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Ajudar parceiros com depressão envolve autocuidado e escuta aberta

Especialistas recomendam priorizar a própria saúde mental para não se contaminar com os sintomas do companheiro

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Catherine Pearson
The New York Times

Jeff Zuckerman e sua mulher estavam casados havia 30 anos quando ela recebeu o diagnóstico de transtorno bipolar e a depressão. Ela teve sua primeira crise, que durou meses, na primavera de 2015. Imediatamente depois, caiu em grave depressão. Os episódios abalaram a saúde do casal.

"Você precisa entender que, para ela, a depressão não é só tristeza quanto é vazio", disse Zuckerman, 68, que é escritor e editor autônomo em Minneapolis. Quando a depressão de sua mulher estava no auge, ela permaneceu na cama, com as cortinas fechadas, durante meses, parou de tomar banho e mal falava.

"Essa mulher era tão ativa, ela dirigia nossa família. Era mãe, trabalhava, todas essas coisas, e então caiu numa depressão tão profunda", disse Zuckerman, que escreveu um livro –"Unglued: A Bipolar Love Story" (Separada: uma história de amor bipolar, em português) – sobre amar um cônjuge sob as garras da doença mental.

Sentada em um canto, mulher se dobra para a afrente e abraça os joelhos, escondendo o rosto
Como ajudar parceiros com depressão? - Pixabay

Milhões de americanos vivem relacionamentos com parceiros propensos à depressão. Estima-se que 21 milhões de adultos nos Estados Unidos viveram pelo menos um episódio depressivo maior, enquanto em partes do país até 10% das pessoas têm transtorno afetivo sazonal, uma síndrome que tende a aparecer durante o outono e o inverno, quando os dias ficam mais curtos.

Ao ajudar seu parceiro a enfrentar o tratamento contra a depressão, os especialistas dizem que existem maneiras de apoiar e cuidar de si mesmo.

Saiba mais sobre a doença

Familiarizar-se com alguns dos marcadores físicos e emocionais da depressão pode te ajudar a identificar se seu parceiro ou parceira está simplesmente de mau humor, fisicamente esgotado ou vivendo com depressão.

Sinais comuns incluem perda de interesse por atividades regulares, alterações no apetite ou sono, ou sintomas físicos inexplicáveis, como dores de cabeça ou nas costas que tendem a durar pelo menos duas semanas, de acordo com o Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos.

Aprender mais sobre o que é a depressão e como ela afeta as pessoas também pode te ajudar a se proteger emocionalmente, responder com mais empatia e não levar o comportamento de seu parceiro para o lado pessoal.

"Se um parceiro não entende que o outro está sofrendo de depressão, pode confundir coisas como perda de interesse por romance ou sexo por uma rejeição pessoal", explicou Xavier Amador, psicólogo clínico e coautor de "When Someone You Love Is Depressed" (Quando seu amor está deprimido, em português).

Tenha curiosidade sobre a experiência do seu parceiro

Quando seu parceiro está com dor, você pode sentir vontade de mergulhar de cabeça e dizer a ele ou ela o que acha que está acontecendo. Mas tente começar fazendo perguntas, disse Amador. Pergunte a seu parceiro como ele está se sentindo. Diga-lhe que você gostaria de entender mais sobre o que ele está passando.

Se seu parceiro for defensivo, Amador recomenda uma estratégia conhecida como "escuta reflexiva". Por exemplo, se você perguntar ao seu ente querido como ele está se sentindo e ele lhe disser que está bem e que não há nada de errado, você responderá com algo como: "Você está me dizendo que não há nada de errado, é isso? Correto? Posso lhe dizer o que notei?", pontuou Amador.

Se você fizer um esforço para puxar a conversa com perguntas, em vez de se apressar a dar sua opinião, é mais provável que seu parceiro se sinta ouvido e valorizado, não julgado, disse ele.

Reconheça suas próprias limitações

Para ajudar um ente querido a obter diagnóstico e tratamento, você pode ligar para potenciais provedores e marcar consultas, ou compilar uma lista de médicos para que ele ou ela entre em contato. Mas os especialistas dizem que também é importante lembrar que você não pode forçar ninguém a obter ajuda, e que pressionar demais pode gerar um resultado indesejado.

