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Cafeína é o pré-treino ideal para melhorar desempenho ao se exercitar

A substância psicoativa é uma das mais consumidas e estudadas no mundo

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Hilary Achauer
The New York Times

Durante dois anos, Steph Gaudreau desistiu de sua xícara diária de café. Ela mudou para grandes canecas de chá de ervas, mas não porque a cafeína estivesse afetando seu sono ou a deixando ansiosa, mas para ganhar vantagem nas corridas de mountain bike cross-country.

Na esperança de aumentar o efeito da substância como auxiliar de desempenho, Gaudreau, que mora em San Diego, na Califórnia, tomava uma xícara de café no dia da corrida enquanto se aquecia. Quando o reforço de cafeína antes da corrida fazia efeito, a atleta, hoje uma terapeuta nutricional e treinadora de força, diz que sentia uma sensação de euforia que a ajudava a ficar focada e mentalmente preparada para a corrida. A estratégia deu certo. Em 2010, ela conquistou o primeiro lugar numa corrida regional de ciclismo amador, chamada Kenda Cup.

Xícara de café
Cientistas estudam efeitos da cafeína quando consumido antes de atividades físicas - Adobe Stock

A cafeína é a substância psicoativa mais amplamente consumida no mundo e uma das mais estudadas. Os cientistas observam o efeito da cafeína no atletismo desde 1900. Embora ainda exista certa discordância quanto ao mecanismo exato pelo qual o consumo de cafeína afeta o desempenho no exercício, e se fazer uma pausa até o dia da prova pode gerar uma vantagem, os cientistas concordam que uma xícara de café antes do treino pode melhorar o desempenho, esteja você jogando na NBA ou apenas correndo pelo seu bairro.

No entanto, é importante estar ciente das possíveis desvantagens do consumo de cafeína e saber a melhor forma de usá-la a seu favor durante o treino.

Quais os benefícios?

Gaudreau não imaginava o efeito de sua xícara de café antes da corrida. Há um bom consenso entre os cientistas de que a cafeína dá uma vantagem no exercício, seja para correr uma maratona, levantar pesos ou jogar futebol, diz Nanci Guest, nutricionista, treinadora e pesquisadora da Universidade de Toronto (Canadá), que em 2021 liderou uma ampla revisão de estudos de cafeína e exercícios.

Seja consumida por meio de café, suplemento para treino ou bebida energética, a cafeína tende a melhorar o desempenho em uma média de 2% a 5%, aponta Brad Schoenfeld, professor de ciência do exercício no Lehman College no Bronx e diretor do programa de desempenho humano e condicionamento físico da escola.

Embora a cafeína melhore moderadamente as atividades anaeróbicas (exercícios intensos e curtos), como levantamento de peso, corrida e treinamento intervalado de alta intensidade, ela parece mostrar o maior benefício com esforços aeróbicos (exercícios menos intensos e mais longos), como natação, ciclismo e corrida.

Por exemplo, uma análise feita em 2020 de vários estudos sobre o efeito da cafeína no desempenho do remo descobriu que os remadores competitivos melhoraram seu tempo em uma raia de 2.000 metros em cerca de quatro segundos após usarem cafeína.

"É preciso muito trabalho para diminuir a remada de 2.000 metros se você treina há alguns anos", diz Mike T. Nelson, professor-associado do Instituto Carrick de Neurociência Clínica. "Mas se você disser: 'Ei, apenas tome este suplemento e podemos diminuir seu tempo instantaneamente em quatro segundos', eu vou tomar o suplemento".

Esta resposta à cafeína varia de pessoa para pessoa, dependendo de fatores como genética, sexo, atividade hormonal e até dieta. Alguns veem melhora do desempenho acima de 5%, enquanto outros quase não a notam.

"Existem metabolizadores rápidos de cafeína e metabolizadores lentos de cafeína", afirma Nelson.

Como funciona?

A influência da cafeína em nosso sistema nervoso começa com a adenosina, um neurotransmissor que se liga a receptores específicos e nos deixa sonolentos. A cafeína se liga a esses mesmos receptores, bloqueando o funcionamento da adenosina.

"Quando a cafeína bloqueia esse receptor, o resultado é um efeito estimulante", diz Guest. Isso, por sua vez, libera outros hormônios como dopamina e epinefrina, que estão relacionados ao humor, foco e estado de alerta.

Alguns estudos mostraram que a cafeína também ajuda nossos músculos a produzir mais força. Nosso corpo precisa de cálcio para iniciar as contrações musculares, e a cafeína ajuda a mobilizar os íons de cálcio para que eles tenham uma maior interação com os filamentos que induzem as contrações das fibras musculares.

