Acordo vai devolver R$ 10 mi para Prefeitura de SP desviados por esquema na saúde

Empresa fez acordo de leniência com o município para pagar o valor

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São Paulo

A Prefeitura de São Paulo assinou um inédito acordo de leniência para pagamento de cerca de R$ 10,3 milhões por um esquema de direcionamento de licitação para compra de parafusos, pinos e placas, entre outros produtos hospitalares usados em osteossíntese (procedimento cirúrgico para restaurar a continuidade anatômica dos ossos).

O valor inclui ressarcimento aos cofres públicos e multa.

O acordo foi assinado no último dia 26 de abril pela Medartis Importação e Exportação Ltda —representante da suíça Medartis—, e pela Controladoria-Geral do Município e pela Procuradoria-Geral do Município, e formalizado nesta quinta-feira (4).

A assinatura de acordo de leniência é inédita na prefeitura e o valor deverá ser pago em até 60 dias.

Investigação apura se cirurgias com material adquirido sob suspeita foram realizadas no Hospital do Servidor Público Municipal - Rubens Cavallari - 4.dez.19/Folhapress

O esquema ocorreu entre 2011 e 2017, segundo a Controladoria. O material teria sido usado em procedimentos cirúrgicos realizados em hospitais da rede municipal e no Hospital do Servidor Púbico Municipal.

A procuradora do município, Daniele Dobner, que coordena a Comissão de Acordo de Leniência da Controladoria, disse que a investigação nasceu de uma denúncia anônima recebida pela ouvidoria do Tribunal de Contas do Município sobre supostas irregularidades em compras feitas pela então Autarquia Hospitalar Municipal junto à empresa Extera Importação e Exportação Ltda para fornecimento de materiais de cirurgia de trauma ortopédico.

O esquema, segundo ela, envolvia a oferta de vantagens indevidas a médicos que atuavam nos hospitais municipais com o intuito de favorecerem o uso de produtos vendidos pela empresa. Entre elas estavam o pagamento de viagens e reformas de consultórios.

Segundo Dobner, na requisição dos materiais, os profissionais de saúde indicavam a necessidade de uso de equipamento fornecido pela primeira colocada da licitação, no caso a empresa suspeita. Os valores eram superiores aos da segunda colocada, por causa da diferença entre os produtos.

Durante as investigações, a Extera foi adquirida pela suíça Medartis Holding AG, transformando-se em sua subsidiária brasileira. A nova gestão procurou voluntariamente a administração municipal e fez mais três denúncias sobre o esquema.

Com isso, desde 2019 a empresa passou a colaborar com as investigações, repassando as informações apuradas em suas investigações internas.

O valor do acordo foi definido a partir de notas fiscais analisadas nos quatro contratos, com correção monetária, e multa de R$ 860 mil, afirma a gestão Ricardo Nunes (MDB).

Ao todo nove médicos são suspeitos de integrarem o esquema. Três já eram investigados e a conduta de seis passam agora a ser analisadas com os indícios mostrados na delação da empresa. Eles devem ser suspensos.

"Esses servidores poderão ser demitidos no final [do processo]", diz Daniel Falcão, controlador-geral do município.

A Medartis disse , em nota, que o acordo é um marco para o fortalecimento da cultura de compliance na área da saúde, e no mercado em geral. "A empresa entregou as evidências localizadas e colaborou ativamente com a autoridade [municipal] para a elucidação dos fatos ocorridos".

Pela Lei Anticorrupção, de 2013, a tentativa de acordo de leniência deve partir das empresas investigadas. "A partir de agora, esperamos que outras [empresas suspeitas de atos ilícitos] façam o mesmo", afirma o controlador-geral.

A reportagem não conseguiu contato com ex-representantes da Extera Importação e Exportação Ltda. O nome da antiga empresa não aparece mais na Junta Comercial do estado, seu site está fora do ar e o endereço é o da nova dona.

Políticos

A assessoria do ex-prefeito Gilberto Kassab (atualmente no PSD), que estava à frente da prefeitura em 2011, quando o esquema de favorecimento teria começado, diz que sua gestão fez grande contribuição para o combate à corrupção ao criar a Corregedoria-Geral do Município, "órgão instituído com total autonomia e isenção para investigar denúncias no Poder Municipal".

"[A gestão] foi pioneira no país ao alçar a transparência à condição de política de Estado, com a disponibilização dos salários, processos e contratos de obras e serviços para consultas de qualquer pessoa pela internet", afirma trecho da nota.

"Todas as denúncias devem ser apuradas e, comprovados eventuais delitos, os responsáveis devidamente punidos, no rigor da lei", diz.

Também em nota, o ex-prefeito Fernando Haddad (PT), afirma que todas as denúncias de irregularidade ou favorecimento envolvendo contratos de obras, fornecimento ou prestação de serviços, durante sua gestão à frente da Prefeitura de São Paulo (2013-2016) "foram devidamente auditadas e investigadas pela Controladoria-Geral do Município, criada na sua administração".

"Não surpreende, portanto, que mais essa investigação tenha se iniciado em 2016, último ano da administração", afirma.

Já a assessoria de João Doria (na época PSDB e hoje sem partido) diz que as contas de sua gestão à frente da prefeitura [2017] foram plenamente aprovadas pelo Tribunal de Contas da União. "Aspectos relativos à Secretaria da Saúde devem ser indagados ao então secretário da Saúde do município de São Paulo e às autoridades da prefeitura neste momento."

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