes de Hollywood", mas "não foi isso que aconteceu".

"Para as famílias das vítimas, foi muito importante. Muitas pessoas dormiam, foram despertadas pela morte", acrescentou.

Em frente à sala, as partes civis estavam aturdidas e emocionadas.

"Eu temia este momento e foi ainda mais forte do que eu poderia imaginar", reagiu Corinne Soulas, cuja filha morreu no acidente. "Os pilotos estavam perdidos, não sabiam o que os esperava, estavam na incompreensão total".

Ophélie Toulliou, que perdeu seu irmão, disse ter ouvido três pilotos "que enfrentaram uma situação que não compreendiam e que os sobrepujou completamente, pessoas que demonstraram ter um sangue frio extraordinário e que ouvimos lutar até o final".

"Atordoamento"

"A escuta do áudio do voo foi um momento extremamente forte para todas as pessoas presentes", declarou um porta-voz da Airbus. "Nós nos unimos ao sofrimento das pessoas próximas dos pilotos e das vítimas, revivido pela escuta desta gravação."

Naquela noite, em alta altitude, os pilotos do A330 foram surpreendidos pelo congelamento das sondas Pitot, que servem para medir a velocidade do avião, provocando o desligamento repentino do piloto automático. Eles não conseguiram estabilizar a aeronave.

Na manhã desta segunda-feira, o tribunal assistiu a dois vídeos da Airbus, um deles descrevendo as manobras que os pilotos deveriam ter realizado para controlar a situação. Os vídeos foram considerados pelas partes civis como dignos de um "mundo ideal" e não da "realidade".

À tarde, a defesa da fabricante, que refuta qualquer sanção penal, questionou especialistas do primeiro colegiado encarregado da instrução sobre as regras de pilotagem, a atitude da tripulação frente à condição meteorológica, e o fato de o copiloto, "o menos experiente", estar no comando.

"Para os senhores, a tripulação identificou a pane?", questionou Simon Ndiaye.

Os pilotos tinham sido treinados em um procedimento para o caso em que as velocidades não fossem "coerentes entre si"; mas, desta vez, não havia dado sobre "velocidade em absoluto", explicou o especialista.

"Houve uma espécie de atordoamento, pois os elementos que eles tinham não correspondiam à imagem mental" do que haviam aprendido, descreveu.

O segundo conselho da Airbus questionou se a resistência ao efeito surpresa faz parte dos critérios de recrutamento dos pilotos.

"Entre os militares, sim, mas entre os pilotos civis, não", respondeu o especialista. Para estes últimos, "o critério fundamental é o respeito aos procedimentos".

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