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O território do empreendedor social: dimensão subjetiva de quem faz
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MIRIAM FERRARI *
Dafna Kann é nutricionista e proprietária de uma empresa que presta consultoria, auditoria e outros serviços no ramo da alimentação. Desde 2003 também é voluntária da Associação Prato Cheio e hoje essa empreendedora é a presidente dessa Organização do Terceiro Setor criada para reduzir a insegurança alimentar e colaborar com a sustentabilidade ambiental, por meio da redução do lixo gerado pelos alimentos.
Desde criança foi incentivada pelos pais a trabalhar pelos mais pobres e não ceder à naturalização da pobreza que insiste em se instalar e provocar a letargia alienante.
A proposta deste ensaio é uma sucinta reflexão --com base na noção de território existencial em Guattari, pensador, engajado em movimento social-- sobre o fazer de uma empreendedora social.
Segundo Guattari e Rolnik (1999) em "Micropolítica, Cartografias do desejo": "O território pode ser relativo tanto ao espaço vivido, quanto a um sistema percebido no seio do qual o sujeito se sente 'em casa'. (...) Ele é o conjunto dos projetos e das representações nos quais vai desembocar, pragmaticamente, toda uma série de comportamentos, de investimentos, nos tempos e nos espaços sociais, culturais, estéticos, cognitivos".
O território tem um valor existencial, definido não só pelo espaço físico como também pelo espaço interno, numa dimensão subjetiva: subjetividade está em permanente produção, pelos mais heterogêneos vetores; nas relações que acontecem no cotidiano, os corpos se lançam, pensamentos se entrecruzam e subjetividade se produz nesses fluxos sociais.
O território circunscreve, para cada um, marcas de permanência e de apropriação, resultantes de agenciamentos que engajam sempre dimensões heterogêneas. Guattari e Rolnik: "Um fato subjetivo é sempre engendrado por um agenciamento de níveis semióticos heterogêneos".
Quem nunca ouviu o jargão: "Tenho horror a pobre"? Quando o sujeito se fecha em suas modelizações subjetivas, em seus privilégios e mal tem contato com a realidade do seu entorno, podemos falar de um vetor de subjetividade, onde a violência toma forma de arrogância.
Dafna parece operar produzindo certos choques nos territórios-códigos fechados quando defende a causa em ocasiões e espaços nem sempre "adequados" (festas, reunião de trabalho), e tenta contagiar mais pessoas que possam se dispor a doar um pouco de tempo, talento ou dinheiro para esse tipo de projeto.
Heterogêneos devem ser os muitos agenciamentos que fazem parte da composição de um território existencial que em Dafna inclui, ao lado da vida de empresária, um persistente trabalho de alteração da vida cotidiana de muita gente em condição de vulnerabilidade social. Tal posição fronteiriça de Dafna, entre territórios, a coloca em condições de afetar territórios endurecidos, atuando como um vetor de contágio.
A exemplo da personagem desta reflexão, novos atores podem examinar suas modelizações subjetivas, agregando ao seu enredo novas práticas, que podem começar por discussões sobre pequenos empreendimentos sociais nos círculos de amigos, bares, mídias. Talvez assim se faça um agenciamento de subjetividades desprovidas de arrogância e acrescida da vontade de fazer algo ao lado dos outros.
*Miriam Ferrari - graduada em serviço social pela PUC-Campinas e mestranda em psicologia social pela PUC-SP. Professora de Gestão de Projetos Sociais da PUC-SP. É membro do Neats (Nucleo de Estudos Avançados no Terceiro Setor) e Nutas (Núcleo Trabalho Ação Social). Conselheira Consultiva e professora do Iats (Instituto Administração Terceiro Setor Luis Carlos Merege). E-mail para contato: miriam.ferrari@terra.com.br
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