Ministério Público fará vistoria em sítio arqueológico no Bixiga onde há obra do metrô

No local foram encontrados vestígios do Quilombo Saracura; inspeção apura eventual irregularidade na preservação

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São Paulo

O Ministério Público Federal vai realizar nesta sexta-feira (19) uma visita de inspeção no sítio arqueológico Saracura, nas obras da futura estação Praça 14 Bis da linha 6-laranja do metrô na região do Bixiga, centro de São Paulo.

A inspeção, segundo o órgão, será realizada pelo procurador Gustavo Soares Torres.

Círculo com técnicos do Iphan em obra do metrô de São Paulo
Técnicos do Iphan em visita a canteiro de obra da linha 6-laranja do metrô de SP, onde há vestígios do quilombo Saracura - Divulgação/Iphan

Ela ocorre dez depois de o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) recomendar o indeferimento do pedido para retomada de atividades no local de salvamento arqueológico onde foram encontrados vestígios de peças supostamente de origem do Quilombo Saracura.

Em nota, o Iphan diz que solicitou a suspensão dos trabalhos nas escavações nestes locais porque foram achadas duas peças cerâmicas que podem estar relacionadas com artefatos utilizados em cerimônias e atividades de religiões de matriz africana.

O parecer técnico do último dia 9, assinado pela arqueóloga Gladys Mary Santos Sales, cita o surgimento de novas peças que podem ter origem quilombola no canteiro de obras.

Segundo a Procuradoria, a inspeção faz parte do inquérito civil instaurado em agosto do ano passado, com o objetivo de apurar eventual irregularidade na preservação de vestígios arqueológicos na área.

A visita deverá ser acompanhada também por especialistas do Iphan, que já realizam inspeções periódicas no local, e da empresa A Lasca Consultoria e Assessoria em Arqueologia, detentora da autorização de pesquisa arqueológica emitida pelo próprio instituto de preservação para atuar no local.

As escavações nas áreas do possível sítio arqueológico foram interrompidas após fortes chuvas em 7 de fevereiro —que provocaram instabilidade geológica no terreno—, para garantir a segurança. Também houve ação do coletivo Mobiliza Saracura Vai-Vai junto ao Iphan, pedindo a paralisação das escavações até que seja realizada uma avaliação do solo.

No local inicialmente foram encontradas cerca de 300 peças supostamente de origem do Quilombo Saracura.

Após a descoberta do sítio arqueológico, de aproximadamente 280 m², durante as escavações, a A Lasca foi contratada para retirada e análise dos objetos encontrados.

O parecer técnico do Iphan cita que no ultimo dia 30 de março foi reportada a identificação de uma nova concentração de material arqueológico, na porção sul da estação, próximo ao limite da rua Cardeal Leme.

"Considerando o achado, foi delimitada uma nova área no local para salvamento arqueológico e expandido o polígono do sítio Saracura/14 Bis", afirma o documento.

Segundo o texto, alguns dos materiais encontrados no fim de março são fragmentos de utensílios cerâmicos, louça, vidro, polímeros e couro (sobretudo sapatos), com características semelhantes aos demais vestígios identificados e coletados no sítio.

Mulher em perna de pau, com toupa vermelha, chapéu e máscara, defende a mudança de nome da futura estação 14 Bis
Coletivos em frente ao canteiro de obras da estação Praça 14 Bis da linha-6 laranja, durante protesto para troca de nome para Saracura Vai-Vai - Tatiana Cavalcanti/ - 2.jul.22/Folhapress

"Contudo, duas peças cerâmicas se destacam na coleção, podendo estas ter relação com artefatos utilizados em cerimônias e atividades de religiões de matriz africana. Trata-se de uma base e uma borda, possivelmente fragmentos de quartilhames", afirma.

"Algumas das peças identificadas podem ainda apresentar uma datação mais antiga, quiçá do século 19, mas aparecem junto a materiais mais recentes. Conforme descrito, dada a relevância do achado a área foi delimitada para a execução das atividades de salvamento arqueológico, quando da sua retomada."

Como sugerido pela arqueóloga Gladys Sales em seu parecer técnico, o Iphan requisitou pronunciamento dos órgãos que acompanham temáticas relativas à matriz africana, como os ministérios da Cultura e da Igualdade Racial, Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, e da Fundação Cultural Palmares.

Segundo o Iphan, as intervenções arqueológicas não atrasaram o cronograma da obra.

A estação está sendo construída onde era a escola de samba Vai-Vai, maior campeã do Carnaval de São Paulo, desapropriada em 2021 e que até hoje não tem uma nova sede.

Lançada em 2008, a linha 6-laranja foi prometida inicialmente para 2012. Com 15 estações, a linha vai ligar a Brasilândia, na zona norte, à estação São Joaquim, no centro, onde haverá interligação com a linha 1-azul. A previsão é que a linha inteira seja inaugurada de uma vez até o fim de 2025, segundo a Secretaria de Transportes Metropolitanos.

A Linha Uni, concessionária responsável pelas obras e pela linha 6, afirmou em nota no último domingo (14) que tem dialogado com o governo para, após os achados, apoiar a comunidade em projetos de educação e preservação do patrimônio.

Também diz que não houve dano às obras e aos canteiros de escavação e que vai discutir com as autoridades o seguimento do projeto.

Sobre os objetos encontrados no sítio arqueológico, a Acciona disse recentemente que eles poderão fazer parte do acervo do Centro de Arqueologia de São Paulo, vinculado ao Departamento do Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura, ou serão identificadas alternativas de exposição em conjunto com a comunidade do entorno.

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