"A cafeína aumenta a capacidade dos músculos de se contraírem em uma taxa maior e, portanto, criaria maior força", diz Schoenfeld.

Outros estudos mostram outra força poderosa em ação: o efeito placebo. Se esperamos que a cafeína nos ajude a ter um desempenho melhor, isso pode ser suficiente. Em um pequeno estudo, velocistas competitivos tiveram um desempenho tão bom com cafeína quanto com um placebo, desde que fossem informados de que ingeriram cafeína. Quando os atletas foram informados de que receberam um placebo, eles correram mais devagar, mesmo que tivessem recebido cafeína.

Em outros estudos, como o sobre remo, os especialistas veem melhorias no desempenho em relação aos placebos, mas não em medidas como consumo de oxigênio, frequência cardíaca ou dificuldade sentida no treino. O corpo humano é extremamente complexo, diz Schoenfeld, e muitas vezes é difícil desvendar o efeito de um produto químico no desempenho atlético.

Como usar para ajudar no desempenho?

Sejam físicos ou mentais, os benefícios da cafeína se aplicam a atletas competitivos e àqueles que desejam apenas uma ligeira melhora em seu treino. Um estudo mostrou que a cafeína melhorou em 11 segundos o desempenho de atletas que corriam 5 km e em 12 segundos atletas recreativos.

"Para o atleta de elite ou de alto nível, isso significa muito", diz Nelson.

Estudos mostram que a dose ideal para melhorar o desempenho varia entre 3 e 6 mg por quilo de massa corporal (embora algumas pesquisas mostrem que doses menores podem funcionar).

Por exemplo, uma xícara de café de 226 mg tem cerca de 100 mg de cafeína, embora isso possa variar dependendo do tipo de café e do método de preparo. Portanto, duas xícaras [americanas] de café para uma pessoa de 68 quilos resultam em 2,9 miligramas por quilo.

[Já uma xícara de café brasileira, que contém cerca de 100 ml, tem aproximadamente 40 mg de cafeína, segundo cálculos feitos pela Folha com base em estudos que encontraram a concentração média de cafeína em cafés americanos. Um estudo brasileiro de 1998 feito por pesquisadores da Unicamp (Universidade Estadual de Campinhas), porém, indicou que cafés em pó do mercado nacional teriam concentração entre 43 mg e 85 mg de cafeína por xícara. Já no caso dos instantâneos, a concentração é de 61 mg a 82 mg.]

Pode ser necessário experimentar para encontrar a dose certa para você, porque as pessoas metabolizam a cafeína de maneira diferente. Seja qual for a sua dosagem ideal, certifique-se de que você a tome cerca de uma hora antes do exercício para que a corrente sanguínea tenha tempo de absorver a cafeína.

"A única coisa que eu diria", diz Guest, "é que alguém que não está realmente gastando muita energia, como se estiver fazendo uma caminhada, provavelmente deve usar uma dose menor, porque quando você está estimulado precisa de uma válvula de escape."

Efeitos colaterais e pausas de tolerância

Embora a cafeína possa ajudar no desempenho do exercício, ela tem alguns efeitos adversos.

"Se o seu desempenho envolve habilidades motoras precisas, essas pessoas tendem a se sair pior", daponta Nelson.

Se você toma café no final do dia para ajudar no treino noturno, pode estar atrapalhando seu sono.

"As pessoas subestimam o valor do sono", diz Guest. Qualquer ganho de desempenho que a cafeína esteja lhe dando pode ser anulado se você tiver privação crônica do sono. A cafeína também tem outros efeitos colaterais para algumas pessoas, incluindo nervosismo, ansiedade e aumento da pressão arterial.

Se a cafeína piorar seu sono, ela recomenda tomá-la cerca de oito a 12 horas antes de dormir, dependendo da rapidez com que seu corpo metaboliza a substância química.

Quanto à estratégia de Gaudreau de se abster de cafeína para aumentar seus efeitos de melhora de desempenho, uma análise recente de vários estudos descobriu que o consumo habitual não atenua os efeitos de melhora do desempenho da cafeína.

Você pode experimentar um efeito placebo mais forte se reservar o uso de cafeína para antes de uma competição. Mas Guest também alerta que os efeitos colaterais da suspensão da cafeína, como dores de cabeça, fadiga e concentração prejudicada, podem afetar seus treinos.

Para aqueles que não são atletas competitivos, o benefício da cafeína pode ser mais para ir à academia do que para ter um bom desempenho lá. Afinal, se uma xícara de café matinal é o que o tira da cama, pode ser toda a melhora de desempenho de que você precisa.

Tradução Luiz Roberto M. Gonçalves

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