Nenhum professor atinge topo salarial na rede estadual de SP

Exigências para progressão na carreira tornam impossível alcançar a remuneração mais alta, aponta estudo

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São Paulo

Nenhum professor conseguiu atingir o topo salarial prometido no plano de carreira docente do Governo de São Paulo. Criado em 2009 com a promessa de valorizar a profissão, o plano tem exigências que na prática tornam impossível alcançar a remuneração mais alta prevista.

Os dados foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação pela Gepud (Grupo Escola Pública e Democracia) e Repu (Rede Escola Pública e Universidade). As informações se referem aos salários de maio de 2022.

Mesmo com um modelo que impede a progressão prometida, esse plano ainda é mais vantajoso financeiramente aos professores mais antigos da rede do que a nova carreira aprovada em 2022 pelo então governador João Doria (sem partido).

A análise levou os pesquisadores a alertarem que, no estado mais rico do país, não há um plano de carreira que garanta a valorização dos professores. Para eles, um dos resultados disso é a falta crônica de docentes, que se agravou nos últimos anos nas escolas paulistas.

Alunos na Escola Estadual Professor Francisco de Paula Conceição Júnior, no extremo sul de São Paulo
Alunos na Escola Estadual Professor Francisco de Paula Conceição Júnior, no extremo sul de São Paulo - Bruno Santos 12.ago.22/ Folhapress

Os responsáveis pelo estudo defendem a revogação da lei da nova carreira pela gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) e que a valorização salarial pode ocorrer se forem destravadas as progressões do plano anterior. Também pedem que o governo estadual passe a de fato aplicar 30% das receitas estaduais em educaçãoregra que vem sendo descumprida em São Paulo há mais de duas décadas.

Em nota, a Secretaria Estadual de Educação diz que estuda medidas para a valorização salarial dos professores, como a retomada da prova de progressão por desempenho que não é realizada desde 2018.

O plano antigo, em que estão contemplados a maior parte dos professores, é composto por oito faixas salariais, cada uma delas com oito níveis. Quanto mais elevada a faixa e nível, maior é a remuneração. Os dados mostram, no entanto, que nenhum professor conseguiu alcançar as últimas três faixas —em que os vencimentos ultrapassam os R$ 7.000.

Dos mais de 214 mil professores que trabalham nas escolas estaduais paulistas, 47% estavam na primeira faixa e nível, ou seja, com o salário mais baixo. Nessa etapa, a remuneração prevista é de R$ 2.843,51 - valor que teve de ser complementado em mais de R$ 1.000 por abono para que o estado respeitasse o piso nacional salarial.

"Estudos nacionais e internacionais há anos evidenciam que a valorização salarial durante a carreira do professor é um dos fatores mais importantes para melhorar a qualidade da educação. O estado mais rico do país ignora essas evidências ao criar um plano que, neste formato, é inexequível", explica Andreza Barbosa, pesquisadora da Repu e especialista em trabalho docente.

Para os pesquisadores, as regras estabelecidas para a progressão impedem que os professores alcancem o valor máximo. Por exemplo, o tempo mínimo exigido para avançar de um nível/faixa para outro variava de quatro a seis anos, de forma que é impossível o docente chegar ao fim da carreira antes de sua aposentadoria.

Outro impedimento é que uma das formas de progresso na carreira depende do desempenho do docente em uma prova de verificação de mérito. Há cinco anos o governo estadual não realiza a prova, ou seja, não dá sequer chance dos professores receberem aumento salarial.

Sem corrigir as distorções do plano de 2009, a gestão Doria criou no ano passado uma nova carreira docente. Os pesquisadores, no entanto, avaliam que o novo modelo vai na contramão do que recomendam os estudos sobre valorização, já que não prevê a gratificação por tempo de serviço.

"É um plano de carreira que não valoriza a trajetória do professor. A ideia de carreira pressupõe valorizar a permanência do profissional no local de trabalho. Sem esse adicional por tempo de serviço, o governo não estimula a permanência do docente na rede pública", diz Andreza.

Por desconsiderar o tempo de trabalho dos professores na composição salarial, o novo plano tem recebido pouca adesão dos profissionais efetivos e que estão há mais tempo na rede. O período de adesão à nova carreira teve início em junho de 2022 e segue até 2024.

Os dados obtidos pelos pesquisadores mostram que, até outubro do ano passado, apenas 1.842 docentes efetivos haviam optado por migrar para a nova carreira —o que representa cerca de 1% do total de profissionais dessa categoria. Além disso, 85% dos que migraram estão há menos de 10 anos na rede.

A maior parte dos que são contemplados pelo novo plano são os professores temporários, que foram compulsoriamente migrados para o modelo.

"Para quem está começando agora na rede estadual, o novo plano garante remuneração inicial maior. O problema é que esse profissional não tem grande possibilidade de progressão ao longo da carreira. Ou seja, não garante condições para que esse professor fique motivado a continuar na rede de ensino", diz Andreza.

Em nota, a Secretaria de Educação disse que a gestão Tarcísio assumiu com o "compromisso de reconhecer e valorizar a atividade docente" e citou como medida a abertura de concurso para a contratação de 15 mil novos professores.

Questionada sobre ações para valorizar a remuneração dos professores, a pasta disse apenas que estuda a volta da prova de progressão por mérito e regulamentações pendentes e eventuais correções na nova carreira docente.

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