Entenda em 5 pontos a escalada de violência policial na Bahia

Estado registrou 31 mortes entre 28 de julho e 4 de agosto e tem, em números absolutos, a polícia que mais mata no país

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Salvador

A Bahia enfrenta uma escalada no número de mortes decorrentes de intervenção policiais e registrou 31 mortes causadas pela polícia no período de uma semana, entre 28 de julho e 4 de agosto.

Foram registrados no mês de julho 64 mortes em ações policiais na Bahia, aponta levantamento do Instituto Fogo Cruzado, que monitora informações de tiroteios e violência armada na Grande Salvador. O número é recorde desde julho de 2022, quando a entidade começou a monitorar a violência na Bahia.

Protesto de familiares e vizinhos de Gabriel Silva da Conceição Júnior, 10 anos, morto após atingido por um tiro em meio a uma operação policial em Lauro de Freitas (BA) - Paula Fróes / Correio da Bahia

Em ao menos quatro episódios na última semana, foram registradas pelo menos cinco mortes em cada ação policial. Em 29 de junho, sete pessoas foram mortas em uma ação da polícia em Jauá, praia da cidade de Camaçari. A polícia informou que eles eram membros de uma facção criminosa e se preparavam para atacar um grupo rival.

Dois dias depois, uma ação da Polícia Militar realizada na zona rural de Itatim, cidade de 15 mil habitantes a 213 km de Salvador, deixou um saldo de oito pessoas mortas, incluindo três adolescentes.

Na última sexta-feira (4), cinco pessoas foram mortas pela polícia no bairro do IAPI em Salvador, em uma ação que também deixou um policial ferido. Outros cinco homens foram mortos no mesmo dia em ação no bairro de Águas Claras, também na capital baiana.

Também foram registrados casos de pessoas sem antecedentes criminais feridas em ações da polícia. Na segunda-feira (31), o jogador de futebol Alessandro Miranda Santos, o Pantico, foi baleado na perna em Lauro de Freitas. Na quinta-feira (3), um músico foi ferido no Nordeste de Amaralina.

Em 23 de julho, uma criança de dez anos foi morta com uma bala perdida em meio a uma ação policial em Lauro de Freitas. A morte de Gabriel Silva da Conceição Júnior gerou comoção na comunidade e desencadeou uma série de protestos.

A Bahia é estado com maior número absoluto de mortes violentas do Brasil desde 2019. No ano passado, segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o estado teve uma queda de 5,9% no nas ocorrências, saindo de 7.069 casos em 2021 contra 6.659 no ano passado.

Entenda em cinco pontos a escalada da violência policial na Bahia:

Qual o contexto da escalada de mortes decorrentes de intervenções policiais na Bahia?

O número de mortes pela polícia cresceu de forma consistente na Bahia entre 2015 e 2022, ano em que o estado superou o Rio de Janeiro e passou a ocupar o posto de polícia que mais mata no país.

Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontam a violência policial se manteve estável entre 2008 e 2015, variando entre 303 e 400 casos por ano. Nos últimos oito anos, contudo, as mortes decorrentes de ações policiais quadruplicaram no estado.

O número de ocorrências saltou de 354 para 1.464 por ano entre 2015 e 2022, período em que Bahia era governada por Rui Costa (PT), hoje ministro da Casa Civil do governo Lula.

A gestão de Rui Costa foi mercada por episódios como a chamada Chacina no Cabula, que deixou 12 jovens mortos em fevereiro de 2015. Na época, o governador comparou a situação de um policial em uma operação a de "um artilheiro na frente do gol".

Entidades do movimento negro e de defesa dos direitos humanos fizeram uma série de críticas à escalada da letalidade policial na Bahia. Entidades como a "Reaja ou será Morto, reaja ou será morta" denunciam o que classificam como um genocídio de jovens negros nas periferias das cidades baianas.

Diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima disse à Folha em julho que é legítimo que o policial se defenda, mas é preciso entender os padrões que estão gerando o uso excessivo de força. "Esta é a forma mais adequada de garantir mais segurança para a sociedade? Com esses padrões, acredito que não", afirmou.

Os policiais da Bahia utilizam câmeras no fardamento?

Diferentemente de outros estados como São Paulo, os policiais militares da Bahia não utilizam câmeras corporais para uso dos policiais em serviço.

Em 19 de abril, a Secretaria de Segurança da Bahia publicou o aviso de licitação para contratação da empresa para compra dos equipamentos, mas processo ainda não foi concluído. O pregão foi realizado no dia 30 de maio, mas a empresa vencedora apresentou irregularidades nos documentos obrigatórios. O governo está analisando os documentos da segunda colocada no certame e informou tem trabalhado para acelerar o processo de utilização das câmeras.

A adoção das câmeras corporais para policiais e bombeiros foi uma promessa do governador Jerônimo Rodrigues na campanha eleitoral de 2022.

Os casos de violência policial estão sendo investigados?

Os episódios de mortes decorrentes de intervenção policial estão sendo investigados pela Polícia Civil da Bahia, que apura a autoria e circunstâncias das mortes.

O Ministério Público do Estado da Bahia abriu investigações para apurar as circunstâncias das mortes registradas nas ações policiais em Salvador, Camaçari e Itatim. As investigações serão conduzidas pela unidade especializada voltada ao controle externo da atividade policial. O MP-BA também acompanhará o andamento dos inquéritos instaurados na Polícia Civil.

O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, determinou formalmente à Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos que acompanhe a apuração dos casos na Bahia, ouvindo autoridades e a sociedade civil.

Conforme o ministro, intervenções policiais que resultam em números expressivos de mortes "não são compatíveis com um país que se pretende democrático" e em consonância com os Direitos Humanos.

O que diz a polícia?

Em todos os casos de mortes decorrentes de ação policial que aconteceram na última semana, a Polícia Militar afirmou que houve confrontos com bandidos e que reagiu ao ser recebida com tiros ao entrar nas comunidades apara apurar denúncias de tráfico de drogas.

A polícia baiana não contabiliza os casos de mortes causadas por policiais nos indicadores de mortes violentas do estado. Em nota divulgada em 21 de julho, o governo explicou que "não coloca homicídio, latrocínio ou lesão dolosa seguida de morte praticado contra um inocente na mesma contagem dos homicidas, traficantes, estupradores e assaltantes, entre outros criminosos, mortos em confrontos durante ações policiais".

Na mesma nota, o governo baiano informou que tem investido em capacitação e inteligência policial e destacou que "aqueles criminosos que atacam as forças de segurança receberão resposta proporcional e dentro da legalidade".

O que diz o governador Jerônimo Rodrigues?

O governador ficou nove dias sem comentar os casos de violência policial desde o episódio de 29 de julho em que sete pessoas foram mortas em uma operação em Jauá, praia da cidade de Camaçari.

No domingo (6), um dia depois de o Ministério dos Direitos Humanos determinar a apuração dos casos de violência policial na Bahia, o governador postou uma nota nas redes sociais sobre o assunto.

Jerônimo afirmou que conversou com o ministro Silvio Almeida sobre as ações de prevenção à violência e redução da letalidade policial e se disse disposto a um trabalho em parceria com o governo federal

"O nosso compromisso é na apuração de casos de eventual excesso por parte de qualquer servidor, qualificação permanente da atuação policial para garantir mais eficiência na ação, respeito à legislação e preservação da vida", informou o governador baiano.

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