Levantamento aponta 319 prédios tortos em Santos

Segundo a prefeitura, estruturas não oferecem risco no momento; desvalorização é desafio

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Santos

"Se der um terremoto, caem todos, não só o meu. Então, somos iguais." Com bom humor, o aposentado Fernando Delgado Antunes brinca sobre o fato de morar em um dos 319 prédios tortos de Santos, no litoral paulista. O número foi atualizado em levantamento feito pela prefeitura a pedido do vereador Zequinha Teixeira (PP).

Dos 319 edifícios, 65 ficam na orla —e são os que apresentam maior desaprumo. Justamente o caso do Maembi, na avenida Bartolomeu de Gusmão, de onde Antunes aproveita a vista do 7° andar e diz não se incomodar com a inclinação.

"Já frequentava o apartamento porque era da minha sogra. A adaptação foi mais natural", conta. "O pessoal vai lá visitar a Torre de Pisa na Itália da mesma forma que tiram fotos do nosso prédio. Em certo sentido também somos uma atração."

imagem de prédio torto entre outras construções em Santos
Prédios tortos em Santos, no litoral de São Paulo; levantamento da prefeitura atualiza para 319 o número de edifícios inclinados - Karime Xavier - 8.mai.2023/Folhapress

Atração que, de acordo com o município, é monitorada de forma sistemática. "Todos esses prédios são acompanhados pela Secretaria de Infraestrutura e Edificações. Nenhum oferece risco para o momento", diz a prefeitura, em nota. O levantamento, de junho, foi divulgado na última semana.

Há, ainda, o Programa dos Prédios Inclinados, que verifica desaprumos detectados em novas medições. As inclinações variam de 0,50 cm a 1,90 m.

A prefeitura não individualiza os prédios com anomalia mais evidente por se tratar de propriedade particular, mas afirma que engenheiros e arquitetos acompanham de perto a situação para apontar eventual necessidade de obras ou reparos. Quando é o caso, condomínios recebem intimação "para a execução dos serviços indicados".

"Mais recentemente a secretaria vem convocando representantes de alguns edifícios para reuniões presenciais com engenheiros e autores dos laudos de análise estrutural", diz a prefeitura. "O objetivo é conhecer as providências que os condomínios adotam para execução das obras de recuperação, nivelamento e controle de desaprumo."

AFUNDAMENTO

O engenheiro civil Guilherme Menezes lembra que os prédios em questão foram construídos nas décadas de 1950 e 1960 e começaram a "afundar" a partir dos anos 1970. Uma união de fatores, diz ele, produziu o desnível, desde o uso de fundações mais rasas até as características geológicas do solo.

"A investigação técnica na época mostrou que o solo até 12 metros de profundidade se demonstrava compacto. O que não se sabia é que, mais abaixo, havia camada mole e outra arenosa", diz Menezes. "Com o passar dos anos, ocorreu o evento que chamamos de recalque, gerando rebaixamento das fundações apenas de um dos lados".

Alguns prédios, como o Nuncio Malzoni, já fizeram grandes fundos de reserva de condomínio e conseguiram corrigir da declividade com o uso de macacos hidráulicos, pilares e blocos. Motivo: mais do que eventuais transtornos de equilíbrio pessoal ou portas que se abrem sozinhas, o desaprumo afeta a valorização dos imóveis.

"Quase ninguém quer", atesta o corretor de imóveis Nilton Carlos. "Já vendi apartamento em prédio um pouco inclinado. Era no 11º andar e dava tontura. Foi o único que negociei. A pessoa tem que gostar muito."

"Comprei um no qual morei por um tempo. Colegas de trabalho falavam que eu era louco", conta o também corretor Mário Pellachin Ribeiro dos Santos. "Mas o que eu tive, especificamente, já era todo reformado e estava alinhado por dentro. A gente não sentia nada de diferente. Só quem olha de fora vê o prédio torto."

Moradores e proprietários podem consultar informações detalhadas sobre seus edifícios no Deconte (Departamento de Controle do Uso e Ocupação do Solo e Segurança de Edificações) de Santos, na rua 15 de Novembro, 195, 7° andar. O atendimento ocorre em dias úteis, das 9h às 17h.

Órgão fiscalizador do exercício profissional, o Crea (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia) diz acompanhar a situação e toma Santos como um "case" na engenharia.

"É emblemático", define o engenheiro civil e conselheiro da entidade Joni Matos Incheglu. "Eu mesmo, em minhas aulas sobre fundações, falo de Santos. Inclusive sobre o reaprumo dos edifícios, que, apesar de custoso, hoje é possível".

Segundo Incheglu, um monitoramento constante é feito pelo Crea em Santos. Ele sugere que outras prefeituras também adotem programas de inspeção predial semelhantes.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.