Lira vai deixar caducar medida provisória de Lula sobre bolsas para o ensino médio

Presidente da Câmara quer que tema seja tratado a partir de projeto de Tabata Amaral; ação desagrada o MEC

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Brasília

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), vai deixar caducar a medida provisória do governo Lula (PT) que criou um fundo que vai pagar alunos pobres para permanecerem no ensino médio. O tema deve ser tocado por um projeto de lei já em trâmite na Casa, com previsão para votação na próxima semana.

Isso desagrada a equipe do ministro da Educação, Camilo Santana, e membros do governo, segundo relatos colhidos pela reportagem.

A edição da medida provisória foi uma das principais apostas do presidente na área da educação e a manobra ofusca o protagonismo da gestão.

O presidente assinou a medida horas antes de viajar para Dubai para participar da COP 28, a conferência sobre crise climática da ONU. E a expectativa dentro do governo é de que ainda haveria evento político para seu anúncio.

A decisão expõe uma relação não amistosa entre Lira e o ministro da Educação.

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O presidente Lula e o ministro da Educação, Camilo Santana, em entrevista no dia do Enem. - Pedro Ladeira/Folhapress

Exatamente um dia após a medida provisória, o presidente da Câmara designou um relator para um de projeto 2021 da deputada Tabata Amaral (PSB-SP) que trata do tema.

A interlocutores, Lira confirmou que não vai instalar uma comissão para apreciar a medida provisória. Em vez disso, seguirá um acordo estabelecido com a deputada para dar prosseguimento à sua iniciativa.

O governo editou a medida provisória no último dia 28. O texto criou um fundo privado de até R$ 20 bilhões para incentivos financeiros a alunos pobres do ensino médio. A medida, adiantada pela Folha, saiu em edição extra do Diário Oficial daquele dia.

Já no dia 29, Lira designou o deputado Pedro Uczai (PT) para a relatoria do texto da deputada.

O deputado diz que o relatório deve contemplar todos os pontos da medida provisória, incluindo o fundo. Há expectativa de o projeto ficar pronto nesta quinta (7), para ser levado ao Plenário na próxima terça (12).

"O Parlamento tem autonomia para modificar e aperfeiçoar a proposta. Dá para aproveitar o projeto e, junto com o conteúdo da MP [medida provisória], fazer um bom texto e conseguir democraticamente aprová-lo", disse Uczai.

A reportagem procurou Ministério da Educação, Palácio do Planalto e Casa Civil, mas nenhum deles respondeu até a publicação desta reportagem.

Uma medida provisória passa a valer assim que editada, mas precisa ser aprovado pelo Congresso em até 120 dias. Se isso não ocorrer, ela perde a validade.

Quando o texto de Tabata foi apresentado, em 2021, a matéria foi apensada a outro projeto com teor similar, do deputado Idilvan Alencar (PDT-CE), de 2019. Ela decidiu, no entanto, pedir para desanexá-lo —atitude incomum no Congresso.

Tabata é pré-candidata à Prefeitura de São Paulo e tem na pauta da educação sua bandeira eleitoral.

O projeto original de sua autoria cria um auxílio a estudantes vinculado ao Bolsa Família. Prevê pagamentos só na conclusão de cada série, além de outro incentivo financeiro vinculado à participação no Enem e obtenção de uma nota mínima. O conteúdo final, no entanto, deve contemplar pontos de interesse do governo.

Entre outras razões, o governo Lula optou pela medida provisória porque considerou que proposta da Câmara não contemplava todos os pontos necessários.

Também há o entendimento dentro da equipe de Camilo Santana que o abandono da medida provisória não tem relação com a discussão sobre o mérito da matéria, mas com interesses políticos.

A medida provisória do governo não detalhava como iria funcionar o incentivo aos alunos, que também teria como foco famílias inscritas no Bolsa Família.

A proposta do MEC é a criação de bolsas mensais que representarão, no total, R$ 2.000 por ano para cada estudante beneficiado. Além disso, prevê R$ 3.000 em uma poupança, que será dividida em depósitos anuais e só poderá ser sacada ao fim de todo o ensino médio. Com esse desenho, o custo calculado para 2024 é de R$ 7 bilhões.

Há desconforto do presidente da Câmara e de políticos do seu entorno com o MEC. O assédio do centrão pelo comando do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), autarquia vinculada à pasta, é um dos pontos de atrito. Além disso, novas regras do ministério sobre a criação de cursos de medicina e limitações à oferta de cursos a distância em instituições privadas de ensino também mobilizam deputados.

Políticos ainda avaliam que a pasta não tem mantido diálogo produtivo com a Casa. Outra faísca provocada por Lira nessa relação foi a designação do deputado Mendonça Filho (União-PE) para relatar o projeto que altera o novo ensino médio.

Isso porque ele era o ministro da Educação durante a última reforma desta etapa, feita via medida provisória durante a gestão Michel Temer (MDB).

Por isso, a decisão de Lira foi não foi bem recebida dentro do governo. Mendonça já indicou que não deve manter pontos defendidos pela gestão Lula, como o nível do aumento da carga horária para disciplinas tradicionais, como português e matemática.

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