Descrição de chapéu Congresso Nacional

Governo Lula admite ceder em demarcação de terras indígenas após pressão do agro

Bancada ruralista quer que atribuição volte para o Ministério da Justiça; congressistas também pretendem fortalecer Agricultura e esvaziar Meio Ambiente

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brasília

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já admite reservadamente que terá que ceder em quedas de braço com a bancada ruralista do Congresso na medida provisória que reestruturou a Esplanada dos Ministérios.

Segundo integrantes do governo e parlamentares envolvidos nas negociações, a bancada ruralista deve ser atendida nos pleitos relacionados à Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), ao CAR (Cadastro Ambiental Rural) e a uma das principais promessas de Lula na frente ambiental e indígena —a demarcação de terras.

O revés ocorre diante da pressão da bancada e em meio à crise na articulação política com as recentes derrotas nos decretos do Executivo sobre o Marco do Saneamento, e na Lei das Fake News.

Os ministros da Agricultura, Carlos Fávaro, e do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, em audiência no Senado presidida por Soraya Thronicke
Os ministros da Agricultura, Carlos Fávaro, e do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, em audiência no Senado - Geraldo Magela/Agência Senado

O governo ainda não tem base consolidada na Câmara dos Deputados e a FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), por outro lado, é uma das bancadas mais organizadas do Congresso, com cerca de 350 parlamentares.

A medida provisória que trouxe o novo formato da Esplanada caduca em 1º de julho e a expectativa é que o relator do tema, o deputado federal Isnaldo Bulhões (MDB-AL), apresente seu relatório na próxima terça-feira (16).

Ministérios ainda esperam conseguir impedir as mudanças no Congresso —os auxiliares palacianos que tocam as negociações com parlamentares apontam que a alteração na demarcação de terras indígenas é a que mais tem chance de ser barrada.

A articulação política do governo, comandada por Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais), sofre pressão dos parlamentares insatisfeitos com uma suposta demora na liberação de emendas e de cargos.

A medida provisória com as novas regras para a estrutura do governo fez o CAR migrar para a pasta de Marina Silva (Meio Ambiente), a Conab para a de Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário) e a área de demarcação de terras indígenas para a de Sonia Guajajara (Povos Indígenas).

No governo de Jair Bolsonaro (PL), as duas primeiras atribuições estavam com o Ministério da Agricultura e a última, com o da Justiça.

Como mostrou a Folha, parlamentares fizeram uma ofensiva para alterar esses trechos da medida provisória de Lula e apresentaram emendas para retomar o organograma da gestão antiga, fortalecendo a Agricultura e esvaziando as outras três pastas.

Agora, integrantes dos ministérios, da base do governo e da Casa Civil já admitem, sob reserva, que terão de ceder.

O acordo que se desenha é uma reorganização das competências da Conab, com gestão compartilhada entre Agricultura e Desenvolvimento Agrário, ficando à cargo da primeira as áreas de abastecimento e armazenamento, tidas como chave para a companhia.

Parlamentares da bancada ruralista também disseram que se o governo insistisse em manter a Conab com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, havia o risco de uma derrota dupla —não só a companhia voltaria para Agricultura, como os congressistas pressionariam pela saída de seu presidente, o petista Edegar Pretto.

No CAR, instrumento para controlar terras privadas e conflitos com áreas de preservação, uma solução que está sendo negociada é que ele formalmente seja mantido dentro do Meio Ambiente, mas com parte das suas atribuições sob responsabilidade da Agricultura. Ainda não há detalhes de como exatamente isso funcionaria.

Integrantes do Meio Ambiente também tentam dialogar no Congresso para impedir a saída do cadastro da pasta —considerado importante por gerenciar a fiscalização de crimes ambientais em propriedades rurais, como desmatamento e grilagem.

A mudança feita pelo governo Lula, no entanto, gerou duras críticas da senadora e ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PP-MS). Um dos nomes mais respeitados da bancada ruralista, ela apresentou uma emenda para devolver o cadastro ao Ministério da Agricultura e tem afirmado aos colegas que não faz sentido manter o tema sob o guarda-chuva do Meio Ambiente.

Já no caso da demarcação das terras indígenas, a versão que está sendo negociada manteria os estudos técnicos a cargo da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), que faz parte do ministério de Sonia Guajajara.

Mas, após esses estudos serem concluídos, eles seriam imediatamente enviados ao Ministério da Justiça, que então seria o responsável por encaminhar o processo à Casa Civil para homologação —atualmente, este poder de decisão é do Ministério dos Povos Indígenas.

"O meu papel é escrever o texto que preserve a entrega das políticas públicas prioritárias e essenciais diante do desenho que o governo fez, mantendo a eficiência, diante de um texto que tenha condições de ser aprovado", afirmou o deputado Bulhões.

"Quero preservar a divisão dentro do governo, porque há uma disputa de competências. Por isso, tenho ouvido todos, mas centralizando o debate e as decisões", completou.

Nos últimos dias, Padilha veio a público minimizar as dificuldades recentes no Congresso. Na segunda-feira (8), disse que se reunirá com deputados e líderes da base com ministros de seus partidos.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.