"É um ato de equilíbrio", disse Lily Brown, diretora do Centro para Tratamento e Estudo da Ansiedade da Escola de Medicina Perelman da Universidade da Pensilvânia.

"É claro que você quer estar disponível para conversar e sugerir como ele pode obter ajuda, mas se você estiver conduzindo demais o barco, a pessoa que luta contra a depressão pode começar a se sentir um pouco mais desamparada e um pouco mais sem esperança."

Ela acrescentou que os parceiros que assumem demasiada responsabilidade por cuidar do outro também são frequentemente dominados por sentimentos de culpa e vergonha quando não conseguem resolver o problema.

Você não deve ser o único apoio de seu parceiro, especialmente em situações em que ele possa estar em perigo. Tenha em mente que a depressão pode aumentar o risco de automutilação e pensamentos suicidas [e o Centro de Valorização da Vida no Brasil (basta ligar 188 de qualquer telefone ou celular em território nacional) oferece oferece apoio emocional e prevenção ao suicídio].

Priorize sua saúde mental

Os parceiros românticos podem afetar a saúde e os comportamentos relacionados à saúde um do outro de maneiras boas e ruins, e Amador observou que algumas pesquisas sugerem que os sintomas depressivos podem ser, de certa forma, contagiosos.

"Se você vive com alguém que está deprimido e se sentindo desamparado –e muitas vezes não quer obter ajuda–, você pode começar a se sentir deprimido e desamparado", disse o profissional.

É imperativo que você apoie sua própria saúde mental, enfatizaram tanto Amador quanto Brown. Se você estiver com sintomas de depressão, procure um profissional de saúde para avaliação. Mas mesmo que não esteja pode ser útil consultar um terapeuta ou participar de um grupo de apoio liderado por pares.

Zuckerman é um facilitador voluntário da Aliança Nacional para Saúde Mental, ou NAMI, grupo de apoio para famílias e parceiros de pessoas com problemas de saúde mental. Isso o ajudou a se conectar com uma comunidade de pessoas que entendem o que ele está passando. A cada duas semanas, Zuckerman e cerca de dez a 15 outros parceiros discutem técnicas de enfrentamento, ajudam-se mutuamente a processar sentimentos de pesar ou culpa e oferecem um espaço seguro para compartilhar seus desafios e sucessos.

Encontre tempo para o que gosta

Além de se conectar com um terapeuta ou grupo de apoio se necessário, também é importante encontrar outras maneiras de priorizar o autocuidado. Não precisa ser demorado ou complicado, disse Brown. Simplesmente sair um pouco de casa e reservar um tempo para as atividades de que você gosta pode ajudar a proteger seu próprio bem-estar emocional quando seu parceiro está com dificuldades.

Passe algum tempo ao ar livre na natureza, envolva-se em alguma forma de ativismo ou movimente seu corpo. A pesquisa mostrou, por exemplo, que correr 15 minutos por dia ou fazer exercícios menos extenuantes, como caminhada ou jardinagem por uma hora, pode ter um efeito protetor contra a depressão.

E "socialize, socialize, socialize –o que quer que isso seja para você", recomendou Amador. "É realmente importante obter esse apoio social e liberação." Você pode incentivar seu parceiro a acompanhá-lo em seus esforços para sair e se exercitar ou se conectar com outras pessoas, mas lembre-se de que a perda de interesse por atividades normais ou hobbies é um sintoma de depressão.

A mulher de Zuckerman –que deu ao marido autorização para compartilhar sua história, mas sem revelar seu nome– está estável há três anos e disse que as coisas entre o casal estão "ótimas". Eles vão ao cinema, a shows e apresentações de dança juntos. Cozinham, passam tempo com os netos e frequentam a sinagoga.

Mas Zuckerman também continua a se lembrar de que não é egoísmo priorizar o autocuidado.

"Nós amamos fundamentalmente nossos parceiros e nossos cônjuges e, no fundo, sabemos que é uma doença. Sabemos que você não pode culpar alguém por estar doente", disse ele. "No entanto, o que passamos em consequência disso pode ser arrasador."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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