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Rodrigo Brito

Movimentos transformadores: liderança, investimentos e oportunidades

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Nos dois textos já publicados desta série sobre elementos comuns de movimentos que estão transformando periferias urbanas, comunidades rurais e universidades do Brasil, abordei como estes atuam localmente, se integram e passam a influenciar a sociedade em objetivos cada vez maiores.

Nesta terceira e última contribuição, abordarei sobre o perfil de lideranças que contribuem para a formação e desenvolvimento destes movimentos, assim como um conjunto de oportunidades e motivos parar investirmos na ampliação destes movimentos em diferentes setores para o Brasil.

Inspiradores, discretos e multiplicadores

Todo e qualquer tipo de organização ou movimento precisa de pessoas competentes, comprometidas e inspiradoras para crescer. No caso de movimentos transformadores, o perfil de suas lideranças exige um conjunto de características bastante específicas.

Diferente de empresas ou organizações sociais que muitas vezes prosperam em torno da personalidade de uma ou poucas pessoas, movimentos precisam de líderes que formem e multipliquem outros líderes. Precisam de líderes que sejam simultaneamente inspiradores e discretos.

Inspiradores no sentido de mobilizar outros pela causa e seu exemplo. Discretos por muitas vezes ofuscar a si mesmo intencionalmente dando destaque maior aos objetivos e promovendo lideranças emergentes.

Agindo continuamente desta forma inspiradora e discreta, podemos dar um terceiro adjetivo a este perfil de liderança: multiplicadores.

O tamanho e a quantidade de atividades que um movimento consegue realizar está diretamente relacionado ao número de lideranças e times que ele consegue formar em sua estrutura. 

Como movimentos devem mobilizar e integrar cada vez mais pessoas e organizações para suas causas, apenas aqueles que conseguem produzir múltiplas lideranças podem gerar a renovação e massa crítica necessárias para produzir as mudanças e pontos de inflexão que perseguem.

Se ao longo dos anos as lideranças não se renovam nem ampliam com novos quadros, é grande o risco destes movimentos estancarem e pararem no tempo. Se a personificação pode inspirar no início, ela também limita e torna os movimentos vulneráveis se não for superada.

Sem renovação e novos quadros, a legitimidade e intenção dos seus poucos líderes passa a ser questionada interna e externamente, aumentando a percepção de que fazem isto apenas ou principalmente em benefício próprio. 

Renovar não significa diminuir a memória de quem já passou, mas exatamente o contrário. Significa fomentar uma cultura e modelo de liderança temporária e que forma novas gerações justamente pela inspiração, exemplo e reconhecimento de quem já fez parte.

Ao invés de jardins com uma ou poucas grandes árvores, movimentos devem ser florestas densas de lideranças com cada vez mais sementes sendo cultivadas.

Ao passo que precisa crescer quadros e produzir novas lideranças, é proporcionalmente desafiador manter a cultura, foco e garantir a fibra ética na conduta de seus líderes e integrantes. Por isso é tão importante aprimorar processos, governança e reforçar símbolos, separando ou evitando ao máximo quaisquer vínculos político-partidários para que não rotulem ou coloquem em dúvida estes movimentos.

Sem legitimidade, reputação ou renovação, os movimentos começam a esvaziar, envelhecer e definhar, até não terem mais relevância e tornarem-se apenas memórias.

Por que investir e impulsionar

Anualmente a soma de todo o investimento social privado realizado no Brasil por empresas, institutos, fundações e filantropos varia entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões (segundo o Censo Gife, Bisc e Comunitas).

Considerando que este é todo o investimento não governamental disponível para uma infinidade de demandas e causas (educação, cultura, saúde, acesso à água, ciência e tecnologia etc.), fica evidente que escolher bem onde e como aplicar estes recursos deve considerar o maior impacto gerado por real investido. 

Nesse sentido, espero que cada vez mais possamos ver casos, modelos e opções de apoio e investimento para coalizões, alianças e movimentos transformadores, principalmente pelos grandes diferenciais, eficiências e influência que estes apresentam e devem ser serem considerados em estratégias de investimento para o desenvolvimento econômico, social e ambiental do país.

Contribuir para fortalecer movimentos transformadores é contribuir para construir ou reforçar camadas do tecido e infraestrutura social e cultural para mudanças mais amplas.

Significa contribuir para gerar resultados que vão além de projetos isolados ou organizações específicas na medida em que geram ganhos, avanços e aprendizados coletivos que somam mudanças mais amplas e legados que beneficiam um amplo conjunto de atores..

Se sozinhos vamos mais rápido (pagando mais caro por um impacto menor), juntos vamos mais longe (com maior eficiência, resiliência, influência, impacto e aprendizados gerados). 

oportunidades para mais impacto coletivo

Se nesta série de artigos tratei de exemplos de movimentos em universidades (Brasil Júnior), recicladores em áreas urbanas (Movimento Nacional dos Catadores) e água em comunidades rurais (Água+ Acesso), acredito e espero que estes aprendizados e modelos sirvam para outros temas e setores que buscam mudanças estruturais e coletivas.

No Brasil já temos iniciativas com estratégias semelhantes em temas como empreendedorismo e negócios sociais (lideradas por organizações como Endeavor, Artemisia, ICE, Quintessa e Vox Capital), temos ainda grandes desafios e oportunidades para impactar em outros temas e áreas.

Como exemplo, como poderiam atuar de forma mais integrada e coletiva as diversas novas organizações e iniciativas voltadas à democracia ou renovação política como o Politize, Instituto Atuação, Renova BR e Movimento Acredito?

Em ciência e tecnologia, como integrar professores, pesquisadores, empresas e universidades em esforços mais coletivos em um movimento para um Brasil mais moderno, rico e inovador?

Como organizações novas —como Emerge, Instituto Serrapilheira e Wylinka— se unem a organizações que há anos se dedicam a este tema —como a ABC (Academia Brasileira de Ciências), SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), CERTI e ANPROTEC— na construção e perseguição coletiva de uma agenda comum (em níveis locais e nacional) que amplie visibilidade e oportunidades para quem produz inovação no país?

Acredito que estes são apenas alguns dos temas e setores essenciais onde temos grandes oportunidades para integração, investimento e impacto coletivo no Brasil.

Se (como diria Victor Hugo) “não existe nada mais forte do que uma ideia cujo tempo chegou!”, acredito que apoiar e investir em movimentos transformadores são boas formas para fazer esse tempo e mudanças chegarem.

Rodrigo Brito

Integrante da Rede Folha de Empreendedores Socioambietais, é gerente de Sustentabilidade da Coca-Cola Brasil, cofundador e conselheiro da Aliança Empreendedora e Emerge Brasil.

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