Câmara atende setor imobiliário e amplia altura de edifícios na nova Lei de Zoneamento de SP

Texto que irá à segunda votação quinta-feira (21) espalha verticalização por toda a cidade

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São Paulo

A nova versão da revisão da Lei de Zoneamento foi apresentada nesta terça-feira (19) pela Comissão de Política Urbana da Câmara Municipal de São Paulo com a inclusão de regras que aumentam a altura para novos edifícios em uma ampla área da cidade.

Isso inclui os chamados miolos dos bairros, sobre os quais há declarado interesse do setor imobiliário para que se possa construir mais.

É uma mudança com potencial para alterar bastante o planejamento em curso na cidade desde 2014, que concentra estímulos para o mercado edificar mais perto das estações de metrô, trem e corredores de ônibus.

A proposta é também significativamente diferente do texto aprovado na primeira votação por 46 votos favoráveis e 8 contrários na última terça-feira (12). Agora, as alterações deverão ser analisadas em dois dias pelos demais vereadores e pela população. A segunda e definitiva apreciação está prevista para a próxima quinta-feira (21).

Prédio em construção em São Paulo
Prédio em construção em São Paulo - Zanone Fraissat - 3.jan.2023/Folhapress

De acordo com a segunda versão do texto, nas ZCs (Zonas de Centralidade), porções mais centrais de bairros onde a prioridade é para atividades empresariais, a altura máxima dos edifícios sobe de 48 para 60 metros —de 16 para 20 andares, em média—, desde que esses prédios destinem 80% da área ampliada para a habitação social.

É um tipo de zoneamento presente em vias importantes de bairros valorizados, como a rua Heitor Penteado, na Vila Madalena, e a avenida Pompeia, ambas na zona oeste.

Nas ZMs (Zonas Mistas), que são áreas pensadas para conciliar uso residencial e empresarial em construções medianas, o aumento poderá ser de 28 para 42 metros, também com o mesmo critério de moradia social. Na prática, a mudança é de 9 para 14 andares, aproximadamente.

Grande parte da área mais urbanizada da capital paulista é composta por Zonas Mistas, o que indica significativo potencial de verticalização em toda a cidade.

Os prédios mais altos também poderão ocorrer nas quadras em que 40% das edificações já tenham superado o limite estabelecido pelo zoneamento.

Apesar de vinculadas à construção de habitação social, há possibilidades para que o mercado priorize a classe média.

Existem duas faixas de HIS (Habitação de Interesse Social), sendo a primeira para famílias com renda de até três salários mínimos (R$ 3.960) e, a segunda, para rendimento familiar de até seis mínimos (R$ 7.920).

Ainda cabe na categoria habitação social a HMP (Habitação de Mercado Popular), cuja renda por família é limitada a dez salários mínimos, ou seja, R$ 13.200.

A Lei de Zoneamento faz parte do planejamento urbano do município. Ela define quais atividades podem ser desenvolvidas em cada quadra. Essa legislação é subordinada ao Plano Diretor Estratégico, que aponta qual é a prioridade para o desenvolvimento da cidade.

Em São Paulo, a direção escolhida pelo Plano Diretor de 2014, da gestão do então prefeito Fernando Haddad (PT), é a construção dos maiores prédios residenciais e comerciais onde há transporte. São as chamadas ZEUs (Zonas Eixo de Estruturação da Transformação Urbana).

Na revisão do Plano Diretor, promulgada em julho pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), ficou definido que as ZEUs deveriam ocupar áreas maiores. Elas passaram de 600 para 700 metros no entorno de estações de metrô e trens. Também cresceram nas faixas que contornam corredores de ônibus, passando de 300 para 400 metros.

Uma característica da zona com eixos de transporte é que a altura dos edifícios —diz-se gabarito— não possui limite. A regra que limita o tamanho da edificação é a proporção de área construída em relação ao terreno. É o chamado coeficiente de aproveitamento.

A proposta de revisão do zoneamento aprovada em primeiro turno criou dispositivos que limitam a expansão das ZEUs. A medida atende pedidos de diversas associações de bairros sobre os quais a verticalização tem avançado.

O texto diz que quadras inteiras poderão receber travas contra a construção de edifícios sem limite de altura se nelas existirem barreiras urbanas (como ferrovias e cemitérios), ladeiras e outras condições que dificultem o trajeto a pé.

Considerando essa mudanças, a nova versão da proposta excluiu 11% das ZEUs em relação à regra vigente desde 2016 —ano da promulgação da atual Lei de Zoneamento—, mas promoveu uma ampliação geral de 34% desse zoneamento em que não há limite de gabarito devido à expansão das ZEUs na revisão do Plano Diretor.

Relator do Plano Direto da gestão Haddad, em 2014, o ex-vereador e professor titular de planejamento urbano da USP Nabil Bonduki afirma que a nova proposta enfraquece a ideia de concentrar moradias e postos de trabalho perto do transporte público.

"O que vamos ter é uma dispersão da verticalização por toda a cidade", diz Nabil. "A concepção de adensamento perto de transporte coletivo e proteção dos miolos dos bairros foi para o brejo."

Relator da revisão da Lei de Zoneamento, o vereador Rodrigo Goulart (PSD) rebateu críticas sobre o enfraquecimento dos eixos de transporte com a necessidade de priorizar a habitação social. "A verdade é que a alteração permite mais habitação de interesse social nas demais áreas e não só nos eixos de transporte", afirmou.

Representantes do setor imobiliário demandaram o aumento dos gabaritos durante audiências públicas sobre o zoneamento.

Claudio Bernardes, vice-presidente do Secovi-SP (entidade que reúne empresários do setor imobiliário), disse à Folha que a altura ilimitada das ZEUs deveria valer também em outros zoneamentos, como as Zonas de Centralidade, onde a altura é limitada em 48 metros e que a nova versão sobe para 60 metros.

Bernardes afirmou que o próprio potencial construtivo já é uma limitação e a restrição de altura apenas interfere na tipologia do edifício, ou seja, acaba obrigado o mercado a fazer prédios mais baixos e largos.

Ele argumenta que construções mais estreitas e altas poderiam ter mais áreas abertas no entorno, melhorando a circulação de pessoas, de ar, e com espaço para jardins e outros recursos para melhorar a capacidade do solo de absorver água da chuva.

Durante a apresentação, o assessor de urbanismo do Secovi-SP, Eduardo Della Manna, considerou que a liberação de gabaritos mais altos vai na direção certa, mas ainda está abaixo das necessidades de uma cidade com o tamanho de São Paulo. "É muito importante ampliar as ZEUs e o limite de gabarito é insuficiente", disse.

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