'Exército' de Derrite é maior do que efetivo de 91,2% das cidades de SP

OUTRO LADO: Governo Tarcísio diz que alocação de efetivo não prejudicou segurança das cidades; especialistas apontam uso político de PM por secretário

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São Paulo

O número de assessores policiais militares à disposição do secretário da Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite (PL), é superior ao efetivo empregado pela Polícia Militar em 588 municípios paulistas, o que representa 91,2% das 645 cidades do estado.

Conforme dados sigilosos obtidos pela Folha, Derrite tinha à disposição 241 assessores PMs, em novembro passado (o número mais recente). Um ano antes, eram 183 policiais na função.

Por outro lado, conforme dados fornecidos pela própria Polícia Militar via LAI (Lei de Acesso à Informação), apenas 57 municípios paulistas têm um efetivo superior ao "exército de capitães" do secretário, forma como esse contingente costuma ser chamado no meio policial.

O governo paulista diz que alocação do efetivo para as assessorias não trouxe prejuízo às operações realizadas ano passado.

O Governador Tarcísio de Freitas inaugurou a Sede própria da Companhia de Força Tática do 7° Batalhão de Polícia Militar. A medida vai reforçar a segurança na região do Centro velho de São Paulo.nas imagens, o Secretário da Segurança Pública Guilherme Derrite e PMs pertencentes ao Batalhão. Nesta quinta-feira (1)
O Governador Tarcísio de Freitas e o secretário da Segurança Guilherme Derrite posam para foto ao lado de PMs, durante inauguração de unidade da corporação na região central de SP - Ronaldo Silva/Ato Press/Agência O Globo

Normalmente, a assessoria incluía principalmente os policiais responsáveis pela segurança do secretário, de seus familiares e da sede da pasta. Na gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), porém, os PMs foram nomeados para funções diversas, incluindo especialistas em postagem de imagens nas redes sociais.

Esse tipo de serviço prevê gratificações extras de salário. Oficiais da equipe da SSP chegam a ganhar, por exemplo, cerca de R$ 7.000 a mais no salário mensal.

A assessoria da SSP é uma das 13 existentes no estado de São Paulo. São homens e mulheres que fazem a segurança de prédios e de agentes públicos, como desembargadores, juízes, promotores, deputados, vereadores e do prefeito da capital paulista.

No governo Rodrigo Garcia (PSDB) eram 12 assessorias. Uma nova foi criada pela gestão Tarcísio no final do ano passado para atender à cúpula da Secretaria da Fazenda e Planejamento do estado, batizada com o nome de APMSEFAZ.

De acordo com coronéis ouvidos pela reportagem, a nova assessoria é desnecessária diante do perfil da pasta, mas foi uma forma de o secretário agradecer ao apoio da Fazenda na concessão do reajuste à polícia no ano passado.

Ainda conforme oficiais ouvidos, a gestão planeja a criação de uma nova assessoria, agora destinada ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral). O principal objetivo seria manter boas relações com a Corte.

Coronéis afirmaram à Folha que a escolha dos efetivos de todas as assessorias vem sendo feita por indicações diretas de Derrite. De acordo com eles, o objetivo da medida é estabelecer uma rede de informantes em diversas áreas.

O aumento da equipe do secretário ocorreu na contramão do restante do estado. Praticamente em todas as regiões houve redução do efetivo da PM, incluindo a Baixada Santista, que vive uma crise de segurança.

Na região, o efetivo caiu de 3.054 PMs, em novembro de 2022, para 2.902, no final de 2023 —uma redução de 5%. Só no batalhão de Santos (6º BPM/I), a redução foi 10%. No final de 2023, eram 509 policiais, contra 568 do ano anterior.

No geral, a PM paulista perdeu ainda mais seu efetivo ano passado: ele chegou a 78.695 policiais, em novembro de 2023, ante os 79.477, do mesmo período de 2022.

A diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, diz considerar muito grave o "uso extremamente político de uma instituição, que usa força para favorecer um secretário".

"Quando coloca esse número enorme de policiais na assessoria dele, ao contrário do que diz, ele não está preocupado com a segurança pública do povo paulista. Está preocupado em ter ao seu serviço aquelas pessoas de confiança, mesmo que isso prejudique o trabalho da PM na ponta da linha."

"A PM de São Paulo foi uma das PMs mais profissionais do Brasil, com protocolos, com estrutura muito robusta de profissionalização, de uso da força. Tudo isso está sendo jogado fora", afirmou ela.

Para o especialista em segurança pública Rafael Alcadipani, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas), há um claro desvio função desses policiais empregados nas assessorias, treinados para outras funções.

"Essas assessorias, do meu ponto de vista, são o maior desvio de função que eu já vi acontecer numa polícia no mundo. Porque essas pessoas servem muito mais para fazer a política corporativa da Polícia Militar e ter-se uma impressão positiva diante de órgãos e de pessoas que tomam decisões."

"Por que o pessoal do TRE, o pessoal no Tribunal de Justiça, o pessoal no Ministério Público não pode se comportar como o cidadão comum que liga no 190?", afirmou ele.

Ao todo, as assessorias tinham 943 policiais em novembro de 2023, aumento de 8% em relação ao mesmo mês do ano anterior. Apenas 15 cidades no estado têm efetivo maior do que 943 PMs.

Governo diz que alocação de efetivo não prejudicou segurança

Procurada, a gestão Tarcísio disse que as assessorias policiais militares "são estabelecidas por lei e instituídas pelo Comando da Polícia Militar com base em critérios técnicos e operacionais".

"No âmbito da Secretaria de Segurança Pública, esses profissionais são designados para áreas estratégicas, como o CICC (Centro Integrado de Comando e Controle), o GTI (Grupo de Tecnologia da Informação), [...] e a CAP (Coordenadoria de Análise e Planejamento) que compila e analisa os indicadores criminais utilizados para definir os programas de policiamento."

A pasta informou que "alocação desses policiais não impactou a realização das operações planejadas para 2023". "Essas ações resultaram em um aumento de 12,3% nas prisões de criminosos, na redução de uma série de crimes patrimoniais e contra a vida, como o caso dos homicídios dolosos que alcançaram o menor número de casos e vítimas desde 2001."

A pasta chegou a afirmar que assessoria da SSP necessitava de um contingente grande porque, entre suas funções, estaria a proteção de ex-governadores e de familiares. Função que, na verdade, é de responsabilidade da Casa Militar. Após ser questionada sobre isso, a equipe de Derrite disse que foi um equívoco e mudou a versão.

Sobre as indicações das assessorias serem feitas diretamente pelo secretário, a pasta disse que as escolhas das equipes ocorrem de forma técnica. "Quanto à seleção dos profissionais para as atividades de assessoramento, ela é definida de acordo com as habilitações e competências exigidas para cada cargo."

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