Descrição de chapéu Coronavírus

Ministro diz a senadores que não há vagas, mas planilhas mostram UTIs disponíveis em 18 hospitais militares

Braga Netto afirma no Senado que 'hospitais estão completos', e Forças mostram dados diferentes em seus sites, cumprindo ordem do TCU; pasta não comenta

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Brasília

Dezessete hospitais de Exército, Aeronáutica e Marinha, mais o HFA (Hospital das Forças Armadas), em Brasília, tinham leitos de UTI ou emergenciais desocupados na quinta-feira (29), dia em que o ministro da Defesa, general Walter Braga Netto, disse no Senado que não existiam leitos ociosos nas unidades.

"O fato é que não existe hoje leito disponível, não existe leito, vamos dizer, ocioso –não é disponível– nos nossos hospitais. Os nossos hospitais estão completos", disse o ministro a senadores da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.

Braga Netto participou de audiência ao lado dos comandantes das três Forças.

Porém, planilhas que passaram a ser divulgadas por Exército, Aeronáutica, Marinha e HFA, por determinação do TCU (Tribunal de Contas da União), mostram o contrário do que foi dito pelo ministro da Defesa.

A vacância de leitos de UTI e emergenciais, no dia da fala do general no Senado, oscilava de 5% a 100%, conforme os dados tornados públicos por decisão do TCU. A disponibilidade permanecia nesta terça-feira (4), inclusive em cidades onde pacientes com Covid-19 estão em filas à espera de uma vaga em UTI.

A Folha enviou perguntas à assessoria de imprensa do Ministério da Defesa às 12h50 de segunda (3) e reiterou o pedido às 18h13 do mesmo dia e às 8h desta terça (4). Não houve resposta até a conclusão desta reportagem.

As Forças Armadas reservam as vagas em seus hospitais exclusivamente a militares e seus dependentes, inclusive nos momentos mais críticos da pandemia, o que passou a ser investigado pelo TCU.

Não houve integração desses leitos às redes públicas de saúde. Pelo menos R$ 2 bilhões do Orçamento da União foram destinados às unidades militares, segundo o TCU.

O Exército passou a divulgar índices gerais de ocupação, sem diferenciar leitos destinados a pacientes com Covid-19 e a pacientes com outras doenças.

Nas planilhas, são informados dados sobre enfermarias, UTIs e leitos emergenciais, que são estruturas temporárias criadas para suporte e estabilização de pacientes.

No dia 29, dos 17 hospitais do Exército com leitos de UTI ou emergenciais, 9 tinham leitos disponíveis. Os demais estavam superlotados.

As maiores ocupações, dentre os que tinham vagas, se davam no Hospital Geral de Fortaleza (78%), Hospital Militar de Área de Manaus (67%) e Hospital de Guarnição de Natal (63%).

As menores ocupações ocorriam no Hospital Geral de Juiz de Fora (0%), Hospital Geral de Salvador (0%), Hospitais de Guarnição de Tabatinga (0%) e São Gabriel da Cachoeira (0%), Hospital Geral de Curitiba (17%) e Hospital Geral de Belém (33%).

Cinco dias depois, há superlotação em Juiz de Fora (MG) e ocupação de metade das vagas em Salvador. Nos demais, não houve mudanças significativas. E surgiram vagas no Hospitais Militares de Área de Porto Alegre e de Campo Grande.

Quando Braga Netto participava da audiência no Senado, a Aeronáutica informava em sua planilha diária uma ocupação de 16,67% dos leitos de UTI a pacientes com Covid-19 no HFAB (Hospital de Força Aérea de Brasília). O índice permanecia o mesmo nesta terça.

Metade das vagas de UTI a pacientes infectados pelo novo coronavírus estava disponível nos Hospitais de Aeronáutica de Belém e Canoas (RS). O primeiro chegou à lotação nesta terça. O segundo, teve mais vaga de UTI aberta.

No Recife e em unidades do Rio de Janeiro, a ocupação era superior a 85%. Os altos índices se mantiveram nos cinco dias seguintes, com lotação em duas das três unidades.

