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OMS e especialistas pedem quebra de patente de remédios em razão da Covid-19

Opas, Médicos Sem Fronteiras, professores e cientistas pressionam Rodrigo Maia a pautar projeto

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São Paulo

A campanha pela quebra de patente de remédios e produtos usados no combate à Covid-19 ganhou corpo nesta quinta-feira (21), com a adesão de entidades de peso na área da saúde e a divulgação de uma carta assinada por 84 especialistas de 28 países.

Somaram-se à iniciativa representantes da Opas (Organização Panamericana da Saúde), braço latinoamericano da OMS (Organização Mundial da Saúde), e da ONG Médicos Sem Fronteiras, uma das mais atuantes do mundo na área.

O principal alvo da pressão é o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para que paute um projeto de lei apresentado em abril que prevê o chamado licenciamento compulsório durante emergências de saúde.

Em nota técnica, a representante da Opas/OMS no Brasil, Socorro Gross Galiano, afirma que vários países já vêm adotando medidas legislativas prevendo o uso das licenças compulsórias em cenários como o atual.

“Medidas legislativas que forneçam sustento legal à aplicação nacional, rápida e oportuna de licenças compulsórias em casos de emergência de saúde pública internacional e/ou nacional contribuem para o fortalecimento das capacidades de planejamento e resposta do sistema de saúde”, afirma Galiano na carta, enviada ao deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) e obtida pela Folha.

Segundo ela, a medida é importante “visando a que a produção, importação ou venda de material sanitário para atender emergências de saúde pública não se vejam obstaculizadas pela existência de monopólios legais”.

Galiano afirma ainda que o acordo de proteção intelectual assinado no âmbito da Organização Mundial do Comércio, conhecido pela sigla em inglês Trips, permite a quebra de patentes em situações de emergência sanitária.

Na mesma linha, em carta que será enviada a Maia nesta sexta (22), o MSF afirma que a aprovação do projeto seria “um alívio para todos os afetados pela Covid-19 no Brasil”.

“Garantir a disponibilidade e acessibilidade de quaisquer ferramentas médicas eficazes requer o uso de intervenções legais e políticas para remover rapidamente quaisquer barreiras que impeçam o acesso”, afirma a carta.

O documento, assinado por Sidney Wong, diretor-médico da organização, e por dois colegas, lembra que o licenciamento compulsório já foi usado no passado para drogas utilizadas no combate a doenças como Aids, hepatite C e câncer, por governos como Brasil, Índia, África do Sul, Tailândia e Malásia.

O projeto foi apresentado à Câmara no início de abril, quando a pandemia no Brasil começava a escalar. Num raro momento de união entre opostos ideológicos, teve a autoria de 11 deputados federais pertencentes a oito partidos, do PT ao PSL.

O objetivo é que, durante a atual crise e em emergências globais futuras, haja o chamado licenciamento compulsório, ou seja, a possibilidade de que outras empresas além da criadora do produto possam fabricá-lo e comercializá-lo. Isso garantiria o suprimento num momento de alta demanda e ajudaria a reduzir os preços.

Nesta quinta (21), Maia já recebeu outro manifesto, assinado por professores e pesquisadores das áreas da saúde e do direito, brasileiros e estrangeiros.

Entre os signatários da carta estão o indiano Anand Grover, que foi relator especial da ONU para a área de Saúde entre 2008 e 2014, além de professores e cientistas ligados a instituições como as universidades de Harvard (EUA), York e Leeds (ambas no Reino Unido).

Ao todo, houve a adesão de especialistas de 28 países, incluindo China, Uganda, Índia. África do Sul e México. No Brasil, assinam a carta pesquisadores e professores da Fundação Oswaldo Cruz e de diversas universidades, nas áreas de saúde e direito comercial.

“Esse projeto de lei certamente promoverá o interesse público ao garantir o acesso a fontes adicionais de suprimentos e de produtos de saúde mais acessíveis”, afirma o documento.

A indústria farmacêutica já se posicionou contrariamente ao projeto.

A Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa), que reúne os fabricantes de remédios, afirma que o licenciamento compulsório "representa uma grande ameaça à pesquisa e ao desenvolvimento de novos tratamentos, por inviabilizar a sustentabilidade da pesquisa científica."

A entidade diz ainda que haveria prejuízo à credibilidade do Brasil, pelo fato de a medida ir contra acordos internacionais de que o país é signatário. Segundo a Interfarma, para um novo medicamento se mostrar seguro e eficiente são necessários em média dez anos de pesquisa e US$ 1 bilhão investidos.

Os defensores da quebra de patente rebatem dizendo que a emissão de uma licença compulsória não expropriaria os direitos de propriedade do titular da patente, que seguiria recebendo royalties pela invenção.

Ainda não há prazo para que o projeto entre em pauta na Câmara, que vem trabalhando de forma remota desde o início da pandemia.

Para Pedro Vilardi, coordenador do Grupo de Trabalho Sobre Propriedade Intelectual, coletivo de organizações da sociedade civil que defende a quebra de patentes em situações de emergência sanitária, a pressão das entidades e especialistas reforça a urgência do projeto de lei.

“Cabe ao presidente Rodrigo Maia agora agir em defesa da saúde da população. O mundo inteiro está assistindo”, afirma.

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