Descrição de chapéu DeltaFolha

Quarentena no interior de SP é 38% mais fraca que na região da capital

Movimentação de pessoas no interior paulista caiu apenas 34%, ante 55% na área metropolitana

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São Paulo

A movimentação de pessoas no interior de São Paulo foi reduzida apenas em 34% após o início do isolamento social para combate ao coronavírus. A redução no fluxo na capital e região metropolitana foi bem maior, de 55%.

A diferença de 38% do interior em relação à capital aparece na análise do deslocamento de aparelhos móveis feita pela empresa In Loco. Foram analisados os 378 municípios com mais de 10 mil habitantes no estado, de um total de 645, para maior segurança na análise.

Nas cidades menores analisadas parece haver mais dificuldade em diminuir o fluxo de pessoas. Nos 119 municípios com até 20 mil habitantes, a redução média da movimentação foi de apenas 30%.

Alguns exemplos desse perfil de municípios são Severínia e Itapuí, onde o fluxo caiu somente 8% e 12%, respectivamente (os menores percentuais no estado). Nesses locais moram menos de 14 mil habitantes.

Nas 118 cidades com mais de 60 mil habitantes, a diminuição média do fluxo foi de 46%. Osasco (700 mil habitantes) e Santana de Parnaíba (140 mil), ambas da região metropolitana, ilustram essa situação. A queda no fluxo foi de 80% e 74%, respectivamente.

Outro fator que parece influenciar a diminuição do fluxo é a presença já confirmada da doença na cidade. São Caetano do Sul e Barueri, ambos da região metropolitana, são algumas das cidades onde mais houve mortes por 100 mil habitantes (16 e 30, respectivamente) e mais ocorreu redução no movimento (93% e 86%).

A capital paulista também se enquadra nesse perfil. Maior cidade do país, com 12 milhões de habitantes, está entre os 10 municípios que mais pararam (redução de 62% no fluxo) e também é uma das mais atingidas pela Covid-19 (23 mortes por 100 mil habitantes).

O prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), ainda que venha descartando o lockdown (confinamento obrigatório da população), tem buscado medidas administrativas para reduzir a movimentação de pessoas.

Depois de tentar ampliar o rodízio de veículos, que fracassou por colocar mais gente no transporte público, Covas agora anunciou um megaferiado começando nesta quarta-feira (20) e terminando na segunda-feira (25).

No caso das cidades ainda com casos em número relativamente pequeno e que diminuíram pouco o fluxo de pessoas, o risco é a doença estar circulando fortemente, mas ainda de forma despercebida. A Covid-19 pode levar até 14 dias para se manifestar.

Também é preciso levar em conta que alguém contaminado pode ser tratado e, mesmo assim, após alguns dias não resistir e morrer.

Nessa análise feita pela Folha, foi comparada a proporção de aparelhos que se deslocaram ao menos 450 metros do domicílio do usuárioem duas janelas de tempo, antes e após o governador João Doria (PSDB) decretar a quarentena. Feriados e fins de semana foram descartados.

A In Loco afirma que monitora 60 milhões de aparelhos no país, de forma anonimizadas (ou seja, sem saber quem é exatamente a pessoa portadora do equipamento).

O primeiro período de análise compreende de 1 a 15 de março (quando a movimentação já começa a cair), que foi comparado com a janela entre 21 de abril e 6 de maio (apenas dias úteis).

Diferentemente da capital e muitas cidades da região metropolitana, onde os prefeitos estão em clara campanha para reduzir o fluxo de pessoas, no interior a situação é mais heterogênea.

Em Araçatuba, a 520 km de São Paulo, o prefeito Dilador Borges (PSDB) tentou promover a reabertura de parte do comércio no final de abril, mas foi impedido por ação do Ministério Público e posterior decisão do Tribunal de Justiça do Estado.

Seu argumento foi de que manter o fechamento total na cidade de 220 mil habitantes não é algo realista. A movimentação de pessoas caiu apenas 37% nos períodos analisados, de acordo com os dados da In Loco.

"O Ministério Público cobra muito o cumprimento da lei, mas nós não temos braços para isso. Busquei flexibilizar os escritórios de contabilidade e advocacia, além dos salões de beleza, porque muitos já estavam operando na clandestinidade", afirma Borges.

De acordo com o prefeito, o isolamento vem perdendo força no município, entre outros motivos em razão da influência de Jair Bolsonaro sobre a população.

Na cidade, o presidente teve 79,7% dos votos no segundo turno da eleição de 2018 e, de acordo com Borges, ainda conserva bastante apoio no município.

"Nossa cidade aqui é baseada na força do agronegócio. Tem muito seguidor do presidente aqui, não tem como. Fica uma situação muito difícil pro gestor", afirma. Bolsonaro tem constantemente se manifestado contrário ao isolamento social da população.

Araçatuba cidade registrou 112 casos de Covid-19, com 4 óbitos, até segunda-feira (18).

Em Lençóis Paulista, a 245 km da capital, o prefeito Anderson Prado de Lima (DEM) diz que não está satisfeito com os índices de isolamento obtidos em seu município.

"Adotamos uma ação conjunta aqui da prefeitura com as polícias militar e civil, para tentar controlar ao máximo as aglomerações", afirma ele.

Mesmo assim, diz o prefeito, não foi possível evitar a realização de uma carreata há três semanas que reuniu cem veículos em defesa de Bolsonaro e com ataques ao governador Doria, defensor do isolamento. Numa cidade de 70 mil habitantes, é um número considerável.

A movimentação de pessoas na cidade, que já tem 87 casos de coronavírus e 2 óbitos, caiu apenas 31%, segundo a In Loco.

Ex-presidente da Associação Comercial da cidade, Lima afirma que entende a pressão pela reabertura das lojas e restaurante.

"Mas não existe uma movimentação orquestrada para que a cidade se rebele e abra o comércio de forma inconsequente", declara.

Uma diferença do interior para a região metropolitana é o voto em Jair Bolsonaro. No primeiro turno em 2018, ele teve, em média, 59% nas cidades do interior e 48% na Grande São Paulo.

Ainda que as críticas de Bolsonaro ao isolamento possam ser um fator que ajude a explicar o impacto na quarentena, a relação não é simples.

Não há uma tendência clara de cidades que votaram mais no presidente necessariamente aderirem menos.

Um exemplo é Águas de Lindóia, cidade onde o presidente teve 69% dos votos no primeiro turno, mas que apresentou queda de movimentação expressiva, de 59%, acima da média do estado.

O mesmo vale para a região metropolitana. No caso de São Caetano, recordista de isolamento, o presidente teve 58% dos votos

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