Na Marinha, o Hospital Naval Marcílio Dias, no Rio, tinha 95% de ocupação dos leitos de UTI destinados a pacientes com Covid-19. O índice caiu para 88%, o que significam cinco vagas disponíveis. O Hospital Naval de Salvador, por sua vez, tinha um índice de 83% dos leitos de suporte avançado ocupados.

Já no HFA, 30 dos 40 leitos de UTI (75%) estavam ocupados no dia 29. Houve uma leve queda nos cinco dias seguintes.

Assim, em Brasília, havia dez leitos de UTI disponíveis no HFA e mais cinco no HFAB. Enquanto isso, conforme números atualizados pelo governo do DF nesta terça, 31 pacientes com Covid-19 esperavam por um leito de UTI na rede pública de saúde na capital federal.

Um levantamento feito pela Folha e publicado no dia 28 apontou filas de espera por UTI em Curitiba, Rio de Janeiro, Recife, Porto Alegre e Minas Gerais.

A grande maioria das UTIs de hospitais militares passava por superlotação há menos de um mês, embora houvesse vagas disponíveis em três unidades de saúde do Exército.

Já leitos de enfermaria estavam ociosos, com índices de desocupação que chegavam a 87%. Esta realidade permanece um mês depois, com vacância que chega a 95% dos leitos .

"O leito que está vago serve exatamente ao rodízio: quem está na UTI sai da UTI para entrar um que está pior na UTI", afirmou o ministro da Defesa na audiência no Senado. "Nós podemos apresentar isso aos senhores."

Segundo Braga Netto, o índice de contaminação entre militares é maior do que entre civis.

"O sistema de saúde nosso prevê a evacuação dos postos mais afastados para os sistemas centrais de atendimento médico. Então, é exatamente o contrário: nós não temos disponibilidade, e o nosso índice de contaminação é maior quando se conta a família militar como um todo."

Ainda conforme o ministro, o "nosso pessoal que estava na linha de frente" começou a se infectar porque "não estava prevista a vacinação desse pessoal".

"Esse pessoal, quando fez a reportagem, considerou uma enfermaria de quartel. Vou dar um exemplo aleatório. Pegaram uma enfermaria de um quartel em uma cidade pequena do interior de São Paulo em que há seis camas; não são leitos hospitalares. (…) Nessa enfermaria de quartel, havia um leito ocupado e cinco camas vazias. E o repórter, desinformado ou mal-intencionado, comparou isso a mais de 80% de leitos vagos", disse Braga Netto.

Esta fala do ministro foi uma crítica a reportagem publicada pela Folha em 6 de abril, que mostrou reserva de vagas para militares e ociosidade de leitos de até 85% em unidades de saúde das Forças Armadas.

No dia 28, o ministro foi convocado pela Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados para dar explicações sobre a ociosidade em hospitais militares. A convocação é diferente de um convite —como foi o caso da comissão do Senado— e a ida é obrigatória, dentro de 30 dias.


Ocupação de UTIs e leitos emergenciais em 29/04, dia em que ministro disse não haver ociosidade:

Exército:

  • Hospital Geral de Juiz de Fora: 0%
  • Hospital Geral de Curitiba:17%
  • Hospital Geral de Salvador: 0%
  • Hospital de Guarnição de Natal: 63%
  • Hospital Geral de Belém: 33%
  • Hospital Geral de Fortaleza: 78%
  • Hospital Militar de Área de Manaus: 67%
  • Hospital de Guarnição de Tabatinga: 0%
  • Hospital de Guanição de São Gabriel da Cachoeira: 0%

Aeronáutica:

  • Hospital de Aeronáutica de Belém: 50%
  • Hospital de Aeronáutica de Canoas: 50%
  • Hospital de Aeronáutica de Recife: 85,71%
  • Hospital Central da Aeronáutica, no Rio: 88,89%
  • Hospital de Força Aérea de Brasília: 16,67%
  • Hospital de Força Aérea do Galeão, no Rio: 94,44%

Marinha:

  • Hospital Naval Marcílio Dias, no Rio: 95%
  • Hospital Naval de Salvador: 83%

Hospital das Forças Armadas

  • HFA, em Brasília: 75%

Fontes: Planilhas tornadas públicas, por determinação do TCU, por Exército, Aeronáutica, Marinha e HFA

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