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Fora da ascensão da classe média, Brasil tem soluções em negócios sociais

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A classe média se impôs como maioria global. A cada segundo, uma pessoa deixa a condição de pobreza extrema, em uma ascensão social jamais vista. Pela primeira vez na história da humanidade, mais da metade da população global –3,8 bilhões de pessoas– vive em lares que podem ser classificados como habitações de classe média ou de ricos. 

Esse momento de inflexão global ocorreu em setembro de 2018 e foi identificado pelos pesquisadores Homi Kharas e Kristofer Hamel, da organização americana Brookings Institution, em um estudo conduzido em 188 países. Nele, os especialistas esmiuçaram os gastos em domicílios em diferentes nações.

Esse trabalho mostra uma mobilidade relativamente rápida, destacando a classe média. A projeção é que esse estrato social atinja 4 bilhões de pessoas até 2020 e serão 5,3 bilhões em 2030 –enquanto o grupo vulnerável terá 900 milhões de pessoas a menos.

Os estudiosos mostram que, a cada segundo, cinco pessoas ingressam nesse grupo social. Quando analisaram o avanço entre os ricos, constataram que a métrica é dois segundos. Cabe esclarecer que os autores da pesquisa definiram como pobres as famílias cujo gasto diário por pessoa é US$ 1,90 (R$ 7,37), e a classe média fica na faixa entre US$ 11 e US$ 110 (R$ 42,68 e R$ 426,82). Acima desses valores estão os ricos. 

Quando questionados sobre a importância desse ponto de inflexão da classe média, os autores do estudo apontam que esse é a parcela populacional que impulsiona a demanda na economia global –dois terços do consumo domiciliar é oriundo da classe média– e que é mais exigente com os governos, pressionando politicamente por moradia adequada, sistema de saúde universal e educação de qualidade.

Embora os ricos gastem mais por pessoa, não são numericamente suficientes para impulsionar a economia global. Pelos cálculos de Kharas e Hamel, os mercados da classe média na China e na Índia responderão, em 2030, por US$ 14,1 trilhões (R$ 54,71 trilhões) e US$ 12,3 trilhões (R$ 47,73 trilhões), respectivamente. Nos Estados Unidos, a cifra será US$ 15,9 trilhões (R$ 61,7 trilhões). 

Entretanto, o Brasil está à margem dessa mobilidade global socioeconômica. No início de 2016, 4 milhões de brasileiros retornaram às classes D e E. Estamos diante de uma crise sem precedentes, que comprometeu a oferta de serviços básicos, sobretudo para a população de menor renda.

Em um país com forte presença do governo, a população vulnerável –e mesmo a classe média– aguarda que o Estado resolva os problemas de saúde, educação e infraestrutura. Um exemplo, dentro da saúde, nos ajuda a melhor entender a questão.

O brasileiro que precisa de um oftalmologista dentro da rede pública de saúde aguarda, em média, 314 dias por uma avaliação de catarata. Na prática, quase um ano inteiro para verificar se há indicação para cirurgia, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo.

Até dezembro de 2017, a fila de espera do SUS para o procedimento contava 24 mil pessoas, somente em São Paulo. No Brasil são 113.185 cidadãos, de acordo com levantamento realizado pelo Conselho Federal de Medicina.

Esse contingente é formado, em grande parte, por idosos da baixa renda. A catarata é responsável por 51% dos casos de cegueira no mundo, sendo a população acima de 50 anos a de maior incidência da doença –um processo natural de envelhecimento do cristalino e que pode ser completamente reversível com a cirurgia.  

O fato é que, pela forte presença do Estado na saúde via SUS, a população espera que o problema seja resolvido pelo próprio governo. Só que isso muitas vezes demora meses e até anos e, nesse ínterim, o paciente perde a visão em um processo que impacta a empregabilidade e aprofunda as dificuldades econômicas da família.

É nesse contexto que os negócios de impacto social têm potencial de romper com essa lógica. Como empreendedor social, estou convencido desse papel de qualificar o atendimento à população de menor renda à medida que atuamos como solução de acesso.

A dificuldade para realização à cirurgia para substituição do cristalino para a população de baixa renda me motivou a criar a Central da Catarata. O empreendimento, fundado em 2017, já realizou mais de 500 cirurgias somente no primeiro ano, com o objetivo social de tornar mais acessível a cirurgia, oferecendo condições exclusivas de preço, formas de pagamento facilitadas e processos transparentes.

A acessibilidade desse negócio de impacto não é relacionada apenas ao preço: o processo simples e acolhedor de agendamento também é um diferencial no atendimento aos pacientes. A equipe da empresa orienta, tira dúvidas, envia informações e vídeos e oferece o pacote de cirurgia das clínicas afiliadas para quem solicita. Não há troca de dinheiro e nenhum vínculo com o paciente que não seja o de suporte emocional para a tomada desta importante decisão.

Começamos pela cidade de São Paulo para validar o modelo e poder ter melhor controle da operação. Apesar disso, já recebemos vários pacientes de outros estados e estamos em processo de afiliação de mais hospitais de referência. A nossa expectativa é dobrar o número de cirurgias chegando a 1.000 até o final de 2018. 

Com a lógica de mercado, os negócios de impacto social levam à população de menor renda acesso à educação, saúde e serviços financeiros, empregabilidade, por exemplo. Esses produtos e serviços em setores estruturantes promovem, efetivamente, a inclusão social. Essa é a premissa de um novo capitalismo.

Guilherme de Almeida Prado

Fundador da Konkero, portal que tem como missão transformar a vida financeira de brasileiros, e da Central da Catarata. É especialista em finanças pessoais e graduado e mestre em administração de empresas pela FGV (Fundação Getúlio Vargas)

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