Descrição de chapéu Folha por Folha jornalismo

Fotógrafa conta como cercou 'marmita' de manequins para foto da Primeira Página

Personagem topou ir até a rua São Caetano, em São Paulo, procurar uma loja com bonecos

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São Paulo

"Vem comigo, vou te levar até o Bruno para ele te falar sobre a pauta." Meu editor, Otávio Valle, me conduziu até o repórter. "Brunão, fala para ela sobre a pauta que você está apurando". Ele começa a descrever a ideia e, enquanto falava, mais dois ou três repórteres vieram dar pitaco. Terminada a explanação, pergunto o óbvio: "Mas o personagem topa aparecer?" O Bruno faz positivo com a cabeça. Alguém sugere levar uma marmita vazia e colocar na frente do… bem, você sabe onde.

Fiquei com aquela imagem na cabeça, mas acabei esquecendo dessa pauta. Outras borbulharam pelo caminho, como é comum em um jornal. Ela reapareceu, 15 dias depois, no meu email, com a data agendada e esta descrição:

"Pauta: Marmita de casal é quando um terceiro membro participa com frequência de outro relacionamento. É um amante, mas de ambos. As marmitas estão por todo o lugar e viraram status social. Ser marmita é símbolo de orgulho e liberdade sexual. Nosso personagem, André Marques, 43, se diz uma marmita profissional e orgulhosa da carreira."

Cheguei ao local combinado. Era um prédio antigo no centro da cidade, andar alto, elevador lento. Gerou em mim uma curiosidade diferente, afinal de contas eu ia conhecer uma "marmita" humana" e precisaria agir com a maior naturalidade do mundo. O fotógrafo é sempre aquele ser que carrega a "poker face" na bolsa para vestir quando necessário.

A porta abriu e o André apareceu. Fotógrafo já chega observando o ambiente, pensando o que fazer, né? A primeira coisa que me chamou a atenção foi a vista da sala e depois um manequim, aqueles que os alunos de moda usam para estudar caimento, medidas, encostado em uma parede.

O apartamento não tinha muitos atrativos visuais, era todo branco. Então a foto que se anunciava era a de um homem na frente de uma parede sem cor ou de uma janela —e sem a tal marmita. Eu achei que ficaria estranho e caricato um cara segurando uma marmita… bem, sabemos onde.

Já pensando em uma boa desculpa para dar ao meu editor pela foto sem graça que eu enviaria, volto o olhar para a sala, procurando alguma ideia. E então o manequim me dá a pista.

Lógico, um corpo com outro corpo, pensei. Afinal, não é disso que estamos falando? Mas a matéria era sobre três corpos, e só havia um manequim. "André, topa ir comigo para o Brás, ou para a rua São Caetano? Há lá uma população enorme de manequins."

Ele topou na hora, e lá fomos nós. Avenida 23 de Maio, avenida Tiradentes e uma curvinha para a direita, aterrissamos na famosa rua das noivas. Um sem-fim de manequins de fraques, vestidos brilhantes, pajens, padrinhos e uns nus. Eram eles que nos interessavam.

Escolhemos uma loja aleatória, pedimos para fazer umas fotos no meio daquele bando de "gente cinza". A luz que vinha da rua era boa e bastava para a foto, eu percebi. O André soube muito bem onde e como colocar as mãos nos seus amigos imaginários. A única coisa que pedi para ele fazer foi uma carinha de safado, pois cabia na história.

Capa da Folha do dia 29 de maio de 2023
Capa da Folha com a foto tirada por Karime Xavier - Reprodução

Os cliques duraram menos de dez minutos. Voltei para casa feliz. Passados mais alguns dias, abri a versão impressa do jornal e tive uma grata surpresa ao ver o André e seus amigos ocupando boa parte da capa da edição do dia 29 de maio.

No mesmo dia ele me manda um WhatsApp dizendo como estava incrédulo por estar na capa da Folha. Respondi com um emoji de piscadinha e assim terminou mais uma pauta.

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