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Servidora baiana conta como criou serviço que inspirou Poupatempo, que faz 25 anos em SP

Kátia Argolo foi responsável pela implantação de modelo que concentra serviços em um só lugar ; programa foi reconhecido pela ONU

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São Paulo

Foi ao observar as dificuldades das pessoas em ter acesso a serviços públicos na Bahia que a gerente de soluções estratégicas Kátia Argolo de Castro, 54, desenvolveu sistema que se tornou inspiração para o Poupatempo, em São Paulo, serviço que completa 25 anos em outubro.

O SAC (Serviço de Atendimento ao Cidadão), como é chamado, concentrou em um único lugar a solução para demandas que antes eram espalhadas. O projeto baiano tinha um conceito inédito no Brasil até então. O ano era 1995, época em que a internet engatinhava.

Na primeira unidade do país, em Salvador (BA), os cidadãos passaram a tirar ou renovar RG, CNH, carteira de trabalho, título de eleitor e antecedentes criminais. Tudo num mesmo lugar. Fotos 3x4 poderiam ser feitas ali também, assim como fotocópias.

"Acredito que o simples transforma. Foi aí que surgiu a ideia de fazer um atendimento centralizado em um ambiente mais acolhedor para o cidadão exercer seus deveres e seus direitos de forma prática", afirma a servidora pública responsável pela concepção e implantação do modelo de SAC.

Mulher branca sorridente, de cabelos lisos e compridos veste blusa preta enquanto cruza os braços
A funcionária pública Kátia Argolo criou o SAC, espécie de "pai" do Poupatempo - Arquivo pessoal

O serviço foi inaugurado com a possibilidade de realizar atendimento com hora marcada. Só que a população não acreditava que aquilo era possível, segundo Kátia.

Filas de pessoas segurando suas senhas de atendimento nas mãos começaram a se formar na unidade ainda de madrugada. "Havia um ranço desse tipo de serviço. Conversamos com cada um na fila para garantir que haveria atendimento no horário marcado e que eles poderiam ir embora para casa", afirma Kátia.

O projeto se popularizou e chamou a atenção do governo federal. Foi quando ela e sua equipe começaram a receber convites para apresentar o programa em outros estados. Um deles, São Paulo. Os paulistas já tinham em mente fazer um serviço integrado no então governo de Mário Covas.

Kátia conta que foi até São Paulo para mostrar o SAC à equipe de Covas. Dois anos depois, em 20 outubro de 1997, nascia o Poupatempo, que virou queridinho da população por se tornar referência em atendimento diversificado em um único lugar.

Desde então, de acordo com o Poupatempo, já foram realizados mais de 740 milhões de atendimentos à população paulistana, em 182 postos no estado, além de 230 serviços nos canais digitais.

Rapidamente o modelo do SAC chegou a outros estados com os nomes mais variados: Vapt Vupt (Goiás), Já (Alagoas), UAI (Minas Gerais), PIÁ (Paraná) e Expresso Cidadão (Pernambuco), entre outros.

No exterior, foi Portugal que buscou a ajuda brasileira para instalar o serviço em algumas regiões do país, onde ganhou o nome de Loja do Cidadão, em 1999.

"Morei seis meses em Lisboa para instalar o projeto de serviços que existe lá até hoje. Depois que o cidadão legítima um tipo de atendimento, não tem como voltar atrás", relata Katia.

Em 2006, outro país que solicitou seu conhecimento foi Angola, na África, onde o programa foi batizado de Siac (Serviço Integrado de Atendimento ao Cidadão).

Kátia conta que o país africano vivia uma guerra civil há 20 anos e muitos angolanos haviam perdido seus documentos. Aqueles que iam tirar uma nova via, ela afirma, levavam uma testemunha para provar sua identidade.

"É uma realidade bem diferente da nossa. Mas essa situação só fortaleceu a minha visão de que o Estado precisa olhar para o cidadão e criar para ele políticas públicas eficientes", afirma Kátia.

Enquanto isso, na Bahia, o SAC Móvel já levava o serviço para o interior desde 1996. Ele foi avançando para lugares mais distantes como Lençóis, na Chapada Diamantina.

Ali, um carro de apoio buscava a população no povoado para tirar a documentação. Foi nesse período que surgiu a pesquisa de avaliação do cidadão em relação aos serviços prestados pelos governos.

Toda essa dedicação ao serviço público rendeu premiações a Kátia. Em 2004, a ONU (Organização das Nações Unidas) reconheceu o SAC como modelo internacional de excelência em administração pública.

O maior desafio lá no início da sua jornada, segundo Kátia, foi convencer os governos a mudar de posição para investir em um programa de atendimento tão eficiente. "Os dados são do cidadão, não do governo. Foi um processo para a mudança de mentalidade."

Desde sua criação, em 1995, o Serviço de Atendimento ao Cidadão realizou mais de 218 milhões de atendimentos presenciais na Bahia.

ERA DIGITAL

Em 2018, surgiu o SAC Digital, em que os serviços foram parar nas mãos dos cidadãos por meio de seus celulares. Kátia estava lá também para desenvolver o sistema com sua equipe.

Houve uma interligação dos serviços para que o SAC Digital fosse mais proativo. Hoje, essa plataforma avisa por email ou via pushs (lembrete no celular) quando a CNH está para vencer, por exemplo.

"A intenção foi proporcionar um atendimento que não morre quando você pega o RG ou a carteira de motorista. Ele vai continuar para te ajudar no futuro", relata Kátia.

Grupo de pessoas exibe celulares em aplicativo de serviços e documentos
A funcionária pública Kátia Argolo (de azul ao centro) com os funcionários que, com ela, desenvolveram o SAC Digital - Mateus Pereira/Governo da Bahia

No ano seguinte, o aplicativo contava com cadastro de 249 mil usuários. Com a chegada da pandemia, em 2020, esse número saltou para 3 milhões de pessoas. Atualmente, são 4,9 milhões de baianos inscritos na plataforma.

Para Kátia, que hoje trabalha com o SAC Digital na Prodeb (Companhia de Processamento de Dados do Estado da Bahia), a plataforma se mostrou extremamente útil.

"É função do Estado pensar nas pessoas. Os números meteóricos do SAC Digital mostram como esse serviço foi essencial", afirma a servidora.

Em 2020, Kátia recebeu outro reconhecimento. Ela foi a vencedora do Prêmio Espírito Público na categoria Governo Digital.

"Nós, servidores, precisamos olhar para o Estado sob a ótica do cidadão, sempre."

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