Zoneamento avança sob pressão de construtoras por prédios sem limite de altura em SP

Câmara aprovou projeto em primeira votação nesta terça (12) e análise final está prevista para o dia 21

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São Paulo

A Câmara Municipal de São Paulo aprovou nesta terça-feira (12), em primeira votação, a proposta de revisão da Lei de Zoneamento. O texto ainda será modificado e submetido a uma segunda e definitiva deliberação dos vereadores, prevista para o próximo dia 21.

Conjunto de sobrados em uma ladeira, com prédios ao fundo
Na Vila Madalena, grandes prédios avançam no entorno de residências; nova regra da Lei de Zoneamento coloca trava na verticalização, sob protesto de construtoras - Zanone Fraissat - 1.set.2023/Folhapress

O projeto foi aprovado com 46 votos favoráveis e 8 contrários.

Antes da votação, empresários do setor imobiliário marcaram presença na audiência pública em que a Comissão de Política Urbana da Câmara prestou contas à população sobre o projeto. Incorporadores e construtores pediram a liberação de prédios sem limite de altura em mais regiões da cidade. Hoje essa regra vale apenas nos arredores de corredores de ônibus e de estações de metrô e trem.

Representantes de bairros e de movimentos de moradia criticaram o pedido que, segundo eles, somente servirá para produzir apartamentos de alto padrão em bairros valorizados.

Relator do projeto, o vereador Rodrigo Goulart (PSD) disse que as contribuições de todos os segmentos da sociedade serão avaliadas para a segunda versão do substitutivo. A expectativa, segundo ele, é que o texto seja apresentado na segunda-feira (18).

Mas o vereador afirmou que embora a discussão da altura dos edifícios possa ser considerada, não há possibilidade de um gabarito ilimitado. "Se for essa a proposta [do setor imobiliário] não vai entrar."

Goulart disse ainda que o aumento dos prédios só será analisado se estiver vinculado ao aumento da oferta de habitação de interesse social.

A Lei de Zoneamento faz parte do planejamento urbano do município. Ela define quais atividades podem ser desenvolvidas em cada quadra. Essa legislação é subordinada ao Plano Diretor Estratégico, que aponta de forma mais genérica qual é a prioridade para o desenvolvimento da cidade.

Em São Paulo, a direção escolhida pelo plano para o crescimento urbano é a construção dos maiores prédios residenciais e comerciais onde há transporte. São as chamadas ZEUs (Zonas Eixo de Estruturação da Transformação Urbana).

Na revisão do Plano Diretor, promulgada em julho pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), ficou definido que as ZEUs deveriam ocupar áreas maiores. Elas passaram de 600 para 700 metros no entorno de estações de metrô e trens. Também cresceram nas faixas que contornam corredores de ônibus, passando de 300 para 400 metros.

Uma característica da zona com eixos de transporte é que a altura dos edifícios —diz-se gabarito— não possui limite. A regra que limita o tamanho da edificação é a proporção de área construída em relação ao terreno. É o chamado coeficiente de aproveitamento.

A proposta de revisão do zoneamento aprovada em primeiro turno cria dispositivos que limitam a expansão das ZEUs. A medida atende pedidos de diversas associações de bairros sobre os quais a verticalização tem avançado.

O texto diz que quadras inteiras poderão receber travas contra a construção de edifícios sem limite de altura se nelas existirem barreiras urbanas (como ferrovias e cemitérios), ladeiras e outras condições que dificultem o trajeto a pé.

O projeto votado pela Câmara tem 747 áreas bloqueadas contra as ZEUs. São as chamadas zonas de exclusão. São essas áreas que estão incomodando o setor imobiliário.

Entre os argumentos defendidos pelos empresários estão questões ambientais e a oferta de moradia para trabalhadores e classe média.

Luiz Antonio França, presidente da Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadores Imobiliárias), afirmou representar até 500 mil compradores de imóveis que gostariam de morar a uma distância de até 1 km dos eixos de transporte público. "Por isso a ampliação dos eixos é fundamental e a exclusão de ZEUs vai empurrar mais pessoas para as periferias", afirmou, durante a audiência.

Claudio Bernardes, vice-presidente do Secovi-SP (entidade que reúne empresários do setor imobiliário), também subiu à tribuna e propôs que a altura ilimitada das ZEUs passe a valer também em outras regiões, como as Zonas de Centralidade, onde a altura é limitada em 48 metros.

Bernardes afirma que o próprio potencial construtivo já é uma limitação e a restrição de altura apenas interfere na tipologia do edifício, ou seja, acaba obrigado o mercado a fazer prédios mais baixos e largos.

Ele argumenta que construções mais estreitas e altas poderiam ter mais áreas abertas no entorno, melhorando a circulação de pessoas, de ar, e com espaço para jardins e outros recursos para melhorar a capacidade do solo de absorver água da chuva. "Essa é uma das principais medidas possíveis para melhorar a permeabilidade da cidade e reduzir as ilhas de calor", diz Bernardes.

Muita dessa infraestrutura de transporte onde existem as ZEUs está nos bairros que ficam entre as zonas central, oeste e sul de São Paulo. É onde estão os bairros mais valorizados.

É a liberação de atividades empresariais e o aumento de potencial construtivo que fazem um terreno numa área valorizada despertar o interesse de incorporadores imobiliários.

O negócio se torna lucrativo porque, em vez de construir e vender uma única casa em um terreno caro, o investidor pode multiplicar o ganho pelo número de apartamentos em um grande edifício, por exemplo.

Representante da associação de moradores de Pinheiros, bairro da zona oeste que sofre intenso processo de verticalização, Rosanne Brancatelli questionou a intenção dos representantes do mercado com o adensamento construtivo. Ela afirma que a finalidade é atender consumidores de imóveis de alto padrão.

"Desculpem-me senhores presidentes de incorporadoras, mas as ZEUs são uma furada porque os prédios estão vazios e não são para trabalhadores", afirmou Brancatelli.

Coordenadora do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), Beatriz Nowicki disse que o mercado não produz apartamentos para a primeira faixa de HIS (Habitação de Interesse Social, até três salários mínimos) nos eixos de transporte. "A gente [da periferia] quer morar no centro, mas cadê a moradia popular nos eixos urbanos?", reclamou.

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