Descrição de chapéu LGBTQIA+

São Paulo tem pontos com prática de sexo ao ar livre

Ruas, praças e parques abrigam performances ao cair da noite

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Homem sobe escadarias no Mirante da Lapa, em São Paulo Ronny Santos/Folhapress

São Paulo

Gemidos agudos tomavam o Mirante da Lapa, praça na zona oeste de São Paulo. Eram 21h30 de sábado (2). Aposentadas caminhavam no local. "Começou, meu Deus!", gritou Dolores Arruda, 67. Na sequência, o grupo acelerou em direção à saída.

O epicentro dos sons estava próximo. Abrigados por um jacarandá, quatro homens e duas mulheres praticavam atos sexuais, enquanto outras pessoas observavam a cena.

Aquele endereço faz parte da rota paulistana do "dogging", termo em inglês para definir o hábito de sexo ao ar livre. Parques, ruas e avenidas completam o itinerário.

A maioria dos frequentadores é gay. A parcela heterossexual, porém, é barulhenta e adepta dos holofotes propiciados pelas lâmpadas.

Pista para caminhada no Mirante da Lapa, localizado na zona oeste de São Paulo - Ronny Santos/Folhapress

Odacy Oliveira, 49, treina no mirante todas as noites. O espaço beira sua casa. Enquanto se exercita, subindo em cordas que instalou nas árvores, tem uma vista privilegiada da movimentação. "É lindo. Aqui as pessoas soltam suas feras. São livres", diz.

Há, porém, um inconveniente para o atleta, as embalagens de preservativos que forram o piso e acabam grudando nos calçados.

Um rapaz de 27 anos comenta que pelo menos as pessoas se protegem. Ele não quis explicar o motivo de estar na praça. Um amigo, carioca a passeio na capital paulista, o acompanhava. A dupla logo desapareceu nas sombras. Horas depois, surgiram suados e sem camisa.

Guerra à pegação

Quem mora no entorno do Mirante da Lapa, que fica na rua Cerro Corá, reclama há muitos anos do uso da praça para sexo. Todo mês denúncias são encaminhadas à Prefeitura de São Paulo.

Segundo o artigo 233 do Código Penal, praticar sexo em local público é crime de menor potencial ofensivo. A pena prevista vai de três meses a um ano de reclusão ou multa.

As autuações, afirma a SSP (Secretaria da Segurança Pública), podem ser efetuadas somente em flagrante. Vídeos em redes sociais, portanto, não valem como provas —mesmo que compartilhados aos montes e presentes em plataformas pornográficas.

Uma das produções, datada de julho deste ano, mostra um carro. Nele estão duas mulheres, com uma fila de homens em frente. As cenas de sexo duram cerca de meia hora.

Na ocasião, gritos eram ouvidos claramente a mais de 80 metros de distância, afirmam moradores da região.

Sites, pôsteres e até uma apresentação em PowerPoint foram criados para registrar as objeções. Famílias já deixaram os quarteirões mais próximos do mirante, outras também cogitam sair. Placas de venda não faltam.

O caminho do Paraíso

A 7 km da praça, outro endereço refugia adeptos do "dogging": a rua Curitiba, no Paraíso, zona sul da cidade. Lá, cônjuges dividem espaço com michês e seus clientes. O movimento começa por volta da meia-noite.

Existem dois pontos principais para os atos sexuais. O primeiro fica atrás do Círculo Militar. O segundo, mais disputado, ao final da via.

Organização impera. Na calçada, só ficam trabalhadores. Quando passa algum motorista interessado, ele abre a porta e a pessoa entra no veículo.

Próximo dali, há uma alternativa: o parque Ibirapuera. Indivíduos buscam possíveis parceiros por toda a sua extensão. Segundo um visitante assíduo, basta ficar atento aos sinais, como uma piscadela ou um assobio.

A Urbia, concessionária que administra o parque, disse à Folha que cabe à GCM (Guarda Civil Metropolitana) garantir a segurança do público. Afirmou também que, desde o início da concessão, implantou câmeras de monitoramento para coibir a prática.

Rua Curitiba, no Paraíso, zona sul de São Paulo - Ronny Santos/Folhapress

Já na zona leste, uma trilha faz as vezes de motel naturalista. Ela está encravada no Parque Ecológico do Tietê —gerido pelo governo do estado—, próxima à estação Engenheiro Goulart da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos).

A Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística afirmou não haver registro de reclamações ou flagrantes naquelas dependências. Disse, entretanto, atuar com equipes de vigilância e que, caso identificada qualquer atividade irregular, os envolvidos devem partir.

Em outra ponta da capital, em Santo Amaro, o local de sexo ao ar livre é em uma das entradas para a ciclovia às margens do rio Pinheiros. Na altura da estação de trem que leva o nome do distrito, há um ponto que atrai jovens universitários em busca do "dogging".

O local é administrado pela SPTrans, que disse desconhecer esse tipo de prática.

Tudo que é proibido sempre excitou muita gente, afirma o sexólogo Jairo Bouer. Para ele, não há problema em expressar seus fetiches e buscar rápida satisfação em comunidade. Violência e preconceito, no entanto, são perigos reais.

"Pode ocorrer ataque a indivíduo de qualquer orientação sexual, mas a comunidade LGBT+, ativamente praticante do 'dogging', é sempre a mais estigmatizada", diz ele. "O moralismo é um obstáculo social."

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