A rede estadual de São Paulo registrou queda de rendimento no ensino médio em 2023, segundo o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação), principal indicador de qualidade da educação básica do país. A avaliação foi feita no fim do primeiro ano de mandato do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Os dados foram divulgados nesta quarta-feira (14) pelo MEC (Ministério da Educação). São Paulo tinha uma média de 4,3 para o ensino médio em 2019. O indicador subiu para 4,4 em 2021, mas caiu para 4,2 em 2023. O índice vai de zero a 10.
A queda em São Paulo, que coincide com o primeiro ano da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), vai na contramão da recuperação registrada pela média nacional para essa etapa, que teve ligeira alta em relação aos níveis de aprendizagem pré-pandemia.
A média das redes estaduais de ensino do país foi de 3,9 em 2019 e 2021. Em 2023, houve ligeiro crescimento para 4,1.
A rede estadual de Goiás, estado governado por Ronaldo Caiado (União), foi a que teve o melhor resultado do Ideb, com média de 4,8. Em seguida está o Espírito Santo (Renato Casagrande, PSB) e Paraná (Ratinho Junior, PSD), com média de 4,7.
O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), órgão ligado ao MEC, é o responsável pelo trabalho. Os resultados foram apresentados nesta quarta pelo ministro Camilo Santana e pelo presidente do Inep, Manuel Palácios.
A queda do desempenho em São Paulo acontece no momento em que o governo apostou em duas políticas para essa etapa. A primeira, ainda durante o governo João Doria (ex-PSDB), foi a implementação antecipada do novo ensino médio.
São Paulo foi o primeiro estado a fazer as mudanças curriculares para a etapa, tendo iniciado o novo formato um ano antes do restante do país. Assim, as alterações entraram em vigor no primeiro ano do ensino médio em 2021, no segundo ano em 2022 e, no terceiro ano, em 2023 —ou seja, os alunos avaliados no Ideb 2023 foram os que completaram todo o ensino médio sob o novo modelo.
Como mostrou a Folha, a nova organização da grade curricular do ensino médio em São Paulo deixou os alunos sem aulas de história, geografia, biologia, química e física no último ano dessa etapa de ensino em 2023. Eles também só tinham duas aulas por semana de matemática e duas de português.
Os resultados das provas do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), que compõem o cálculo do Ideb, mostram que houve queda do rendimento dos alunos paulistas em português e matemática.
Em 2023, a média dos estudantes foi de 264,66 em matemática e de 274,43 em português —são as menores notas registradas desde 2017.
Diante das críticas ao novo ensino médio em São Paulo, o governo Tarcísio fez ainda no ano passado uma nova alteração na grade curricular dessa etapa para aumentar a carga horária de disciplinas comuns.
"Essa é uma questão muito específica de São Paulo, que tem sempre essa mania de tentar se antecipar aos movimentos que acontecem na política educacional nacional. E assim faz reformas antecipadas, apressadas, sem tempo para a rede de ensino se adaptar", diz Fernando Cássio, professor da Faculdade de Educação da USP.
Outra política que impactou a rede de ensino paulista, na avaliação de Cássio, foi o intenso processo de digitalização, iniciado pelo secretário de Educação de Tarcísio, o empresário da área de tecnologia Renato Feder. Ele adotou uma série de aplicativos e plataformas digitais para serem usados nos processos pedagógicos e monitorar o trabalho dos professores.
Ele chegou a anunciar que não iria mais usar livros didáticos, mas recuou depois de forte repercussão negativa. Apesar disso, manteve a produção e cobrança do uso de aulas digitais nas escolas e, inclusive, começou a produzi-las como o uso de ferramentas de inteligência artificial.
"Essa plataformização exacerbada nas escolas leva alunos e professores a pararem de ver sentido no processo educativo. Por que o objetivo de ir para a escola deixa de ser o aprendizado e se torna o de preencher plataformas. É uma soma de fatores muito danosos que fazem São Paulo piorar os resultados", diz Cássio.
Em nota, a Secretaria de Educação de São Paulo disse que os resultados do Ideb reforçam o diagnóstico feio no início da gestão Tarcísio, que apontou uma "defasagem na aprendizagem e a necessidade de implementar medidas para recuperar o déficit acumulado ao longo da pandemia."
Segundo a pasta, as principais ações para recuperar o aprendizado foram implementadas a partir do 2º semestre de 2023. A secretaria ressaltou a mudança curricular no ensino médio, que aumentou a carga horária para as disciplinas de matemática e português.
Também citou a ampliação do itinerário do ensino técnico nas escolas regulares da rede e destacou ainda a digitalização dos processos de ensino, como o aplicativo para acompanhar a frequência escolar dos alunos.
Entenda o Ideb
O que é?
O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica foi criado pelo Inep em 2007 para medir a qualidade do aprendizado nacional e estabelecer metas para a melhoria do ensino.
O indicador é calculado para cada escola, município e estado, além de ter médias nacionais.
Como é calculado?
O Ideb é formado por dois fatores:
- desempenho dos estudantes no Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica); as provas de matemática e português são aplicadas a cada dois anos
- taxas de aprovação escolar
Com esses dois componentes é calculado o índice, que varia de 0 a 10.
O Ideb estabelece metas?
Sim. Quando o indicador foi criado, foram estabelecidas metas para ser alcançadas até 2021: para os anos iniciais do ensino fundamental (do 1º ao 5º ano) a perspectiva era que o país alcançasse uma média igual ou superior a 6. Para os anos finais (do 6º ao 9º ano), a meta era alcançar a média de 5,5
Já ara o ensino médio, a meta era de 5,2 pontos.
No ensino fundamental, cada escola também teve metas calculadas individualmente. Isso não ocorre no ensino médio porque o Saeb é realizado por amostra nesta etapa.
Como as metas não houve a formulação de um novo modelo do Ideb, só há metas até 2021. Assim, nesta edição de 2023 o indicador não há metas para serem alcançadas.
Quais são as críticas ao Ideb?
A principal crítica é de que o indicador é de difícil interpretação e, por isso, pouco ajuda gestores escolares e professores a entender o nível de aprendizado de seus estudantes e como esses resultados podem indicar melhores estratégias de ensino.
Especialistas também avaliam que as metas e a forma de avaliação do Saeb estão defasadas e não refletem o que atualmente é considerado como uma aprendizagem adequada. Ainda há críticas ao formato de cálculo do Ideb, que não mede as desigualdades educacionais. Assim, a busca pela melhora no indicador pode levar as redes de ensino à exclusão de estudantes com mais dificuldade.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.